Atrás na corrida eleitoral, Fernando Haddad (PT) vê na fé religiosa do povo brasileiro a esperança para ultrapassar o adversário, Jair Bolsonaro (PSL). Ontem, o petista se reuniu com o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Leonardo Steiner, para pedir o apoio da principal entidade católica do país. A última pesquisa Datafolha, divulgada na quarta-feira, aponta que o petista tem 47% dos votos válidos entre católicos, uma diferença de apenas seis pontos percentuais em relação ao rival. Faltando 16 dias para a eleição, a tática da campanha é mirar os grupos em que ainda pode abocanhar votos para diminuir a distância que o separa do capitão reformado do Exército.
Os católicos no Brasil são 173,6 milhões, segundo o Anuário Pontifício 2018 e o Annuarium Statisticum Ecclesiae 2016, redigidos pelo Departamento Central de Estatísticas da Igreja. Espaço para a aproximação entre PT e a Igreja Católica não falta. No primeiro turno, o presidente da CNBB e arcebispo metropolitano de Brasília, cardeal Sérgio da Rocha, disse que a Igreja não apoiaria candidatos que promovessem a violência. Na segunda-feira, após o primeiro resultado das urnas, dom Steiner sugeriu que os fiéis elejam um candidato favorável à democracia.
Os discursos dos líderes religiosos foram interpretados como acenos para a candidatura de Haddad. Na última quarta-feira, nas redes sociais, Bolsonaro adotou um tom comedido. Disse que dispensa o voto e qualquer aproximação de quem pratica violência contra eleitores que não votam nele. ;A este tipo de gente, peço que vote nulo ou na oposição, por coerência;, declarou, em referência ao atentado que sofreu em setembro, em Juiz de Fora (MG).
Acompanhado do governador do Piauí, Wellington Dias (PT), e de Gilberto Carvalho, ex-ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência no primeiro governo de Dilma Rousseff, o candidato do PT pediu que a Igreja recomende aos fiéis que tenham cuidado com as fake news. ;As pessoas estão sendo bombardeadas com informações falsas na internet. Pedi que a Igreja recomende às pessoas para checar o que é verdade ou não. Se for verdade, as pessoas têm de saber. Se não for, têm de ter compromisso de barrar a mentira e a propagação;, declarou.
Em resposta, dom Steiner pediu, em caso de vitória do petista, combate rigoroso à corrupção, defesa da democracia, proteção do meio ambiente, atenção especial à questão indígena e quilombola, e que o aborto não seja legalizado. Haddad afirmou que as preocupações da igreja estão contempladas no plano de governo e que tais compromissos serão reforçados. Em nota, o secretário-geral da CNBB frisou que o candidato não foi pedir apoio e a entidade não tem ;partido nem candidato.;
O pedido feito ao secretário-geral da CNBB, segundo Haddad, tem por intuito combater os ataques que ele tem sofrido da militância de Bolsonaro, sobretudo nas redes sociais. O petista disse que são inverdades as alegações a respeito da distribuição de materiais impróprios para crianças de seis anos. ;Isso nunca aconteceu e é um desrespeito aos professores do Brasil. Veja se os professores vão receber material impróprio sobre sexualidade e usá-lo sem questionar. Isso é completamente impossível de acontecer. Mesmo que alguém tenha em isso em mente, nós temos uma rede de proteção que são as próprias escolas, diretoras, professoras;, disse.
Evangélicos
A disputa pelo público católico é uma missão mais acessível ao PT. Entre os evangélicos, a disputa é mais difícil. Na média, entre as diferentes correntes evangélicas, Haddad tem apenas 30% dos votos válidos, segundo o Datafolha. Ciente disso, Bolsonaro orientou seus interlocutores a articularem o apoio de pastores e bispos. A tendência, agora, é de que o trabalho seja reforçado, informou Coronel Tadeu (PSL-SP), um dos coordenadores da campanha do presidenciável do PSL em São Paulo.O correligionário é braço direito do deputado Major Olimpio (PSL-SP), que foi eleito senador. Ambos estão entre os principais responsáveis pelas articulações com apoiadores civis, políticos e religiosos em São Paulo. As conversas com líderes evangélicos estão avançadas e a expectativa é de garantir votos de eleitores e suporte de legendas ligadas a religiosos, como PRB e PSC. ;As principais lideranças estão declarando apoio e mais manifestações vão surgir;, destacou. Pastores e bispos pedem voto para Bolsonaro nas redes sociais e em aplicativos de mensagens.
Aceno até ao algoz
O candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad, esteve na quarta-feira com o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, algoz de petistas envolvidos no escândalo do mensalão. O encontro ocorreu no apartamento do ex-ministro, em Brasília. Haddad estava sozinho. Segundo fontes do PT, o presidenciável convidou Barbosa para participar da campanha, apresentando propostas na área de organização do Estado, mas não se falou em participação em um eventual governo petista.A visita gerou uma onda de especulações sobre a possibilidade de Barbosa ser convidado para assumir o Ministério da Justiça. Horas antes da visita, o senador eleito pela Bahia Jaques Wagner, recém-integrado ao núcleo duro da coordenação da campanha de Haddad, disse que o PT pode anunciar nomes de um eventual ministério para acalmar o eleitorado, entre eles o da Justiça. ;Pode ser que ele anuncie um, dois, três nomes, na Educação, Fazenda, Justiça. (...) Na Educação, pode ser que anuncie uma sumidade da Educação;, afirmou Wagner.
Relator no STF do processo do mensalão, Barbosa, que chegou a ensaiar uma candidatura presidencial pelo PSB, foi algoz de petistas, como José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares, que cumpriram pena de prisão por envolvimento no esquema. Integrantes da cúpula petistas avaliam que a presença de Barbosa na campanha poderia reduzir o impacto do antipetismo sobre a candidatura de Haddad e sinalizar para uma parcela importante do eleitorado que a Lava-Jato e a autonomia dos órgãos de combate à corrupção estariam garantidos sob o comando do ex-ministro do STF.
Ciro viaja e frustra o PT
Derrotado nas urnas, Ciro Gomes (PDT) embarcou ontem para o exterior com a família, e deve ficar fora do país por até duas semanas. Os planos de Ciro frustram as investidas do PT, que faz acenos ao candidato derrotado no intuito de trazê-lo para dentro da campanha petista no segundo turno das eleições.Ao contrário do que esperava a campanha de Fernando Haddad (PT), Ciro não vai chefiar a equipe do programa econômico do petista. A ideia é que o pedetista não suba no palanque com Haddad, muito menos faça fotos para indicar o ;apoio crítico;, aprovado em reunião da Executiva nacional do PDT na última quarta-feira.
O PT pretendia insistir com Ciro para que ele integrasse a coordenação da campanha de Haddad. Nos bastidores, o convite era tratado como um primeiro passo para Ciro assumir um ministério em um eventual governo Haddad. Na campanha petista, o nome dele é citado para comandar o Planejamento ou a Fazenda.
Para se distanciar do PT, o presidente do PDT, Carlos Lupi, se antecipou e disse, na quarta-feira, que o partido vai lançar Ciro Gomes como candidato para 2022, já após o fim do segundo turno. ;Não faremos nenhuma reivindicação (ao PT). Será um voto claro, sem participação na campanha e com a certeza de que não participaremos de nenhum governo, mesmo se Haddad ganhar a eleição. Vamos começar a construir 2022 agora, já estamos decididos a lançar a candidatura de Ciro Gomes;, afirmou.
Outra forma de mandar sinais negativos ao PT foi anunciar que o PDT, independentemente de quem vença o segundo turno, estará na oposição em 2019. O motivo da resistência do PDT em se aproximar da campanha de Haddad foram os ataques que os petistas fizeram à candidatura de Ciro Gomes, durante o processo eleitoral.
Orquestrada com aval do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o PT fez uma manobra, ainda no primeiro turno, que atrapalhou as negociações de apoio do PSB à candidatura de Ciro. O caso foi encarado como uma rasteira do PT no partido. Na ocasião, os petistas retiraram candidaturas a governos estaduais para não atrapalhar nomes do PSB que disputavam os mesmos cargos. Em troca, os socialistas se comprometeram a ficarem neutros no primeiro turno, em vez de apoiarem o presidenciável do PDT.