postado em 02/06/2019 04:24
A ética na política
;A política como vocação;, clássico da ciência política, é o texto de uma conferência realizada por Max Weber em 1918, e publicado em 1919 na Alemanha. O sábio economista e jurista alemão trata a política como ;o conjunto de esforços feitos visando à participação do poder ou a influenciar a decisão do poder, seja entre Estados, seja no interior de um único Estado;. Segundo ele, quem se mete com a política quer poder, seja para fins ideais, por interesses econômico-financeiros ou em busca de prestígio. Para que o poder exista, porém, é preciso que a sociedade aceite a dominação do Estado.
Há três formas de dominação no Estado moderno: a tradicional, que se fundamenta e se legitima no passado, pela tradição; o domínio exercido pelo carisma e se fundamenta em dons pessoais e intransferíveis do líder; e a exercida pela legalidade, com base em regras racionalmente criadas e fundamentado na competência. Nas democracias do Ocidente, essas formas de dominação aparecem simultaneamente, mas o carisma é o fator decisivo para a chegada ao poder. O líder carismático, porém, necessita de meios materiais e conhecimento administrativo para exercer seu domínio.
É nesse contexto que surge o ;político profissional;, que Weber classifica entre os que ;vivem para a política; e aqueles que ;vivem da política;. Todo cidadão pode e deve participar da vida política, mas nem todos têm tempo disponível e recursos para isso. Por isso, ;todo homem sério, que vive para uma causa, vive também dela;, mas isso não impede a diferenciação entre os que têm a política como ;bem comum;e os que a veem como negócio.
Paralelamente à existência dos políticos, existe uma burocracia formada por funcionários e técnicos encarregados de operar a máquina do Estado. Por essa razão, além dos objetivos programáticos, se estabelece entre os políticos uma disputa pela ocupação de cargos e a distribuição de recursos do governo. Nessa dinâmica, surge ainda uma camada de dirigentes partidários formada a partir de critérios plutocráticos e que vão ocupar posições no governo ou na máquina partidária. Para Weber, essas são as bases potenciais de ;uma tendência que leva à criação de uma casta de filisteus corruptos;.
No Brasil, onde não existe regulamentação do lobby, como nos Estados Unidos e alguns países da Europa, todos os políticos defendem o ;bem comum;, ninguém assume a política como negócio, com exceção, talvez, da bancada ruralista, embora o patrimonialismo, o cartorialismo e o fisiologismo sejam marcas registradas da nossa cultura ibérica. Mesmo assim, no Estado brasileiro, foi possível constituir uma burocracia formada por ;trabalhadores especializados, altamente qualificados e que se preparam, durante muito tempo, para o desempenho de sua tarefa profissional, sendo animados por um sentimento muito desenvolvido de honra corporativa, em que se realça o sentimento da integridade;.
Lava-Jato
A Operação lava-Jato é um tremendo choque entre os políticos profissionais e essa burocracia, que desnudou o lado escuro da nossa política como negócios. Disso resultou a crise ética dos grandes partidos e o tsunami eleitoral de 2018. Em parte, a eleição do presidente Jair Bolsonaro é resultado desse fenômeno. Entretanto, não existe democracia sem partidos nem políticos, o país não pode ser paralisado pela crise ética. Além disso, a política é a economia concentrada, ou seja, não existe sem o mundo dos negócios. Há que se reinventar a nossa política, sem jogar a criança fora com a água da bacia, mas está difícil porque predomina a antipolítica como sentimento popular.
É aí que entra a discussão sobre a ética das convicções e a ética da responsabilidade proposta por Weber, ao examinar a relação entre o protestantismo e o capitalismo. A ética utilizada para culpar o passado pelos próprios fracassos é vulgar e limitada, como a do homem que justifica o abandono da esposa porque ela não era digna do seu amor. A relação entre política e religião é apartada: ;O cristão cumpre seu dever segundo os mandamentos bíblicos e, ;quanto aos resultados, confia em Deus;. Diferentemente, na ética de responsabilidade, ;sempre devemos responder pelas consequências previsíveis de nossos atos;. A ;política se faz usando a cabeça;, não pode estar desconectada da correlação de forças e das probabilidades.
Weber escreveu, às vésperas da derrocada da República de Weimar, que levou a Alemanha à hiperinflação e Hitler, ao poder. Isso não impediu que o baixo astral com a derrota na I Guerra Mundial e o colapso econômico fomentasse o surgimento de autores ;teoconservadores;, que influenciaram o nazifascismo e agora estão sendo relidos nos Estados Unidos e na Europa, por católicos conservadores, protestantes evangélicos e judeus ortodoxos. Com base em valores religiosos anti-iluministas, querem mudar o curso da história com os olhos virados para trás, em busca do ;Éden; perdido pela democracia liberal, com a globalização e o multilateralismo.
;No Brasil, onde não existe regulamentação do lobby, todos os políticos defendem o ;bem comum;, ninguém assume a política como negócio, com exceção, talvez, da bancada ruralista;