Cláudia Dianni, Alessandra Azevedo
postado em 05/04/2019 06:00
Um dia depois da confusão gerada pelo bate-boca entre deputados e o ministro da Economia, Paulo Guedes, na Comissão de Constituição e Justiça, foi a vez do secretário especial adjunto, Bruno Bianco, enfrentar seis horas de debates na mesma CCJ sobre a reforma da Previdência. O clima esteve mais ameno. Mesmo assim, o deputado Felipe Francischini (PSL-PR), que preside o colegiado, precisou levantar a voz várias vezes para conter parlamentares e chegou a afirmar que estava ;perdendo a paciência;. A Comissão convidou especialistas para opinar sobre a constitucionalidade da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) e sobre a intenção do governo de retirar da Carta Magna alguns pontos relativos ao sistema previdenciário.
Bianco negou que a desconstitucionalização de pontos da Previdência Social represente um ;cheque em branco; da sociedade para o governo, conforme acusam parlamentares. Segundo ele, a PEC não elimina parâmetros e garantias constitucionais, mas transfere detalhes para lei complementar a ser editada. ;Não há no mundo Constituição Federal que traga regra de acesso e cálculo de benefício;, comparou.
Uma das principais dúvidas dos deputados foi com relação à introdução do regime de capitalização. Segundo o secretário, a PEC não introduz o sistema, mas autoriza a criação, que será detalhada em lei complementar. Bianco garantiu que ninguém receberá menos de um salário mínimo como aposentadoria, caso a proposta seja aprovada, mesmo se a pessoa não conseguir capitalizar valor suficiente. ;Haverá uma camada de solidariedade que nos permite garantir que ninguém, seja no regime atual ou no de capitalização, ganhe menos do que o salário mínimo;, explicou. Segundo ele, a diferença será coberta pelo governo. Ele também defendeu um regime de capitalização, ;não necessariamente total;, como alternativa ao atual, de repartição, pelo qual os trabalhadores da ativa pagam os benefícios dos aposentados.
O secretário também respondeu a críticas de que a proposta penaliza os mais pobres. ;O regime geral tem três alíquotas: 8%, 9% e 11%, enquanto o regime próprio dos servidores, atualmente, cobra a mesma alíquota de quem ganha R$ 1 mil e de quem ganha R$ 30 mil;, comparou. ;Sob a alegação de proteger os mais pobres, querem defender suas alíquotas;, disse. Pela PEC, a alíquota dos servidores passaria a variar entre 11% e 16%, de acordo com a renda.
Críticas e defesas
Para os críticos da desconstitucionalização da Previdência, os avanços sociais e direitos dos cidadãos estarão em risco. As futuras alterações no sistema poderiam ser feitas por simples projetos de lei, e não por propostas de emenda constitucional. As PECs requerem duas votações em cada casa do Congresso (Senado e Câmara) com maioria qualificada, ou seja, um amplo debate como o atual.O advogado José Roberto Soderno Victório, que preside a Comissão de Direito Previdenciário da OAB-SP, afirmou que ;a proposta não foi apresentada com estudo atuarial e não traz os custos de transição, o que é inconstitucional, pois não traz previsão legal de receitas, apenas aponta despesas;. Já para a procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo Élida Graziane Pinto, a PEC coloca em risco o bem-estar social da Constituição que, amparada por confirmação do Supremo Tribunal Federal (STF), impede retrocessos, o que a procuradora enxerga no texto.
Para a professora de seguridade social e procuradora regional da República Zélia Luiza Pierdoná, a PEC não representa retrocesso social, nem é inconstitucional. ;Estou certa de que a reforma não significa restrição de direito, mas garantia de direito;. No entanto, ela vê possíveis inconstitucionalidades em relação a regras propostas para professores e policiais. O professor de direito previdenciário Arthur Bragança de Vasconcellos Weintraub, assessor chefe adjunto da Assessoria Especial do presidente da República, também argumentou que a proposta não retirará benefícios garantidos na Carta Magna.