Deborah Fortuna
postado em 13/11/2018 19:01
No impulso das pautas polêmicas a serem discutidas no ano que vem, uma mudança na Lei Antiterrorismo (13.260/2016) também deve entrar em pauta no novo governo. Além de outras discussões acaloradas, como o Escola Sem Partido, o Excludente de Ilicitude e a flexibilização do Estatuto do Desarmamento, o projeto que quer mudar o entendimento sobre o terrorismo no Brasil também deve gerar embates dentro do Congresso.
A legislação atual foi sancionada em março de 2016 pela então presidente Dilma Rousseff, sob o embalo das Olimpíadas do mesmo ano. A norma foi aprovada com oito vetos, sendo que dois deles eram sobre a definição de atos de terrorismo. Na época, a Organização das Nações Unidas (ONU) já havia criticado a lei, afirmando que o texto tinha definições vagas e imprecisas sobre o tema. Para evitar polêmicas e por pressão externa, a Câmara escreveu um artigo que evidenciava a exclusão dos movimentos sociais da lei. O parágrafo 2; enfatiza que o artigo não se aplica à conduta individual ou coletiva de pessoas em "manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios".
Em 31 de outubro, a Comissão e Justiça do Senado (CCJ) adiou a discussão sobre a ampliação da lei. Por 9 votos a 4, foi aprovado a realização de uma audiência pública com especialistas para discutir o tema, antes de ser votado. O relator é o senador Magno Malta (PR-ES), que não se reelegeu.
Atualmente, tramita na Câmara dos Deputados um projeto de lei do deputado federal Edson Moreira, n; 5065/2016, que "tipifica atos de terrorismo por motivação ideológica, política, social e criminal". Há outros dois projetos apensados a ele: o PL 9604/2018, do deputado Jerônimo Goergen (PP), e o PL 9858/2018, do deputado Rogério Marinho. Ambos dispõem sobre a atividade terrorista de movimentos sociais.
O texto dialoga com o programa de governo do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), entregue ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante a campanha presidencial. Ao listar oito iniciativas para redução da criminalidade, Bolsonaro fala em "tipificar como terrorismo as invasões de propriedades rurais e urbanas no território brasileiro". Ao longo da disputa pelo Planalto, o militar reformado já havia sinalizado a intenção em tipificar invasão de propriedade por parte do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).
Movimentos Sociais
Para o professor da PUC-SP Cláudio José Langroiva Pereira, o Brasil não é um país livre de ameaças terroristas. Mas qualquer legislação que tipifique atos com ideologia política como terroristas pode enfraquecer o estado democrático de direito. "Temos que entender que o terrorismo envolve uma atividade que é contra a existência do Estado", disse. "Quando falamos de movimentos políticos são os que dizem respeito a um posicionamento. Eles não são contra a existência do Estado. É muito perigoso tipificar isso como terrorismo", completou.
Conforme explicou o especialista, há uma diferença importante na concepção de ambos os significados. Enquanto o terrorismo quer efetivamente destruir o Estado, os movimentos políticos querem questionar. E para o professor, qualquer problema em atos de movimentos sociais devem ser tratados dentro da lei de segurança nacional, "que é uma legislação que visa proteger a integridade do estado democrático de direito vigente".
Sobre depredações ao patrimônio público ou outros problemas que ocorrerem em eventuais movimentos, Pereira acredita que deve ser tratado com a pena e lei já existentes da Segurança Nacional. "A ampliação da lei do antiterrorismo é prejudicial ao estado brasileiro, que faz com que se perca a força do combate ao terrorismo. Do outro lado, ele flexibiliza e enfraquece a criminalização das condutas verdadeiramente terroristas", opinou.
Em coletiva de imprensa na última terça-feira (6/11), o futuro Ministro da Justiça, Sérgio Moro, disse, em nenhum momento, pretende-se criminalizar os movimentos sociais. E que apesar de não serem imputáveis, enquadrá-los na lei antiterrorismo "não é consistente".