Deborah Fortuna
postado em 13/08/2018 06:00
Com frases como ;glória a Deus; e ;agradecer primeiramente a Deus;, antes de debates e entrevistas, os candidatos à presidência da República miram no eleitorado religioso. E não é para menos: 158,5 milhões de brasileiros declararam ter alguma religião, segundo os dados do último censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com o início das propagandas em 16 de agosto, os presidenciáveis buscam convencer esse público e conquistar apoio de líderes de igrejas que acrescentem na campanha eleitoral.
No primeiro debate na TV, na última quinta-feira, três dos sete candidatos começaram os discursos citando Deus. Entre eles, Cabo Daciolo (Patriotas), Marina Silva (Rede) e Jair Bolsonaro (PSL). Além deles, Geraldo Alckmin (PSDB) e Ciro Gomes (PDT) também se manifestaram em outras ocasiões a respeito do tema. Para Antônio Augusto de Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), o Toninho, esse é o momento em que os candidatos chamarão a atenção desse eleitorado. ;Agora, há um ambiente muito pró-família, voltado para a defesa de valores éticos, morais. E, ao invocar a religião, ao invocar Deus perante esse eleitorado, os presidenciáveis são percebidos como alguém que defende os valores que esse público professa;, explicou.
[SAIBAMAIS]Esta não é a primeira eleição geral em que o tema entra no debate político. Em 2010, quando Dilma Rousseff foi candidata à presidência pelo PT pela primeira vez, ela teve que voltar atrás sobre uma entrevista dada três anos antes em que defendia a descriminalização do aborto ; tema controverso no meio religioso. À época, a polêmica a levou a perder consistência eleitoral na disputa contra o tucano José Serra. A petista apenas neutralizou o jogo com a divulgação de um aborto que teria sido feito pela mulher de Serra, Mônica.
Influência
Toninho do Diap acredita que o público religioso tem força para influenciar as eleições. Desta vez, quem deve se beneficiar é Alckmin, que conseguiu o apoio de partidos conservadores. ;Ele próprio é um dos líderes religiosos mais fervorosos e, além disso, os partidos PR e PRB estão na base dele;, avaliou. Apesar de Cabo Daciolo ter surgido como uma alternativa, Toninho considera poucas as chances de o deputado federal ter ;votação expressiva;. ;A tendência é que esse grupo, desta vez, marche com Alckmin;, afirmou.
Em 2014, quem despontava nesse sentido era Marina Silva, que se aproximou do pastor Silas Malafaia. ;Mas, dessa vez, ela escolheu um vice que pensa diferente dela em relação ao tema, que é o Eduardo Jorge (PV);, disse Toninho. ;O próprio Malafaia, agora, não tem mais proximidade com ela. Então, ela tende a perder esse público. O pastor e o deputado federal (Marco) Feliciano, todos devem preferir o Alckmin mesmo. Assim como a uma parcela expressiva da igreja católica;, concluiu.
Em março, uma pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostrou que 79% dos entrevistados concordavam totalmente ou em parte que é importante que o próximo presidente acredite em Deus. Especialista em sociologia política da Universidade Estadual Paulista (Unesp), José Geraldo Poker acredita que muitas vezes o eleitor não tem dogmas espirituais, mas cria uma expectativa de que um candidato religioso seja melhor que outro que não é. ;São traços culturais. A cultura brasileira é fortemente influenciada por uma religião. Não é determinante no voto, mas constitui um traço interessante. Um definidor de tendência de preferência por um candidato e não por outro;, avaliou.
Segundo Poker, quando os candidatos demonstram alguma crença, eles querem chamar atenção de um público mais ;sensível; a esse tema, mas não, necessariamente, religiosa. ;Na disputa para a prefeitura de São Paulo, no fim dos anos 1980, o Fernando Henrique Cardoso foi interpretado, uma vez, como se fosse ateu. E isso pesou contra ele. Não por conta de um eleitorado cristão, mas porque a cultura brasileira acredita que uma pessoa que tem essa crença é melhor ou mais confiável;, explicou.
Para o especialista, a estratégia dos políticos é entender as crenças que esse público defende, e apostar em pautas consideradas mais suscetíveis a eles. ;Os candidatos sabem explorar a característica de um determinado eleitorado, mas não necessariamente religioso. Grande parte da opinião pública é contrária a certas pautas, como o aborto, por exemplo, então eles acabam se posicionando contra também;, explicou.
158,5 milhões
Número de brasileiros que declaram ter alguma religião
79%
Percentual de entrevistados por pesquisa da CNT que dizem ser importante que o próximo presidente acredite em Deus
;A cultura brasileira é fortemente influenciada pela religião. Um definidor de preferência por um candidato;
José Geraldo Poker, professor da Unesp