Politica

Moreira Franco: "Bolsonaro sabe quem é quem e o papel da imprensa"

Para o ministro de Minas e Energia, a atual equipe do Poder Executivo será reconhecida como a que tirou o país da pior crise da história

Luiz Carlos Azedo, Gláucia Guimarães - Especial para o Correio, Paulo Silva Pinto
postado em 20/12/2018 06:00
Moreira Franco
Wellington Moreira Franco está há quase cinco décadas em cargos públicos. Foi eleito deputado federal em 1974 e, em 1976, prefeito de Niterói. Na década seguinte, governador do Rio. Para ele, o país vive um momento complexo, pois todos os ex-presidentes da República e o futuro, Jair Bolsonaro, enfrentam processos na Justiça.

;Tem alguma coisa errada. Não há sociedade, não há instituição, não há democracia no mundo que conviva com esse tipo de problema;, afirma. Na avaliação do ministro, a apuração de denúncias é indispensável, mas não pode conviver com o que ele chama de espetacularização. Os processos a que responde, espera que sejam tratados agora do ponto de vista técnico, jurídico, livres do que identifica como ;trama; política.

Essa situação é, em parte, responsável, no entender de Moreira Franco, pela impopularidade do atual governo, a despeito das realizações que aponta, sobretudo a recuperação da maior crise econômica da história do país.

Ele acha que muito do futuro do desenvolvimento está contratado, graças, por exemplo, aos projetos de infraestrutura, pelos quais foi responsável desde o início do governo, com o Programa de Parcerias de Investimento (PPI). Ele teve a iniciativa quando ainda ocupava a Secretaria-Geral da Presidência.

Na terça-feira, o ministro visitou a Usina de Belo Monte, que está colocando para funcionar a 12; turbina. O edital para a conclusão da ferrovia Norte-Sul já está na rua, obra que permitirá a ligação dos portos no Sul e no Norte do país, levando os exportadores de grãos a escolherem a melhor alternativa para embarcar os produtos.

Apesar da situação político e jurídica complexa, Moreira Franco acredita que o país encontrará o caminho da prosperidade. ;Estou otimista porque sou otimista;.

O senhor está otimista com relação ao governo Bolsonaro? Tem alguma sugestão?

Estou otimista porque eu sou otimista. Ninguém fica 30 anos na Câmara, como ficou Bolsonaro, acompanhando toda essa aplicação da Constituição de 1988, sem ter capacidade. Ele sabe quem é quem e o papel da imprensa. Eu acho que vai mobilizar toda a sua experiência para resolver os grandes problemas que o país enfrenta na questão fiscal. Com relação à sugestão da minha parte, eu não tenho arrogância necessária, prepotência que normalmente alguns comentaristas têm de achar que eu vou dar um conselho. Você não dá conselho ao Presidente da República.


Na sua avaliação, que país o presidente Michel Temer deixa para Jair Bolsonaro?

O governo Temer deixa um país absolutamente e profundamente diferente do que nós recebemos há pouco mais de dois anos, que vivia a maior e mais grave crise econômica da nossa história. Não é só uma crise, porque nós lamentavelmente não conseguimos ainda dar uma certa estabilidade ao processo de crescimento econômico, nós temos tido, desde 1945, crise de 10 em 10 anos. A crise econômica mais recente foi provocada pela gastança, porque nós já resolvemos o problema cambial e o da inflação com o Plano Real. Mas a gastança ela ainda não está resolvida. E as pessoas em função da crise perderam tudo o que obtiveram, construíram nos 10 anos anteriores. Chegamos a quase 14 milhões de brasileiros desempregados. Hoje, estamos com juros baixos e inflação inferior à meta. Já faz oito meses consecutivos que empregos estão sendo gerados, mas ainda temos um número de desempregados muito grande.

O senhor acha que a condução da economia vai ter continuidade?

Pelo o que eu tenho lido e conheço, não só do Paulo Guedes (futuro ministro da Economia), mas de várias pessoas que estão sendo chamadas para a equipe, eu creio que esses pressupostos continuarão, porque dão certo. Se você pega a carta aos brasileiros e que sustentou o primeiro mandato do presidente Lula, esses princípios estavam lá: ajuste fiscal, gastar o que é possível, poupar, organizar as finanças públicas, controlar a inflação, produzir superavit, organizar para pagar as dívidas, não se endividar mais. Nos princípios do Plano Real, isso também estava lá. Agora, o que é fundamental é a gastança, porque o Lula, depois que arrumou a casa, meteu o pé na jaca e a gastança veio. Fernando Henrique meteu o pé na jaca, e a gastança veio. O governo atual é o primeiro cuja dívida líquida é menor do que quando ele chegou.

Mas esse conserto exigia a reforma da Previdência, o que não saiu. A que se deve essa frustração?

A reforma da Previdência sempre foi um problema grave. O presidente Juscelino Kubitschek usou muito os recursos da Previdência para tornar a nova capital uma realidade, e isso porque nós tínhamos um volume de contribuição muito maior. A Previdência foi criada lá na década de 1940, então não havia um número de aposentados muito grande, esse tipo de uso de recurso da Previdência, que somaram a privilégios monumentais que se agravam no Brasil a cada ano. Pessoas que ganham menos pagam e sustentam aposentadorias integrais de outros, no setor público. Se você vai para a vida privada, isso não existe. O governo Temer teve coragem de enfrentar o problema. Hoje, não há nenhum analista que consiga projetar qualquer consistência na solução do problema fiscal se não fizermos a Reforma da Previdência. Então, ela está no calendário.


Como o senhor explica esta situação do governo: é bem sucedido na gestão da economia e mal-sucedido na política, principalmente no ponto de vista eleitoral.

É uma razão muito simples, isso é fonte de muita preocupação para todos nós, que temos compromisso no sistema democrático do Brasil. O presidente Michel Temer não chegou à Presidência pelo eleitor brasileiro, mas em função do impeachment. Quem votou no Temer para presidente foi deputado e senador, tanto que o ;Fora Temer;, ;golpista; era em relação a isso. O presidencialismo de coalizão já estava dando demonstrações de fragilidade, desgaste, porque esse sistema já estava produzindo um segundo impeachment: primeiro o do Collor, depois, o da Dilma. O presidente Temer percebeu isso pela experiência parlamentar e ele teve uma relação muito grande com o Congresso e aprovou coisas dificílimas. O limite de teto não é pouca coisa.

Uma das razões para a impopularidade do governo é o grande número de pessoas que respondem a processo por corrupção. É o caso do senhor, cujos processos vão agora para a primeira instância. Qual sua avaliação disso? O senhor teme ser preso eventualmente?

Não há nenhum ex-presidente da República que não responda a nenhum processo judicial, o que não é uma coisa trivial, não é normal, tem alguma coisa errada nessa história. E o pior, o mais grave, o futuro presidente da República já está sendo preparado para responder processo. Ele e o filho, que é senador, o ministro da Fazenda, que vai ser uma peça importante, e o chefe da Casa Civil. Tem alguma coisa errada. Não há sociedade, não há instituição, não há democracia no mundo que conviva com esse tipo de problema. O que não cabe é você ter ação judicial como ação política, você pode desgastar o governo e aliás o grande problema da popularidade do presidente foi esse. Foi uma trama, e essa trama mostra o ambiente que a imprensa brasileira espetaculariza.

E o seu caso?

Isto mostra a gravidade desse constrangimento deste ambiente de trama, de denúncia. Como não se apura, colocam as pessoas tendo o constrangimento de responder a uma hipótese sem nenhum tipo de apuração. Essa é uma pergunta que você faz a quem já tem algum tipo de culpa, um volume de delitos que foram apurados e aprovados. Hoje você faz essa pergunta a qualquer um. A vida não pode ser assim. Da mesma forma que nós respeitamos as instituições, nós temos que ser respeitados por elas. Então esse é um ponto que mostra a fragilidade desse processo. O desmonte moral que se procura fazer com quem tem mandato político no país leva a uma instabilidade político-institucional. É muito ruim. Eu fui prefeito com 30 anos, fui governador com 40. Você acha que, com 74 anos, eu ia me prestar a fazer qualquer tipo de ilícito? Eu acho que, para mim e para os outros, vai ser uma solução boa (passar à primeira instância), porque vai tirar do problema político e vai levar para o problema judicial. Vai tirar a manipulação política. Essa especularização só constrói um ambiente fascista no país.

O senhor acha que esse processo, inclusive envolvendo o presidente Temer, que teve dois pedidos de impeachment rejeitados na Câmara, teve impacto no resultado da eleição?

Não, porque o único candidato que não falou do Temer foi o Bolsonaro, porque creio que ficou comprovado que o nome Temer não era contaminador, não há movimentação na rua que envolva o governo Temer.

O senhor foi uma espécie de coringa no governo, passou pela Secretaria-geral da Presidência, agora é ministro de Minas e Energia. O que pode ser feito e o que não pode ser feito do ponto de vista de infraestrutura no país?

Precisa de muita coisa. O grande problema é que estamos numa situação fiscal muito precária, o poder público não tem recursos para fazer investimentos necessários em infraestrutura. Nós hoje vamos atingir um recorde de exportação do agronegócio e a perda decorrente da fragilidade logística que o agronegócio, sobretudo, grãos e proteína animal, tem é uma brutalidade. Se não tivéssemos nós uma produtividade enorme, não seríamos competitivos no mundo.


O eixo do comércio mundial saiu do Atlântico e do Pacífico e nós temos uma infraestrutura de logística toda voltada para o Atlântico. Como o senhor vê essa questão?

Primeiro, as pessoas têm que se informar, estudar e enfrentar isso com muita cautela, porque de fato há uma crise, o eixo Atlântico de comércio está em crise, a Europa e os Estados Unidos estão em crise. O maior parceiro comercial, o principal parceiro comercial do Brasil é a China, e esse eixo. Os chineses se preocupam muito em criar condições de incorporar a América do Sul e a Latina ao eixo Pacífico.

O que é que o senhor vai fazer depois que sair do governo?

Eu acredito que prioridade é uma palavra singular, não é plural, os economistas brasileiros, quando puseram o S e transformaram em plural uma palavra que é para expressar uma coisa única, criaram essa confusão toda. Eu não quero contribuir para que essa frágil situação econômica social que nós ainda vivemos perdure, então eu vou primeiro acabar o governo. Depois eu vejo o que faço.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação