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Coaf: governo promete empenho e 'tsunami' para reverter derrota

Governo se mobiliza para barrar transferência do Coaf da Justiça para a Economia. Bolsonaro menciona "tsunami na semana que vem"

Rodolfo Costa , Bernardo Bittar
postado em 11/05/2019 07:00
Sérgio Moro trabalhará com Onyx Lorenzoni para convencer parlamentares a manter Coaf no Ministério da Justiça

O governo não vai deixar barato o revés sofrido no Congresso com a transferência do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Justiça para a pasta da Economia. A ordem é trabalhar o convencimento junto a deputados e senadores para reverter a derrota amargada na Comissão Mista que trata da Medida Provisória (MP) 870, da reforma administrativa. A estratégia é amenizar o ;tsunami na semana que vem;, expressão usada pelo próprio presidente Jair Bolsonaro ao comentar, ontem, ;alguns problemas; enfrentados.

A articulação foi desenhada entre o Planalto e o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. A ideia é que ele e o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, recebam parlamentares para reuniões ;até que acabe o café da Esplanada;, como mencionou um interlocutor do Planalto. O Palácio não quer deixar o articulador do governo sobrecarregado na função, ou seja, caberá ao ex-juiz trabalhar para reverter, no plenário da Câmara, a medida de realocação do Coaf.

Interessado na vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), que abre em 2020, Moro precisa mostrar ao Planalto o poder de articulação enquanto aliado do governo. ;Só assim conseguirá ficar com a cadeira no STF, uma das mais cobiçadas do país e, em especial, cobiçada por ele. O ministro Moro foi juiz auxiliar na Corte. Quer voltar por cima;, analisou um técnico judiciário.

Para conseguir o almejado cargo na Corte, o ministro da Justiça terá de permanecer, ao menos durante um ano, no cargo que ocupa atualmente, além de convencer o presidente da República, responsável pelas indicações dos ministros do STF, de que será um aliado de primeira hora do Planalto. ;O cargo no Supremo é, além de tudo, político. Se Moro não conseguir vencer as dificuldades no plenário para tentar conseguir uma coisa que ele mesmo almeja (a permanência do Coaf na Justiça), que serventia terá para o governo em tempos difíceis?;, ponderou um assessor palaciano.

Articulação


A meta de Moro, entretanto, não é fácil. A derrota em relação ao Coaf não ocorreu à toa. Foi um recado cirúrgico orquestrado pelo Centrão. Lideranças do partido criticam, desde o início do ano legislativo, em fevereiro, a interlocução feita pela Casa Civil. Lideranças nos partidos admitem que nada têm contra o ministro, mas avaliam que era preciso dar uma resposta dura ao governo. ;Essa derrota o governo pode pôr na conta do Onyx. E não adianta colocar o Moro para falar com 10, 20 ou 30 parlamentares. Enquanto a articulação não mudar, novas derrotas virão;, alertou um deles.

O golpe foi sentido. O assunto acabou sendo amplamente comentado nos corredores do Planalto entre quinta e sexta-feira. Sobretudo ontem, com a poeira baixada. A leitura é de que algo precisa ser feito, mudanças ou intensificações no diálogo com o parlamento, principalmente em relação ao Centrão. O bloco partidário almeja ocupar espaços no governo por meio de indicações políticas nos estados. Até o momento, essa interlocução está parada ; a Casa Civil é acusada por lideranças de privilegiar apenas congressistas próximos e fiéis a Lorenzoni.

A preocupação em relação aos próximos movimentos foi sinalizada por Bolsonaro. Ontem, sustentou que o governo deve se antecipar aos desafios que virão, mas citou quais serão. ;Assim estamos governando. Alguns problemas? Sim. Talvez, tenha um tsunami na semana que vem, mas a gente vence esse obstáculo aí, com toda a certeza. Somos humanos, alguns erram. Alguns erros são perdoáveis, outros, não;, declarou.

O governo corre contra o tempo para prover uma articulação capaz de reverter o resultado em plenário. Para isso, é necessário haver precisão, sem espaço para erros. Afinal, a MP 870 perde efeito em 3 de junho e, na frente dela, há cinco MPs a serem votadas. Ou seja, a interlocução do governo precisará de um esforço concentrado para colocar o Congresso votando as matérias.

Um afago em Moro

Um dia após sofrer derrota no Congresso, com a volta do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para o Ministério da Economia, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, que luta para ter o conselho em sua pasta, recebeu um discreto afago do presidente Jair Bolsonaro. Durante a solenidade de lançamento da pedra fundamental da Ponte de Integração Brasil-Paraguai, ontem, em Itaipu, o chefe do Planalto definiu Moro como ;ícone do Brasil;.

Moro não ocupou a mesa principal no palco do evento e passou quase despercebido na solenidade, que reuniu outros ministros, como o da Infraestrutura, Tarcísio Freitas; e das Minas e Energia, almirante Bento Albuquerque. Sentado na fileira de frente do público convidado, ele não foi citado pelo cerimonialista oficial na abertura da solenidade. Também não teve o nome lembrado no início do discurso do diretor-geral da Itaipu Binacional, general Joaquim Silva Luna, o primeiro a discursar. A assessoria do presidente informou que apenas os ministros que tinham relação com o evento foram chamados à mesa principal.

Em um discurso de menos de cinco minutos, o presidente elogiou os militares, atacados pela ala de seu governo influenciada pelo escritor Olavo de Carvalho. Ao se referir à sua condição de presidente paraquedista, como o é também o presidente do Paraguai, Mário Abdo Benitez, ele lembrou que, no passado, ;os presidentes militares nos legaram grandes obras;. A primeira ponte ligando Foz do Iguaçu, no Brasil, e Ciudad del Este, no Paraguai, foi construída há 54 anos pelos respectivos governos militares da época, Castelo Branco e Alfredo Stroessner.

No rápido discurso, ele voltou a criticar governos anteriores. ;Como é bom estar à frente de um país onde aquelas velhas ideologias foram deixadas para trás. Como é bom ter país vizinho e amigo como este do Estado do Paraguai. Juntos, somamos forças, proporcionando dias melhores para os nossos povos. Para nós, políticos, não existe prêmio maior que a sensação do dever cumprido.;

Parlamentares vão tentar derrubar MP

Após derrota na votação da medida provisória que reestruturou os ministérios, o governo deve sofrer um novo revés nos próximos dias. Parlamentares promoveram, nesta semana, uma debandada da Comissão Mista que analisa novas regras para a contribuição sindical.

Segundo deputados e senadores que encabeçam o movimento, a ideia é impedir que o colegiado tenha quórum mínimo para funcionar e, assim, deixar a MP caducar. Caso não seja aprovada até o fim de junho, a medida que impede o desconto da contribuição sindical em folha salarial perde a validade.

Ao longo da semana, foram desligados 22 membros de 10 partidos diferentes ; DEM, PP, PR, PTB, Solidariedade, PSB, PSD, PT, MDB e Pros ; e novos saídas devem ocorrer na semana que vem, o que pode inviabilizar o início da comissão. A primeira reunião foi suspensa após a instalação, na quarta-feira.

Entre os que já avisaram que vão sair está o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP). ;Conversamos com os membros e, para não ficar com essa história de toda semana ficar tentando instalar, acharam melhor se retirar do colegiado;, disse. A medida provisória foi a terceira a ser editada pelo presidente Jair Bolsonaro.

O movimento foi liderado pelo presidente do Solidariedade, Paulo Pereira da Silva (SP), o Paulinho da Força, com apoio de líderes da oposição e do Centrão. ;Não concordamos com esse radicalismo que o governo está colocando e que praticamente destrói a estrutura sindical;, frisou.

A debandada da comissão foi determinada pelos líderes partidários e pegou alguns parlamentares de surpresa. O deputado Pedro Lucas Fernandes (PTB-MA) afirmou que não sabia que havia sido desligado. ;Estou esperando ver o que acontece. A MP está parada, ninguém indicou nada.;

O líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), admitiu que a estratégia foi uma retaliação ao governo. ;O critério que estão estabelecendo para a distribuição de MPs não é o que havia sido acordado;, justificou. Braga reclamou do fato de o MDB, que tem a maior representação no Senado, ter ficado com apenas uma relatoria até agora, enquanto bancadas menores já receberam mais. As quatro MPs enviadas por Bolsonaro que já têm relator estão com PSC, DEM, PSDB e Solidariedade.

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