Politica

Nas entrelinhas

postado em 24/06/2019 04:16


A estratégia do lulismo

Bolsonaro repete, mesmo sem querer, o plano de Lula de se voltar para a base nos momentos mais delicados do governo. Mas também pode estar perigosamente se espelhando em Dilma ao buscar assessores que só dizem ;sim;


O presidente Jair Bolsonaro pode até não gostar da comparação, mas os últimos movimentos do capitão reformado lembram as ações de um ex-ocupante do Palácio do Planalto de nome Luiz Inácio Lula da Silva. Uso o verbo ;lembrar; para não escrever ;coincidir;, pois o atual chefe deste sofrido país pode alegar que tudo se trata de uma coincidência, e talvez tenha razão. Explico.

A estratégia de Lula nos momentos mais críticos do governo era correr para a plateia ; leia-se o eleitor-raiz, aquele que, independentemente dos tropeços, estaria com o então presidente. O alvo principal eram os eleitores do Nordeste, mas as viagens traziam um elemento que se refletia em Brasília e nas outras regiões: a inegável capacidade de Lula em mobilizar gente, fortalecendo o próprio petista e assustando os opositores mais aventureiros.

De certa forma ; e com algumas variações, por óbvio ;, Bolsonaro repete tal estratégia quando consegue mobilizar apoiadores nas manifestações de rua, participa de eventos religiosos e deixa o Planalto no sábado pela manhã para aparecer no supermercado no Sudoeste, região nobre de Brasília. Na prática, o que Bolsonaro revela é o mesmo instinto de sobrevivência política de Lula, deixando clara a força em relação a uma parte do eleitorado, que não tem dúvidas sobre o voto dado em 2018.

Fôlego

Tanto Lula quanto Bolsonaro sabem que esse perfil do eleitorado não garante uma eleição, pois representa apenas uma parte dos apoiadores. Mas é inquestionável que garante certo fôlego até que, no caso do capitão reformado, uma reforma da Previdência seja aprovada. Sim, porque há um prazo de validade nessa estratégica, considerando que, se o país não crescer ou gerar emprego, Bolsonaro pode aparecer todo santo dia na vendinha da esquina que os apoiadores abandonarão o barco e o político.

Assim, por mais que Bolsonaro possa parecer alguém desassisado ao demitir o general Carlos Alberto Santos Cruz, um dos militares mais preparados do país, ele segue firme no propósito de jogar para a plateia para garantir apoios nas redes e nas ruas. O general Santos Cruz ; considerado um estrategista acima da média e, a partir de bastidores, um dos palestrantes mais caros da Esplanada dos últimos 20 anos ; peitou o coronel. Tentou fazer com que Bolsonaro olhasse a longo prazo. Mas caiu rápido demais. No lugar entrou alguém, aparentemente, menos inconveniente.

Queda

O problema é que, mostrou reportagem do Correio da última sexta-feira, a queda de Santos Cruz atingiu o ânimo de parte dos oficiais, segundo relatos. O general era um dos únicos que falava a ;real; para Bolsonaro. Fez isso, por exemplo, no episódio envolvendo o ex-comandante do Exército Eduardo Villas Bôas, criticado por Olavo de Carvalho, o guru dos amalucados. Santos Cruz cobrou do presidente uma resposta mais enfática do capitão reformado. Não a teve, ao contrário. Tal atitude se explica pelo fato de que Olavo e parte dos parlamentares do PSL ; incluindo os filhos de Bolsonaro ; fazerem a ponte com os eleitores mais radicais, justamente o que o presidente expõe neste momento.

O receio de governistas mais atentos é de que Bolsonaro não apenas refaça a estratégia de Lula ao buscar o eleitor-raiz, mas também acabe se cercando de assessores que só dizem ;sim;. Se isso ocorrer, ele acabará próximo da ex-presidente Dilma Rousseff, que, entre outros integrantes da equipe, dava muita bola para Ideli Salvatti, Erenice Guerra e Gleisi Hoffmann. Não custa lembrar o que deu.

Fla-Flu

Na semana passada, pedi aos leitores para sugerirem uma imagem melhor do que o desgastado Fla-Flu nos comentários sobre a divisão política no Brasil. Entre um e outro xingamento, alguns foram muito generosos e indicaram o ;nós versus eles;, por exemplo. Mas restou, por comentários da maioria, a simbologia do Fla-Flu, por mais que incomode torcedores do Flamengo e do Fluminense.




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