;Há um processo amplo de realinhamento partidário;, afirma Paulo Calmon, diretor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (Ipol-UnB). Haverá uma etapa fundamental nesta semana: a distribuição do comando das comissões. Por ora, a escolha das mesas diretoras das duas casas é a mais eloquente demonstração do novo arranjo. O MDB, que tem a maior bancada no Senado, ficou apenas com a Segunda Secretaria da casa.
Renan Calheiros (MDB-AL) tentou a presidência, mas perdeu de forma acachapante para Davi Alcolumbre (DEM-AP) no último dia 2, um sábado. Na quarta-feira da semana passada, quando houve a eleição da Mesa, o PT ficou apenas com uma suplência. Na Câmara, para a qual conseguiu eleger a maior bancada, também tem apenas uma suplência, assim como o MDB.
Acabou o critério de proporcionalidade das bancadas, que, em outros tempos, teria dado posições mais importantes aos partidos, mesmo os não alinhados com o governo. Isso é, na avaliação de Calmon, indicador de uma mudança estrutural. ;A proporcionalidade é seguida quando se busca a construção de grandes acordos e coalizões. Não é o que se sinaliza que será feito a partir de agora. O que virá, porém, ainda é incerto;, explica.
Na avaliação do professor da UnB, a polarização e o confronto que marcaram as eleições ainda se fazem presentes no Congresso. Em que medida isso vai contribuir para aglutinar forças a favor das reformas, como o governo espera, ou vai atrapalhar, é algo a ser testado.
[SAIBAMAIS]A capacidade do PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, de liderar as negociações também será posta à prova. No Senado, o partido se saiu bem. Com apenas quatro assentos na Casa, conseguiu fazer de Flávio Bolsonaro (RJ), filho do presidente, o terceiro secretário. O líder do partido, Major Olímpio (SP), deve ter papel decisivo nas negociações de projetos de lei.
Na Câmara, porém, o partido, que conquistou nas urnas a segunda maior bancada, atrás apenas do PT, enfrenta divisões internas. O líder do governo, Major Vítor Hugo (PSL-GO), não conseguiu juntar quórum significativo de deputados nas reuniões que marcou. E, pior, tem pouco trânsito entre líderes partidários. Um dos problemas é que ele é do mesmo estado do líder do partido, Delegado Waldir, e disputa espaço com ele entre eleitores.
A reeleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ) para presidente da Câmara foi tranquila e a ela se seguiu a escolha de toda a Mesa, ainda na sexta-feira, o primeiro dia do mês. No Senado, a disputa foi intensa, tumultuada e prolongou-se pelo fim de semana. Mas o que se vê agora é o inverso: uma situação muito mais serena na câmara alta do que na baixa. ;Esperava-se que Alcolumbre seria um desastre como presidente, já que é pouco experiente. Mas o que se está vendo é o inverso. Em terra de cego, quem tem um olho é rei;, afirma Antônio Augusto de Queiroz, diretor de documentação do Departamento Intersindical de Análise Parlamentar (Diap).
Para o cientista político Paulo Baía, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), os acordos serão construídos em função de cada projeto. ;Não haverá alinhamento automático. Os partidos vão determinar o comportamento a partir de cada pauta;, afirma. Ele explica que isso não significa necessariamente instabilidade. ;O governo está bem. Há mais convergências do que divergências. As forças são favoráveis, por exemplo, às propostas apresentadas por Sérgio Moro, que encontraram boa acolhida;, nota. Isso não significa, porém, que não haverá turbulências. ;A reação à Previdência ainda é uma incógnita;, destaca.
Nessa primeira semana, ficou clara a redistribuição de forças entre os partidos, apontam os especialistas (leia quadro ao lado). O DEM é o claro vitorioso, com a reeleição de Maia na Câmara e a conquista da presidência do Senado por Alcolumbre. O PSD se destaca entre os partidos do Centrão, grupo que deve se alinhar ao governo, ainda que de forma não automática. No Senado, Sérgio Petecão (AC) foi eleito primeiro-secretário. A tendência é de que o partido conquiste a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) na próxima semana. Na Câmara, Fábio Faria (PSD-RN) ficou com a Terceira Secretaria. O Podemos é uma estrela em ascensão. Colocou o senador Lasier Martins (RS) na segunda vice-presidência da Casa, após crescer com adesões, como a do próprio Lasier, egresso do PSD. A troca, aliás, irritou o presidente do partido, o ex-ministro Gilberto Kassab.
O PSDB, que encolheu consideravelmente nas urnas, ficou apenas com uma suplência na Mesa da Câmara, mas saiu-se bem no Senado. Graças ao apoio à candidatura de Alcolumbre, conquistou a Primeira Vice-Presidência, na qual ficou Antonio Anastasia (MG). O governo ainda não tem um líder na Casa, cargo para o qual um dos cotados é Espiridião Amin (PP-SC). O partido, que também integra o centrão, é herdeiro do PDS, partido do governo no fim do regime militar. Entre as legendas tradicionais, está entre as que mantém força, com chance de ter protagonismo nas discussões. ;Eles dispõem de quadros importantes no Congresso;, explica Queiroz, do Diap. Cita, por exemplo, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) ; em 2016, na condição de líder do partido na Câmara, o parlamentar encaminhou votação favorável ao impeachment de Dilma Rousseff, mesmo tendo sido ministro dela.
O MDB, que já foi o maior partido do Congresso, está entre os perdedores. No Senado, depois da derrota de Renan, conseguiu se recompor. Aceitou a Segunda Secretaria, que ficou com Eduardo Gomes (TO), e espera conquistar a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), principal colegiado temático. Seria uma compensação ao fato de ter a maior bancada e não ter ficado com a Presidência. Aceita, também, colocar em seu comando a senadora Simone Tebet (MDB-MS), adversária de Renan. Ela disputou com o alagoano a indicação do partido para disputar a presidência. No sábado, apresentou-se como candidata avulsa e mais tarde, a pedido dos apoiadores de Alcolumbre, retirou a postulação. O partido também tenta emplacar o senador Fernando Bezerra (PE) como líder do governo na casa, o que garantiria a manutenção de grande parte do protagonismo do passado.
;Vitimização;
Pela esquerda, PDT e PSB tendem a liderar as discussões no Congresso, conseguindo eventualmente negociar mudanças em projetos do governo. Para o PT, será complicado exercer qualquer protagonismo. ;A situação do partido é muito difícil. Insistem no discurso da vitimização de Lula, o que é um erro diante da derrota eleitoral que sofreram;, critica Baía. Na Câmara, o bloco que o partido lidera deve ser o 11; na ordem de escolha das 25 comissões, o que significa que provavelmente não sobrará algo de grande relevância. No Senado, o líder, Humberto Costa (PE), espera que o partido fique com a Comissão de Direitos Humanos, ainda que, pela proporcionalidade, diz, lhe coubesse a de Relações Exteriores, mais significativa. Mas sequer isso é garantido.;Há mais convergências do que divergências. As forças são favoráveis, por exemplo, às propostas apresentadas por Sérgio Moro, que encontraram boa acolhida. Mas a reação à Previdência ainda é uma incógnita;
Paulo Baía, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro