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Nas entrelinhas

O acordo do Mercosul com a União Europeia foi a melhor notícia nos últimos tempos para o Palácio do Planalto, menos por efeitos práticos imediatos e mais pela imagem internacional. O Planalto poderia e deveria aproveitar, mas com os olavetes isso nunca é muito fácil

postado em 01/07/2019 04:12
O acordo do Mercosul com a União Europeia foi a melhor notícia nos últimos tempos para o Palácio do Planalto, menos por efeitos práticos imediatos e mais pela imagem internacional. O Planalto poderia e deveria aproveitar, mas com os olavetes isso nunca é muito fácil

A simbologia de uma vitória

Depois de cinco dias fora do Brasil, o presidente Jair Bolsonaro retorna às atividades com um alívio em relação à política externa. O acordo do Mercosul com a União Europeia foi a melhor notícia nos últimos tempos para o Palácio do Planalto, menos por efeitos práticos imediatos;a implementação deve se alongar por pelo menos todo o mandato do capitão reformado;e mais pela simbologia.

Um acordo do tamanho do que foi apresentado em Bruxelas não é obra apenas do governo Bolsonaro, afinal é impossível fechar tal negociação em menos de seis meses. Envolve uma série de expectativas, o que sempre joga contra o consenso. Para além dos políticos, há corpos técnicos em cada um dos países. São homens e mulheres treinados para a negociação, a partir de simulações e jogos reais.

Mas, ao mesmo tempo, não precisa levar 20 anos como se levou para fechar um tratado. Um dos observadores mais atentos nas negociações, que acompanhava a cúpula do G20 em Osaka, no Japão, parecia nitidamente emocionado com a finalização. Nesse tempo, ele teve uma filha e hoje a moça já é adulta. Assim, é impossível creditar o acordo a um só grupo presidencial, afinal seria uma injustiça com os servidores preparados de cada um dos países.

Ao mesmo tempo, não dá para desconsiderar a participação do governo Bolsonaro. Por mais que o presidente nunca tenha pensado sobre um acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul, a disposição da equipe em buscar o entendimento foi fundamental, como disse Cecilia Malmstr;m, comissária europeia para o Comércio. Ela elogiou o compromisso de Bolsonaro com o acordo.

E aqui corrija-se uma injustiça: o ministro da Economia, Paulo Guedes, foi acusado de não ter percebido a força do Mercosul por ter dado uma resposta atravessada a uma repórter. Respostas atravessadas a jornalistas nunca funcionaram, mas a participação dele no acordo mostra que havia um erro de avaliação da imprensa. Guedes, Tereza Cristina, Ernesto Araújo e Onyx Lorenzoni foram citados nominalmente por Bolsonaro.

A tentativa de capitalizar tal conquista é mais do que natural, mas Bolsonaro precisa conseguir fazer a equipe jogar junto pelo Brasil, sem atropelos e sem deixar que a ideologia suplante a parte técnica da política, a que deveria ser tocada pelos ministros. Depois de acordo como o do Mercosul com a União Europeia, tais picuinhas dos olavetes ficam menores. Pegue-se, por exemplo, o discurso do argentino Mauricio Macri em Osaka, na frente de Bolsonaro. Em vez de fustigar a oposição daquele país, ele falou sobre chances de diminuir a pobreza e buscar soluções para o fluxo migratório a partir do acordo. Foi melhor.

Índices
Na vida cotidiana, os índices de avaliação do governo Bolsonaro vão mal, mas há um detalhe a ser considerado. Duas das áreas com apoio da população são um desafio para cientistas políticos e para os assessores do Planalto.

Segundo as pesquisas que Bolsonaro diz desprezar, mas deveria estar atento, nas questões de segurança e meio ambiente, ele vai bem;ou pelo menos consegue apoios positivos.

São índices que ultrapassam bem a média dos demais. E assim tendem a exasperar gente dita de esquerda. Como a política de meio ambiente e de segurança, que Bolsonaro não apresentou na campanha e na prática é rasteira, pode ser melhor avaliada do que outras?

Para o professor da Universidade de Brasília (UnB) Arthur Trindade, a resposta pode estar na clareza do discurso de Bolsonaro sobre esses dois temas para a ala conservadora. Com convicção - mesmo a partir de políticas questionáveis -, ele se mostra mais próximo do eleitorado. O mesmo não ocorre, por exemplo, com a reforma da Previdência.









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