Politica

Confira a repercussão das declarações de Bolsonaro sobre a Previdência

Por mais que a avaliação das lideranças seja de que o presidente não teria outra escolha além de retroceder, o aceno mostra sensibilidade de um gestor que deseja acelerar a composição de uma base aliada sólida.

Rodolfo Costa , Bernardo Bittar
postado em 01/03/2019 06:00
Onyx Lorenzoni é um dos responsáveis por fazer com que a reforma pensada pelo ministro Paulo Guedes, com ou sem mudanças, seja aceita pelo Congresso

A atitude de o presidente Jair Bolsonaro ceder em relação ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) foi elogiada no Congresso. Por mais que a avaliação das lideranças seja de que o presidente não teria outra escolha além de retroceder, o aceno mostra sensibilidade de um gestor que deseja acelerar a composição de uma base aliada sólida. A crítica ao BPC é apenas uma das reclamações levadas pelos líderes na reunião de terça-feira com Bolsonaro. Os dispositivos de aposentadoria para trabalhadores rurais e de professores também foram alvo de objeção dos congressistas. No café da manhã com jornalistas, a alteração da regra de aposentadoria para mulheres de 62 anos para 60 também foi colocada.

Apesar de reconhecer a sensibilidade de Bolsonaro com o tema, a análise de alguns parlamentares é de que a equipe econômica colocou ;gordura; no lugar errado, como na regra do BPC. Afinal, pegou mal encaminhar uma aposentadoria com regras duras para a população idosa e de baixa renda. ;O governo argumenta que quem ganha menos paga menos e quem ganha mais paga mais. Mas não dá para defender essa retórica oferecendo R$ 400 para o idoso pobre;, criticou um aliado.

A decisão de Bolsonaro em rever as regras do BPC e de idade mínima para as mulheres pegou de surpresa a própria articulação política. Depois do café com a imprensa, a líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), se reuniu com a equipe econômica para discutir o assunto. A possibilidade de redução da idade mínima para mulheres foi confirmada pela parlamentar. Ela alertou, contudo, para o risco de redução da economia potencial gerada aos cofres públicos.

O texto encaminhado pelo governo ao Congresso prevê o enxugamento de R$ 1,16 trilhão de gastos em 10 anos. Quanto mais concessões forem feitas, menores serão os ganhos para o ajuste fiscal. ;Conversei com a equipe econômica. O Congresso Nacional tem poder de mexer na reforma, mas precisa entender que, a cada mexida, corremos o risco de perder na economia. Mas o presidente é muito sensível. O que está fazendo é mandar recado, dizer que está disposto a negociar;, disse Joice.

As mudanças à reforma precisam ser propostas pelos próprios deputados. A forma como serão feitas as alterações podem ser mais fáceis ou difíceis a depender da chancela do governo. Como Bolsonaro já acenou com o recuo, Joice e o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), atuarão para chegar a um denominador comum que atenda à economia buscada pelo governo e a regras mais palatáveis para os deputados.

Os diálogos de como promover a articulação para as mudanças ao texto começam hoje. Desde terça-feira, está prevista uma reunião entre Joice, Vitor Hugo e o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. No encontro, os responsáveis pela articulação política devem analisar os espaços que o governo tem para ceder a apadrinhados de aliados políticos e como preenchê-los no processo de interlocução com os parlamentares. Além de espaços em órgãos do governo, o Planalto vai trabalhar para liberar emendas impositivas ; recursos que o governo é obrigado a executar. Joice confirma que o governo negocia as emendas e cargos, mas frisou que é um movimento parte do processo político. ;É saudável, desde que as emendas sejam levadas para o bem da população. Não existe chantagem;, declarou.

Especialistas


Os recuos anunciados ontem pelo presidente Jair Bolsonaro na reforma da Previdência não surpreenderam os especialistas que acompanham o tema. O economista Nelson Marconi, da Fundação Getulio Vargas (FGV), considera que a reforma está dura em relação aos mais pobres e, portanto, há muita margem para mudanças. ;O governo colocou uma série de medidas que prejudicam esse público, justamente para tirar durante as negociações;, comentou. O entendimento é de que os possíveis ganhos fiscais, mesmo que bilionários, não valem o desgaste político de se tocar no Benefício de Prestação Continuada. ;É um ponto que vai contra a ideia de corte de privilégios e está longe de ser algo imprescindível na reforma;, comentou Marconi.

Bolsonaro também mencionou possíveis mudanças no cálculo da pensão por morte, que passaria a ser de 60% do valor do benefício, com 10% adicionais a cada dependente. A cota inicial pode passar para 70%. Essa é uma preocupação de todas as faixas de renda, mas demanda especial de servidores públicos. Eles também pedem que seja revista a limitação para acumular benefícios. Outros recuos são esperados na aposentadoria rural, tanto quanto às idades mínimas quanto ao tempo de contribuição. A proposta exige 20 anos de homens e mulheres. ;Não tem como não mexer nisso;, acredita Marconi.

Já aumentar a diferença entre a idade mínima de homens e mulheres ; ao propor 60 para elas, em vez dos 62 propostos na PEC ; não era necessário, a princípio, mas é visto como um aceno aos deputados da oposição e da bancada feminina. ;As ideias mencionadas por ele vão na direção de amenizar o impacto da reforma, mas isso não é o suficiente;, disse o economista Fernando de Aquino, coordenador da Comissão de Previdência do Conselho Federal de Economia (Cofecon). Para Aquino, um dos maiores problemas da reforma é o fato de o governo já ter fixado a economia a ser gerada, de R$ 1 trilhão em 10 anos, e pressionar em cima dessa cifra. ;Tem que pensar a reforma em termos sociais e ver até onde dá para conseguir economizar;, disse.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação