Renato Souza
postado em 14/08/2018 06:00
Enfrentar a propagação em grande escala de notícias falsas envolvendo candidatos e coibir o uso de programas de computador para persuadir o eleitor nas redes sociais. Essas são as primeiras missões que a ministra Rosa Weber enfrenta a partir de hoje, ao assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ela ocupa o lugar do ministro Luiz Fux, que deixou o comando da Corte sem promover alterações na resolução que regulamenta a campanha eleitoral em todos os meios, inclusive na internet.Enquanto o TSE discute o tema internamente, uma verdadeira legião de perfis falsos, páginas em redes sociais e sites criam uma estrutura que ameaça a integridade das eleições. Além das chamadas fake news, que podem prejudicar a imagem de candidatos, deturpar informações sobre programas eleitorais e induzir o eleitor ao erro, existe o risco de que a internet seja tomada por bots (robôs) até o dia 7 de outubro, quando ocorre a votação do primeiro turno.
Esses problemas esbarram na falta de regulamentação. A resolução n; 53.551, do TSE, e a Lei n; 9.504, que regulamentam as regras de campanha eleitoral, dentro e fora da rede, não preveem o combate à propagação de notícias falsas ou ao uso de programas automatizados. A legislação foi pensada em um período em que a internet não chegava a muitas regiões do Brasil. Atualmente, mais de 60% dos lares têm acesso à internet e 12 milhões de pessoas compartilham boatos por esse meio, de acordo com estudo da Universidade de São Paulo (USP).
Boatos preguiçosos
O professor Arthur Rollo, especialista em direito eleitoral da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, destaca que mesmo antes de a campanha eleitoral começar, a propagação de notícias falsas causa problemas. ;Em São Paulo, por exemplo, começaram a difundir na internet que um grupo de candidatos está ligado à máfia chinesa. Não conseguimos obter na Justiça autorização para remoção dos conteúdos, pois não existe uma regulamentação específica. Nesta eleição, vamos ter problemas como nunca se viu antes;, afirmou.Sombra da censura
Na última sessão antes de deixar o cargo, na noite de ontem, o ministro Luiz Fux decidiu encerrar os trabalhos sem debater o assunto. Um grupo de trabalho do TSE criou, a pedido de Fux, uma minuta de regulamentação para o combate a fake news e o uso de bots. Mas o temor entre os magistrados é de que uma eventual normatização sobre o assunto seja usada para promover a censura aos veículos de comunicação e aos brasileiros.O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse, ontem, que casos de fake news devem ser tratados pela Justiça após o prejuízo ser identificado ao processo eleitoral. ;As ideias são incontroláveis. O que nós precisamos é, posteriormente, diante de uma mentira intencional ; e não me refiro ao erro, e sim a uma inverdade ; ter as consequências jurídicas. Mas, a priori, qualquer regulamentação soaria como censura;, disse.
Como adiantou o Correio em reportagem publicada no último sábado, o principal alvo do TSE é a propagação de robôs para alavancar a imagem de candidatos. A padronização das mensagens e a quantidade de citações aos candidatos brasileiros em países como a Rússia e Letônia levantaram a desconfiança de especialistas quanto ao uso de programas autônomos que podem disparar uma grande quantidade de mensagens em poucos minutos.
TSE de perfil mais rígido
A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber toma posse na presidência do TSE, hoje à noite. Com campanha eleitoral incerto, a magistrada terá um grande desafio pela frente: comandar as eleições gerais, em outubro. A mudança, no entanto, pode ser um obstáculo para o PT, que pretende registrar a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva amanhã. A expectativa é de que o Tribunal fique mais rígido e barre o ex-presidente, condenado a 12 anos de reclusão, preso e inelegível pela Lei da Ficha Limpa.
Hoje também será empossado o ministro da Suprema Corte Luís Roberto Barroso e o do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Jorge Mussi como vice-presidente e corregedor-geral da Justiça Eleitoral, respectivamente. Rosa Weber substitui o magistrado Luiz Fux, à frente do TSE nos últimos seis meses, e segue até 2020.
A nova composição ; com Barroso, Fachin e Weber ;não é um bom sinal para Lula. No STF, os três magistrados negaram o pedido de habeas corpus solicitado pelo partido para evitar a prisão após condenação em segunda instância. ;É muito improvável que Lula seja elegível;, avaliou a especialista em direito eleitoral e professora da Faculdade de Direito do IDP/SP Marilda Silveira.
Somente após ser provocado é que o TSE deve se manifestar sobre o petista e tem até 17 de setembro para decidir. A tendência é de que o partido escolha o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, em uma chapa com a deputada Manuela D;ávila (PCdoB). ;O maior desafio de uma eleição é a logística. A questão do Lula não envolve nada de diferente do que o tribunal já julgou, em termos processuais;, avaliou Silveira.
A nova composição do TSE
; Rosa Weber, de vice-presidente para presidente do TSE; Luís Roberto Barroso, de ministro efetivo para vice-presidente
; Edson Fachin, de ministro substituto para ministro titular do TSE
; Jorge Mussi, de ministro efetivo para corregedor-geral da Justiça Eleitoral
; Og Fernandes, de ministro-substituto para ministro titular do TSE
Quem sai
; Luiz Fux, até então, presidente do TSE
; Napoleão Nunes Maia Filho, como corregedor-geral da Justiça Eleitoral
A reserva de Rosa Weber
Com as mudanças na composição do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a expectativa é de que a Corte Eleitoral tenha um perfil mais rígido. Em 2006, ela foi nomeada ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST), e em 2012, passou a integrar o Supremo Tribunal Federal (STF). Em junho de 2012, se tornou ministra-substituta do TSE. Em 2016, acabou empossada ministra efetiva da Corte Eleitoral. Em 19 de junho, foi eleita sucessora do ministro Luiz Fux para a presidência da Corte.
;Rosa é uma ministra muito séria, e costuma ser mais dura nos seus posicionamentos. Mas eu não espero grandes mudanças;, avaliou a especialista em direito eleitoral e professora da Faculdade de Direito do IDP-São Paulo, Marilda Silveira. Entre os ministros, Weber é considerada com o perfil mais reservado. Ela atuou como relatora do processo que determina que 30% dos recursos de campanha dos partidos, do Fundo Especial de Financiamento de Campanha ; R$ 1,7 bilhão ; sejam destinados à candidatura de mulheres.
Em junho de 2017, quando a Corte julgou a cassação da chapa Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB), Weber votou pela condenação ; o que levaria Temer a sair do cargo de presidente. A maioria entendeu que não houve abuso de poder político e econômico na campanha de ambos, em 2014.