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Pressão internacional por solução para queimadas se intensifica

Presidente francês coloca questão das queimadas em discussão no G7, encontro das sete maiores economias. Alemanha e Reino Unido, integrantes do clube, além da Espanha, moderam o discurso sobre possíveis retaliações comerciais

Jorge Vasconcellos
postado em 25/08/2019 06:00
Presidente francês coloca questão das queimadas em discussão no G7, encontro das sete maiores economias. Alemanha e Reino Unido, integrantes do clube, além da Espanha, moderam o discurso sobre possíveis retaliações comerciais
A pressão internacional por uma solução para as queimadas na Amazônia deve se intensificar, como indicou neste sábado (24/8) a abertura do encontro de cúpula do G7, que reúne as maiores economias do mundo, em Biarritz, na França. Anfitrião do encontro, o presidente Emmanuel Macron disse que uma de suas prioridades no evento é mobilizar ;todas as potências; para combater o desmatamento e investir em reflorestamento. Em meio à crise diplomática instalada, o presidente Jair Bolsonaro disse que conversou com o chanceler Ernesto Araújo sobre a possibilidade de chamar para consultas o embaixador do Brasil na França, em um gesto diplomático que indica insatisfação com o governo do país europeu.

A situação das queimadas na Amazônia foi incluída na pauta do G7 por sugestão de Macron, que foi seguido por outros líderes mundiais, como a chanceler alemã, Angela Merkel; o premiê Boris Johnson, do Reino Unido; e Justin Trudeau, do Canadá. A discussão pode ser motivo de divergências, já que o presidente americano, Donald Trump, estaria disposto a defender o Brasil. Ele ofereceu ajuda no combate às queimadas na Amazônia. O encontro acaba amanhã.

;A Amazônia é nosso bem comum. Estamos todos envolvidos, e a França está provavelmente mais do que outros que estarão nessa mesa [do G7], porque nós somos amazonenses. A Guiana Francesa está na Amazônia;, afirmou Macron, em cadeia nacional, no pronunciamento de abertura da cúpula.

;Vamos lançar uma mobilização de todas as potências que estão aqui, em parceria com os países da Amazônia, para investir na luta contra os incêndios que estão em curso e ajudar o Brasil e todos os outros países que são atingidos. Depois, investir no reflorestamento e permitir aos povos autóctones, às ONGs, aos habitantes desenvolverem atividades preservando a floresta, que nós precisamos;, acrescentou o francês. Segundo ele, a Amazônia ;é um tesouro de biodiversidade e um tesouro para o clima, graças ao oxigênio que ela emite e ao carbono que ela captura;.

O discurso de que a Amazônia é um bem internacional é fortemente rejeitado por Bolsonaro e por outras autoridades brasileiras, como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o general Villas-Boas, assessor especial do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). ;Dói na alma ver brasileiros não enxergando a campanha fabricada contra a nossa soberania na região;, tuitou o militar.

Ontem, o presidente Bolsonaro voltou a demonstrar irritação por ter sido acusado por Macron de ter mentido sobre seus compromissos ambientais durante a cúpula do G20, em Osaka, no Japão. Com essa visão, o líder francês anunciou que se opõe à ratificação do acordo de livre-comércio entre o Mercosul e a União Europeia (UE).

As relações diplomáticas com a França estão arranhadas, como mostra a disposição de Bolsonaro de convocar o embaixador brasileiro em Paris para consultas. ;Conversei com o Ernesto [Araújo, chanceler), estamos avaliando;, disse o presidente, admitindo essa possibilidade aos jornalistas, quando deixava o Palácio da Alvorada ontem, em Brasília, para um almoço no Palácio do Jaburu, residência oficial do vice-presidente, Hamilton Mourão.

Sobre se falaria com Macron, ele afastou essa possibilidade: ;Depois do que ele [Macron] falou a meu respeito, você acha que vou falar com ele? Eu estou sendo muito educado, porque ele me chamou de mentiroso;.

O presidente disse que a média de queimadas na Amazônia é inferior à dos últimos anos e está indo para a normalidade . ;A floresta não está pegando fogo como o pessoal está dizendo. O fogo é onde o pessoal desmata;, disse. Ele acrescentou que já foi iniciado o trabalho de combate aos focos de incêndio e reclamou da falta de recursos orçamentários. ;É difícil ter recurso, tudo contingenciado. É o Brasil que eu peguei. Estamos em busca de fazer o melhor pelo meu país;, afirmou. Questionado se o governo não demorou a agir, citou as dimensões continentais da região. ;A Amazônia é uma área maior que a Europa. Se eu tivesse 10 milhões de pessoas, não conseguiria fazer a prevenção;, disse. A Agência Espacial Americana (Nasa) afirma que esta é a pior temporada de queimadas desde 2010. Segundo dados do Inpe, de janeiro a agosto, os satélites registraram o maior número de queimadas desde 2013.
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No dia do início da reunião de cúpula do G7, em Biarritz, na França, jornais franceses e o italiano La Reppublica destacaram os incêndios em suas capas. Encontro termina amanhã.

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Recado da União Europeia

O presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, defendeu, neste sábado (24/8), a ratificação do acordo entre a União Europeia (UE) e o Mercosul, mas ressalvou que, em razão das queimadas na Amazônia, e da postura do presidente Jair Bolsonaro, a conclusão do acordo pode não ocorrer de forma harmoniosa. Ele falou sobre o assunto durante entrevista coletiva antes do início da cúpula do G7, em Biarritz, na França.

;Apoiamos o acordo UE-Mercosul, que também implica a proteção do clima, mas é difícil imaginar uma ratificação harmoniosa pelos países europeus enquanto o presidente brasileiro permite a destruição dos espaços verdes do planeta;, afirmou Tusk.

Reino Unido, Alemanha e Espanha, no entanto, têm adotado um discurso mais cauteloso. ;Há todo tipo de pessoa que usará qualquer desculpa para interferir no comércio e frustrar os acordos comerciais, e eu não quero isso;, disse, por exemplo, o premiê britânico, Boris Johnson, na reunião do G7. Em nota, o governo espanhol afirma será por meios das cláusulas ambientais do acordo comercial que se poderá avançar no tema.

Celebrado em junho, após 20 anos de negociação, o acordo ainda terá um longo caminho a percorrer para entrar em vigor. Ele precisa ser ratificado no parlamento europeu e pode precisar de aprovação dos parlamentos dos países do bloco, a depender de decisão da Comissão Europeia. Também no Mercosul, o arranjo comercial precisa da aprovação dos congressos nacionais. Na prática, significa que o acordo terá que ser aprovado pelos parlamentos dos 31 países envolvidos, uma tramitação que deve levar anos e enfrentar resistências, como já demonstraram França, Irlanda e Islândia.

O tratado de livre-comércio pretende eliminar tarifas de importação para mais de 90% dos produtos comercializados entre os dois blocos. O processo de redução de tarifas vai variar de acordo com cada produto e deve levar até 15 anos, a partir da entrada em vigor da parceria intercontinental.

Estimativas do Ministério da Economia indicam que o tratado poderá representar um aumento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, de US$ 87,5 bilhões em 15 anos. Se considerados fatores como a eliminação das barreiras não tarifárias e o incremento esperado na produtividade, o reforço no PIB poderá subir para US$ 125 bilhões.

Na reunião do G7, a ;emergência climática; foi inserida no tópico ;combate às desigualdades;, um dos três temas principais da cúpula, além da guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, a desaceleração da economia global e segurança.

Para o professor Juliano da Silva Cortinhas, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (Irel/UnB), o Brasil segue cada vez mais na contramão da tendência mundial em relação à preservação do meio ambiente. ;Os possíveis efeitos para as exportações brasileiras têm relação com o padrão do comércio internacional nos últimos anos, que não é mais regulado apenas pelo lucro. De acordo com o especialista, tanto os países como os consumidores querem produtos com ;origem limpa, que respeitem os princípios do desenvolvimento sustentável, originários de países com uma boa imagem internacional e com padrão de respeito ao meio ambiente;.

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