Rodolfo Costa
postado em 18/05/2019 07:00
O aprofundamento das investigações sobre o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), a citação do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), na delação do dono da Gol, Henrique Constantino, e a segunda prisão do ex-presidente Michel Temer vão unir PSL, PT e Centrão na Câmara em torno da proposta que altera a Lei de Abuso de Autoridade (4.898/65) para limitar o poder de procuradores e juízes. O governo, por meio da Casa Civil, quer permanecer fora dessa articulação e limitar-se a fazer vista grossa, de modo a evitar desgaste junto à base eleitoral do presidente Jair Bolsonaro.
A ideia de destravar a pauta do abuso de autoridade, que se encontra na Câmara, começou a ser maturada após a primeira prisão de Temer, em março deste ano. Naquela época, membros do Centrão trataram informalmente sobre o assunto em conversas reservadas. Faltava, entretanto, combinar com o PSL. Bolsonaro e os parlamentares do partido foram eleitos com o argumento de serem intransigentes na luta contra a corrupção. Quaisquer movimentos que apontassem para alguma tentativa de encaminhar a matéria dariam motivos para a bancada pesselista atacar.
O cenário, no entanto, mudou. As investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) sobre Flávio Bolsonaro incomodaram alguns parlamentares do PSL. O movimento, por ora, não tem a adesão de todos os congressistas do partido na Câmara e no Senado. Mas há uma mobilização interna para criar uma consistência em torno do tema. Sobretudo depois da resposta que Bolsonaro deu na quinta-feira em Dallas, nos Estados Unidos, provocando os procuradores a quebrarem o sigilo dele. ;O MP está passando dos limites. Tem toda a condição de investigar, mas é preciso colocar um freio. O que estão fazendo com o Flávio é mais uma exposição política do que técnica. Tem que existir algum dispositivo que faça os investigadores pagarem o preço se não identificarem nada nessas quebras de sigilo;, criticou um parlamentar do PSL.
Os pesselistas mais favoráveis ao encaminhamento da matéria mantêm conversas com parlamentares do Centrão. A oposição não tem um diálogo estreito com esses congressistas, mas tenderia a apoiar. O tema do abuso de autoridade começou a ganhar força ainda na Comissão Especial Mista da Medida Provisória n; 870, da reforma administrativa. O senador Fernando Bezerra (MDB-PE), relator da proposta e líder do governo no Senado, incluiu no parecer um trecho limitando a atuação dos auditores fiscais da Receita Federal, impedindo-os de fazer investigações de crimes não tributários.
Votaram pela emenda que limita a atuação dos auditores 15 parlamentares, entre deputados e senadores, do MDB, PSDB, PP, PSD, DEM e PR, do lado do Centrão, o PT, pela oposição, e o Podemos. Ali, ficou reforçada a disposição de parlamentares para discutir o abuso de autoridade. O argumento usado por congressistas não é de ;amordaçar; o Judiciário e o Ministério Público, mas estabelecer responsabilidades e regras para quem não cumpri-las.
Sinergia
A ideia é tocar a proposta instalando a Comissão Especial do projeto de lei n; 6.361/09, que tem apensado a essa matéria o PL n; 7.596/2017. Foram propostos no Senado e aprovados na Casa. A primeira matéria é de autoria do ex-senador Demóstenes Torres (GO), e a outra, do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Os textos incluem quatro novas hipóteses entre os atos considerados abuso de autoridade e estabelece penas, desde advertência à detenção e perda do cargo.
Embora haja sinergia para a criação da Comissão Especial, existe o impasse sobre quem vai levantar primeiro a bandeira da pauta. O PSL quer se manter fora dos holofotes e esperar que alguém tome a iniciativa. O PT vai permanecer interessado, mas observando de longe. O Centrão também não tem interesse em abraçar a matéria, sob risco de passar a imagem de um movimento para proteger Rodrigo Maia. Por via das dúvidas, a ideia é deixar a poeira baixar e discutir o assunto, quando a tramitação da reforma da Previdência estiver a todo vapor, de modo a não chamar muito a atenção.
O senador Randolfe Rodrigues critica as movimentações e sustenta que o projeto originário proposto por ele não existe mais. ;O PL n; 7.596/2017 é um projeto deformado que não diz mais respeito ao propósito original. Originalmente, foi apresentado reproduzindo sugestões entregues pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot. Não tem mais razão e ligação com o espírito do que deveria ser a revisão do abuso de autoridade. O que está ocorrendo são alianças daqueles que se diziam nova política com os da velha política para tentar impedir que investigações avancem;, avaliou.