O chefe da pasta de economia da União Europeia (UE), o francês Pierre Moscovici, abriu a primeira saia justa para Bruxelas em relação ao Brasil. Em declarações na manhã desta segunda-feira, 29, o comissário para Assuntos Econômicos do bloco criticou a eleição de Jair Bolsonaro (PSL) para a Presidência e pediu que as lideranças no mundo "acordem".
"Bolsonaro é evidentemente um populista de extrema direita", disse o ex-ministro francês em diferentes governos socialistas em declarações à TV do senado francês. "Atrás dele, vemos a sombra dos militares que estiveram por um longo tempo no poder no Brasil, constituindo uma ditadura terrível", declarou.
"Ele mesmo é um ex-militar e seu vice-presidente é um militar", destacou o comissário. "É claro que é um sinal", insistiu o francês, um dos homens de maior influência hoje dentro do bloco europeu. Bolsonaro é o terceiro militar eleito pelo voto direto no País.
Moscovici será a contraparte da equipe econômica do Presidente eleito nas reuniões do G-20 e em outros fóruns internacionais.
A declaração de Moscovici levou a UE a se apressar em dar uma versão mais branda de sua avaliação sobre o novo governo brasileiro, insistindo que o comissário fala apenas por si mesmo e que o bloco, como um todo, não iria qualificar Bolsonaro. "O Brasil é um parceiro importante e também nas negociações com o Mercosul", disse uma porta-voz da Comissão, Natasha Bertaud. "A UE espera fortalecer a parceria com o novo governo", afirmou.
"Evidentemente, respeitamos a escolha democrática do povo brasileiro. O Brasil é um país democrático com instituições sólidas e esperamos de todos os futuros presidentes do País que trabalhem para consolidar a democracia ao benefício do povo brasileiro", afirmou a porta-voz, que qualificou o País como um "parceiro muito importante".
Questionada, a Comissão evitou fazer comparações entre Bolsonaro e líderes populistas que ganham terreno pelo continente. "Não vamos no domínio dos sentimentos. Essa comparação não leva a nada", insistiu a porta-voz, que deixou claro que não iria dar seu "sentimento" sobre a vitória do candidato do PSL. "Não vamos entrar no debate sobre como sentimos ou não sentimos. Essa é uma eleição democrática", pontuou, evitando o qualificar de "populista".
Moscovici ainda destacou que a vitória de Bolsonaro parece ser uma "tendência mundial" e que há uma perda de espaço democrático, inclusive na Europa. "Esse é um fenômeno que está ligado talvez a uma fadiga democrática sobre a qual aqueles que tem a democracia no coração deveriam refletir e organizar um contra-ataque", alertou.
"Temos que refletir o que é a democracia e a liberdade", pediu. "Ela protege as minorias e impede a xenofobia", disse, dizendo que "teme" pelos brasileiros. Para ele, as primeiras "vítimas" no Brasil serão a imprensa, as minorias e independência da Justiça. "Quando eu vejo isso, eu me pergunto: democrata? sinceramente comprometido com as liberdades?", pontuou.
Para o comissário, dirigentes em todo o mundo devem "acordar". "Existe uma forma de fadiga com relação à crise que durou dez anos", alertou, numa referência ao colapso econômico de 2008. "Elas não está mais, mas as sequelas são notadamente a desigualdade chocante", disse o comissário, que pede para que as desigualdades sejam tratadas.
Numa nota de imprensa enviada separadamente, a UE relembrou que o Brasil é um "parceiro de muitos anos em assuntos bilaterais e multilaterais". "Temos uma ampla agenda de cooperação em áreas como comércio, ciência, tecnologia, energia, clima e direitos humanos", indicou.
Outro aspecto destacado foi a negociação com o Mercosul. "A UE está pronta para continuar a fortalecer sua parceria com o novo governo", disse. "Estamos prontos para continuar a trabalhar de forma conjunta com o novo governo para fazer avançar nossos interesses comuns", completou.