Politica

Os efeitos positivos e negativos da junção entre futebol e política

Declaração de voto de jogadores e torcedores constrange clubes e abre guerra entre organizadas, até mesmo interna. Temor é de que animosidade se espalhe por estádios, já marcados por confrontos entre agremiações rivais

Rodolfo Costa , Gabriel Ponte*
postado em 22/09/2018 07:00
Felipe Melo dedicou gol a Jair Bolsonaro, e Palmeiras se apressou em esclarecer que o posicionamento dele não reflete a opinião do clube
A disputa eleitoral chegou com tudo aos estádios de futebol. A politização no esporte está abrindo guerra entre as torcidas ; até internamente ; e criando constrangimento para os clubes à medida que surgem declarações públicas de apoio a candidatos. Embora a mistura entre política e futebol não seja uma novidade, num esporte que teve movimentos como a Democracia Corinthiana (leia abaixo o trecho Votos igualitários), na década de 1980, o atual ambiente acalorado e polarizado entre eleitores de esquerda e de direita desperta preocupação em torcedores e especialistas. E tem potencial até de influenciar os votos de indecisos na base da radicalização, e não da racionalização.

O clima político se aprofundou de vez no futebol no último domingo, em duas situações. Numa delas, o jogador Felipe Melo, do Palmeiras, dedicou o gol que marcou contra o Bahia ao presidenciável Jair Bolsonaro (PSL). Na outra, no clássico entre Cruzeiro e Atlético-MG, parte dos atleticanos disse que o capitão reformado ;mataria veado;, em provocação aos rivais. No mesmo jogo, cartazes de teor político foram exibidos nos telões do Estádio Mineirão.

A hostilidade de atleticanos criou um clima de tensão, avalia o empresário Ronny Marques, 27 anos, presidente da Máfia Azul Brasília, torcida organizada do Cruzeiro na capital federal. ;O perigo já chegou, e isso é preocupante. O torcedor está à flor da pele, tanto em questão de política quanto de futebol;, avaliou. ;E qualquer coisa pode ser motivo para as pessoas estarem ali buscando formas de violência, de briga. Criar mais uma forma de provocar e arrumar confusão é alarmante.;

O ambiente de polarização se mostra intenso mesmo dentro das torcidas organizadas. Por esse motivo, a Máfia Azul decidiu não apoiar nenhum candidato. Em Minas Gerais, apoia Aécio Neves (PSDB) para deputado federal, e Rodrigo Pacheco (DEM) para senador. Sem unanimidade na cúpula quanto à escolha de presidente da República, a opção foi pela neutralidade.

O clima não é diferente em torcidas de outros clubes. A Loucos pelo Botafogo decidiu apoiar a reeleição do deputado federal Rodrigo Maia (DEM), presidente da Câmara. Para o Palácio do Planalto, também optou pela neutralidade. O critério é financeiro, explica o fisioterapeuta Raphael Siciliano, 33, puxador da agremiação. ;Ele é um parlamentar que ajuda a torcida e o time. Para presidente, cada um vota no seu;, destacou.

Os caciques das torcidas organizadas querem evitar o desgaste a todo custo. Mas nem todas conseguem. A Gaviões da Fiel, do Corinthians, e a Torcida Jovem do Santos se posicionaram contra Bolsonaro e, por isso, enfrentam divisão interna. O presidente da Gaviões, Rodrigo Tápia, o Digão, sinalizou nas redes sociais estar sendo pressionado após a decisão, mas a manteve, em nota divulgada pela organizada.

O clima é preocupante, admite o sociólogo e cientista político Fábio Metzger, professor da União das Instituições Educacionais de São Paulo (Uniesp). O analista não descartou a possibilidade de os ânimos aflorados desencadearem conflitos entre torcedores de mesmo time e rivais. ;Se já brigam por futebol, a disputa política pode virar uma centelha para explosão;, ressaltou.


Temporário

Torcedores pregam que o clima de instabilidade pode ser amenizado após o resultado das eleições. Foi o que avaliou o analista de sistemas Felipe George, 29, um dos líderes da Urubuzada, torcida organizada do Flamengo. ;Acho que não tem espaço para isso depois do resultado eleitoral. É algo do momento;, justificou.

Ele espera que a associação entre política e futebol não prejudique as relações entre torcidas. ;Nós vamos para o estádio nos divertir, conversar com torcedores e, o principal, ver nosso time jogar. Não é para discutir política;, disse. ;Vejo como um empecilho para o futebol. Não está se tratando o esporte como paixão, mas levando o assunto para outras margens.;


Votos igualitários

O movimento, que durou entre 1982 e 1984, era liderado por Sócrates, Casagrande e Wladimir e pregava que todas as decisões do clube seriam submetidas antes ao crivo de dirigentes, funcionários e jogadores. Em plena Ditadura Militar, o grupo também lutava pelo voto direto.

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