Na análise do cientista político Thiago Vidal, apesar de o governo Bolsonaro, de forma geral, atuar de improviso na gestão de crises, ele consegue usar essas situações para abordar outras questões. Na opinião do especialista, é possível observar o jeito de fazer política do presidente no tratamento do incêndio na Amazônia. ;Ele perdeu o controle em um primeiro momento, começou a retomar no fim de semana e aproveitou isso como trampolim para falar de outras áreas, como aconteceu na reunião com os governadores;, afirma o gerente do Núcleo de Análise Política da Prospectiva.
No encontro com gestores estaduais da região amazônica, o governo federal defendeu temas como o desenvolvimento sustentável e a atividade econômica com a preservação ambiental. ;É uma forma de recuperar essas questões, que já tinham sido faladas na pré-campanha e em outros momentos. Dessa forma, os projetos acabam se criando com as crises neste governo;, avalia.
Para Ricardo Machado, doutor em ecologia pela UnB, o conceito usado pelo Executivo federal, endossado por alguns governadores, para falar de desenvolvimento sustentável é inadequado. ;O modelo sustentável é aquele que você explora os recursos naturais sem esgotá-los. Não se resume em apenas reservar algumas porções para manter a biodiversidade da floresta. Normalmente, as porções reservadas são pequenas e, dessa forma, as funções da floresta começam a ser perder;, argumenta.
A ideia, porém, é constante nos governos, de acordo com o professor: ;Todos os governos passados propuseram algo semelhante. Esse tipo de discurso não tem mudado. No entanto, ninguém teve coragem, de fato, de seguir com essa proposta;, afirma. A flexibilização da legislação da política ambiental, defendida por governadores na reunião, é vista com preocupação por Machado. ;As mudanças que temos visto são no sentido de piorar a conservação ambiental. Não sei por que agora seria diferente;, diz.
Vidal acredita que o episódio dos incêndios reforça como a diplomacia é tratada pelo governo. ;É um risco a longo prazo já que, pelo visto, poderemos ter episódios tão ou mais graves como esse, que tiram a credibilidade do Brasil e a vontade de países de fechar acordos conosco;, frisa. ;Com esse comportamento, você começa a se isolar internacionalmente e se torna um parceiro constrangedor para os países vizinhos e outros.;
Aberto a doações
O governo está aberto a receber recursos de países e organismos internacionais no combate às queimadas e ao desmatamento da Amazônia desde que o país tenha autonomia plena na gestão desses recursos, afirmou o porta-voz da Presidência, general Otávio Rêgo Barros. Ele reconheceu que o Executivo está preocupado com uma eventual ;desidratação; da imagem do país no exterior. ;Por isso, o presidente determinou ao Ministério das Relações Exteriores que avance a narrativa do governo, explicando à sociedade nacional e internacional que determinados posicionamentos não são corretos. Vamos avançar para combater narrativas equivocadas;, destacou.