Politica

Desequilíbrio de gênero na política deve continuar, diz especialista

Brasil está em penúltimo no ranking de participação feminina na AL

postado em 09/08/2018 10:46
Congresso Nacional
Apesar da mudança na legislação que obriga os partidos políticos a destinarem pelo menos 30% do Fundo Especial de Financiamento de R$ 1,76 bilhão ; dinheiro do orçamento da União ;, para campanhas de mulheres, o atual cenário de participação feminina pode permanecer inalterado. A avaliação é do analista político e diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiroz.

Na avaliação de Queiroz, a nova exigência pode até ajudar na ampliação da participação feminina na vida pública, mas não será suficiente para eliminar o desequilíbrio entre homens e mulheres no Parlamento brasileiro.

Levantamento preliminar do Diap aponta que a tendência das próximas eleições é de uma baixa renovação em relação às anteriores, o que pode impactar no número de mulheres eleitas.

;Só com a possibilidade de um sistema eleitoral com lista fechada e alternância de gênero é que poderia resolver isso definitivamente;, defendeu. Ele lembrou que hoje o Congresso é majoritariamente masculino, com 10% de mulheres.

Penúltimo no ranking

A exigência de que os partidos destinem pelo menos 30% ao financiamento de campanhas de mulheres foi determinada, por unanimidade, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em resposta a uma consulta apresentada pelas senadoras Gleisi Hoffmann (PT-PR), Vanessa Graziotin (PCdoB-AM) e outras parlamentares. Pelo entendimento da corte eleitoral, o tempo de propaganda no rádio e TV também deverá ter a mesma divisão.

Segundo o TSE, a aplicação de cerca de R$ 533 milhões do Fundo Especial em candidaturas femininas é condição obrigatória para a liberação dos recursos. No entanto, o critério para a distribuição do fundo será definido pela Comissão Executiva Nacional do partido, que poderá destinar essa cota de gênero para qualquer tipo de eleição, majoritária ou proporcional.

O Congresso brasileiro tem atualmente 54 mulheres entre 513 deputados federais e 12 entre 81 senadores. Segundo o ranking Mulheres na Política 2017 da União Interparlamentar (IPU, na sigla em inglês) e da ONU Mulheres, o país ocupa a 32; posição em um ranking de 33 países latino-americanos e caribenhos sobre participação das mulheres nos parlamentos nacionais. Com 9,9% de parlamentares eleitas, o país só fica à frente de Belize, cujo índice é de 3,1%. O primeiro colocado é a Bolívia, com 53,1% de participação de mulheres no Parlamento.

Na América Latina e Caribe, o índice médio de participação de mulheres no Parlamento é de 28,8%. O Brasil também ocupa as últimas posições no ranking mundial de 172 países, ficando em 154; lugar, considerando o índice de participação de mulheres de 10,5% na Câmara e de 14,8% no Senado.

Maioria do eleitorado

Dados atualizados da Justiça Eleitoral mostram que as mulheres são maioria do eleitorado brasileiro, com 52,5% dos eleitores. No entanto, nas últimas eleições majoritárias, em 2014, elas representaram 31,4% das candidaturas, das quais apenas 15% foram eleitas.

Já nas eleições municipais, em 2016, apenas 31,89% dos candidatos eram mulheres. A primeira vez que as candidaturas femininas alcançaram 30% do total de candidaturas de um pleito no país foi nas eleições de 2012. Entretanto, desde 2009, a Lei das Eleições prevê que cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo.

Com a obrigatoriedade de pelo menos 30% de candidatas mulheres, também apareceram as chamadas ;candidatas laranja;. Segundo o TSE, em 2016 mais de 16 mil candidatos terminaram a eleição sem ter recebido sequer um voto. Naquele ano, em 1.286 dos 5.568 municípios, não houve nenhuma mulher eleita para o cargo de vereador. Além disso, apenas em 24 municípios as mulheres representam a maioria dos eleitos para o Legislativo municipal.

Na avaliação da assessora do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), Jolúzia Batista, os partidos políticos estão mais cautelosos no cumprimento da lei, já que nas últimas eleições foram multados pelo TSE. ;Então, acreditamos que pode ter um avanço significativo do ponto de vista de ter mais candidaturas de mulheres. Esse recurso [de candidatas laranjas] não vai deixar de existir, mas vai ficar um pouco mais camuflado;, afirmou.

Pautas

Para a assessora do Cfemea Jolúzia Batista, as mulheres já têm atuado de forma mais expressiva, sobretudo nos partidos de esquerda. ;Nos partidos em que já havia uma batalha interna, intensa, por exigência de lugar e visibilidade, a pode ser que isso venha a reverberar de forma um pouco mais consistente. Mas ainda é um desafio, é uma incógnita que só vamos descobrir na apuração;, disse.

Para o Cfemea, as pautas ligadas à mulher no Parlamento brasileiro tendem a ser dominadas pela atuação masculina. "Os debates sobre direitos reprodutivos, aborto, atendimento às mulheres vítimas de violência no SUS [Sistema Único de Saúde] são completamente mediados pela presença do pensamento moral conservador e dos homens;, afirma. ;Eles dominam o debate sobre leis que atingem diretamente a vida das mulheres e de uma experiência que, inclusive, não está neles, mas se legitima por força dessa cultura machista patriarcal;, completa.

Segundo Jolúzia, o sistema político funciona para não permitir que candidaturas femininas sejam visíveis, além de oprimir e apagar trajetórias que propõem pautas diferentes das já estabelecidas. ;As candidaturas femininas em si já trazem uma agenda que é rechaçada, que não é valorizada pelo sistema político;, afirmou.

Eleições 2018

Entretanto, as novas regras, a sensível predominância das mulheres no eleitorado e o cenário indefinido das eleições majoritárias deste ano têm pressionado os partidos políticos a valorizar a participação feminina na corrida presidencial.

Com a realização das convenções partidárias, das 13 chapas oficializadas, sete são integradas por mulheres. As siglas têm até o dia 15 de agosto para registrar os pedidos de candidatura no TSE. Essas solicitações devem ser homologadas pela corte até o dia 17 de setembro.

A senadora Ana Amélia (PP-RS) é a vice na chapa de Geraldo Alckmin pelo PSDB. A também senadora Kátia Abreu (PDT-TO) disputará como vice na chapa do partido junto a Ciro Gomes. Pelo PSOL, a líder indígena Sônia Guajajara disputará como vice ao lado de Guilherme Boulos. A professora Suelene Balduino Nascimento é a vice de Cabo Daciolo, pelo Patriota. Já Marina Silva (Rede) e a Vera Lúcia (PSTU) encabeçam as chapas de seus partidos como candidatas a presidente.

Oficialmente, o PT destinou o ex-ministro da Educação e ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, para ocupar o posto de vice na chapa do partido encabeçada por Luiz Inácio Lula da Silva, atualmente preso em Curitiba. No entanto, diante do risco de o ex-presidente ser declarado inelegível pela Lei da Ficha Limpa, a cúpula do partido trabalha com a possibilidade de Manuela d;Ávila (PCdoB) vir a ser vice de Haddad, que assumiria, neste caso, a cabeça da chapa.

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