O juiz federal Sérgio Moro afirmou na tarde desta terça-feira, 6, em coletiva de imprensa em Curitiba (PR), que o convite para ser ministro da Justiça e Segurança Pública não tem "nada a ver" com o processo que envolve o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso desde 7 de abril em Curitiba (PR).
De acordo com Moro, o processo de Lula foi julgado por ele em 2017, quando "não havia qualquer expectativa de que o então deputado Bolsonaro fosse eleito presidente".
Moro disse ainda que, apesar das críticas de petistas, não pode pautar a vida dele "com base em fantasia, em álibi falso de perseguição política".
"O ex-presidente Lula foi condenado e preso por ter cometido um crime. O que houve foi uma pessoa que lamentavelmente cometeu um crime e respondeu na Justiça", argumentou.
Moro também disse que políticos dos mais variados espectros foram condenados no âmbito da Lava Jato. "Tivemos a condenação do ex-presidente da Câmara (Eduardo Cunha) e do ex-governador do Rio (Sérgio Cabral)", citou.
Convite
O juiz afirmou ainda que foi procurado por Paulo Guedes, futuro ministro da Economia, em 23 de outubro para vir a ocupar um cargo no governo de Jair Bolsonaro (PSL), mas que não acertou nada na data. "Argumentei que poderia tratar de eventual convite após as eleições", afirmou.
Na coletiva, Moro também explicou a confusão que, em 2017, não reconheceu Bolsonaro em aeroporto e que o fato foi explorado politicamente por adversários do agora presidente eleito. "Liguei depois para pedir desculpas", disse.
Moro disse, então, que no encontro de 1; de novembro conversou mais longamente com o presidente eleito. "(Bolsonaro) Me pareceu uma pessoa bastante ponderada. Eu disse a ele que para integrar governo tem de ter certa convergência. Ainda que não haja concordância absoluta de ideias entre nós, há a possibilidade de um meio-termo", afirmou.
Moro disse também que, no momento oportuno, vai indicar os nomes que vão fazer parte do gabinete do Ministério da Justiça e Segurança Pública, que ele vai assumir em janeiro, com a posse de Jair Bolsonaro (PSL). "Pretendo chamar pessoas absolutamente qualificadas e nomes da Lava Jato", sinalizou.
Moro também disse que vai tentar repetir o mesmo padrão da Operação na gestão do ministério. Ele evitou tecer comentários maiores sobre projetos relacionados à pasta. Sobre o que prevê a regulamentação do lobby, ele se limitou a dizer que "parece bom, mas é complexo".
Ele também criticou instrumentos protelatórios de processos. De acordo com Moro, o advogado não pode contar que o sistema de Justiça seja "garantia de impunidade".
Sobre o pacote de medidas contra a corrupção que pretende anunciar, ele disse que ele será discutido com o Congresso Nacional. "A nossa tentativa é que propostas gerem um ciclo virtuoso para retomar padrões mais normais", disse.
Moro também citou a Operação Mãos Limpas e lembrou que ele não conseguiu exterminar a corrupção na Itália. "Eu tomei a decisão que me pareceu melhor para termos os avanços que considero necessários para que não haja retrocesso no combate à corrupção", comentou.
De acordo com Moro, a relação com demais Poderes será absolutamente harmônica e respeitosa. "Tudo será feito com base na Constituição, que não nos condena a ;inefetividade;", disse.
Coaf
O juiz afirmou ainda que, durante a conversa com o presidente eleito, foi colocada a ele a possibilidade de transferência do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para o futuro Ministério da Justiça e da Segurança Pública.
"Ele (Coaf) é um importante instrumento de prevenção à lavagem de dinheiro. É preciso reestruturar e fortalecer o Coaf", afirmou.
2; instância e progressão de pena
Na coletiva, Moro defendeu encaminhar propostas "simples" e de fácil aprovação no Congresso Nacional como primeiras medidas de combate à corrupção. Entre as propostas defendidas por Moro, estão deixar claro na legislação a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância e o fim da progressão de pena para presos ligados a organizações criminosas.
"A progressão ressocializa, mas se existem provas de que o preso mantém vínculo com organização criminosa, isso significa que não está pronto para ressocialização", disse Moro, afirmando que a intenção é desestimular a filiação de presidiários a organizações criminosas.
Além disso, Moro citou intenção de alteração nas regras de prescrição de crimes, uma regulação mais clara para operações que usam policiais disfarçados e proteção para denunciantes anônimos.
Moro quer aproveitar as chamadas Dez Medidas contra Corrupção apresentadas pelo Ministério Público Federal e que foram desfiguradas pelo Congresso em 2016 e o pacote de medidas apresentadas pelo movimento Transparência Internacional em parceria com a Fundação Getulio Vargas. Entre as propostas consideras de difícil implementação que estão no pacote, o juiz apontou a regulamentação do lobby.
Maioridade penal e porte de armas
O juiz federal disse, na coletiva, que adolescentes acima de 16 anos "já têm condições de percepção de que não pode matar".
A fala foi resposta a uma pergunta sobre a opinião dele à PEC que reduz a maioridade penal para crimes graves. O presidente eleito, Jair Bolsonaro, que o convidou para o Ministério da Justiça e Segurança Pública, é favorável à medida.
Sobre a flexibilização do porte de armas, Moro disse que "parece que seria inconsistente ter opinião contrária" à de Bolsonaro e que há uma reclamação geral da população sobre o porte de armas. "As medidas são muito restritivas", disse.
Moro também disse que, embora o foco de sua gestão no Ministério seja o do combate à corrupção, nenhuma área será negligenciada. "Evidentemente vai haver uma atenção às áreas indígena e de minorias", disse.
O juiz admitiu ainda que confrontos policiais são uma possibilidade, pois há regiões do País dominadas por organizações criminosas. "Mas isso não significa que confronto policial é uma estratégia que possa ser seguida", disse.
Política
O juiz federal voltou a afirmar que não tem pretensão de concorrer a cargos eletivos, mesmo tendo aceito o convite ao Ministério da Justiça e da Segurança Pública pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL).
Ele disse que a decisão de aceitar o cargo não contraria as declarações que deu ao jornal O Estado de S. Paulo, quando disse que não entraria para a vida política.
"Na minha perspectiva, este é um cargo técnico. Como juiz, não tenho pretensão em concorrer a cargos eletivos. Não é essa a visão que tenho deste cargo", disse.
Moro afirmou ainda que não enxerga problemas em sair de férias e não pedir exoneração do cargo neste momento para assumir somente no ano que vem o cargo de ministro.
"Só vou ser nomeado em janeiro. Vou me exonerar, é claro, não tem como assumir o cargo sem me exonerar. Mas eu não estou praticando atos no presente, estou planejando participação em um governo futuro", disse.
STF
O futuro ministro evitou falar sobre a possibilidade de ser indicado pelo presidente eleito para uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). Moro negou que a aceitação do convite para ocupar a Pasta tenha sido condicionada a uma indicação ao Supremo.
"Eu jamais estabeleceria condições para qualquer cargo público", disse Moro. O juiz afirmou que, "se houver possibilidade" de uma vaga aberta na Corte, isso tem que ser discutido no contexto próprio.
Questionado sobre divergências com Bolsonaro, Moro respondeu que está claro a relação de subordinação que terá em relação ao presidente da República, mas que tanto um quanto outro podem mudar de opinião com determinados assuntos. Caso Bolsonaro discorde com alguma proposta sua, Sérgio Moro disse que "aí vou tomar decisão se vou continuar ou não continuar" no cargo.
Moro foi lembrado que o futuro ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, admitiu ter recebido dinheiro de caixa dois na campanha eleitoral para deputado federal em 2014. O juiz disse que isso já foi esclarecido pelo parlamentar e que admira Lorenzoni pelo fato de ele ter defendido as medidas contra corrupção apresentadas pelo Ministério Público Federal (MPF) no Congresso.
Perseguição política
Moro afirmou ainda que o Ministério da Justiça e Segurança Pública não será utilizado para "perseguição política" e que a Operação Lava Jato também não teve esse objetivo.
"Um pouco estranho dizer isso, mas não existe a menor chance de utilização do ministério para perseguição política. Não foi feito isso durante a Operação Lava Jato", afirmou o magistrado, reforçando que não seria agora no ministério que ele agiria com base nas opiniões políticas de investigados.
Para Moro, a intenção no ministério é ter o mesmo sucesso que teve a Operação Lava Jato no combate à corrupção e ao crime organizado. O futuro ministro prometeu levar o modelo da Lava Jato, que usou uma força-tarefa destinada especificamente para a operação, em outras investigações.
Ele defendeu ainda um controle maior da comunicação dentro de unidades prisionais de segurança máxima e disse querer investir em tecnologia. Ao falar sobre casos de confronto envolvendo policiais em trabalho, o magistrado afirmou que algumas operações podem resultar em violência, mas que o objetivo é evitar confrontos.
Marielle
Na coletiva de imprensa, realizada em Curitiba, Moro afirmou que o assassinato da vereadora do Rio Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes tem de ser solucionado rapidamente.