Ainda em 2014, nos estertores do primeiro mandato do governo Dilma Rousseff, a Força Aérea Brasileira (FAB) anunciou a vencedora de uma concorrência de US$ 5,4 bilhões (cerca de R$ 17 bilhões) para a renovação da frota de aviões de combate para o Brasil. A novela, que se arrasta desde 2001, ainda no governo de Fernando Henrique Cardoso, deu um passo importante na semana passada. A cúpula militar brasileira esteve na cidade de Link;ping para acompanhar o início dos testes de voo da aeronave, construída numa parceria para desenvolvimento de tecnologia entre suecos e brasileiros. A via-crúcis aérea do Brasil em busca de um caça moderno, entretanto, enfrenta um dos mais desafiadores momentos, desde a disputa entre a Saab, a Boieng (EUA) e a Dassault (França): a falta de recursos para os repasses de dinheiro para os suecos, que garantem desde já a continuidade do programa
Treinamento
O engenheiro de produção Henrique Pinto, 33 anos, está há quatro meses em Link;ping, uma cidade simpática e que, em parte, se movimenta em razão da fabricação do Gripen. Contratado por uma empresa subsidiária à Saab no Brasil para a montagem das peças da fuselagem do caça, ele é um dos 350 brasileiros que, em algum momento, participarão do treinamento para a transferência de tecnologia, um dos principais pontos para a escolha dos suecos na disputa com norte-americanos e franceses. Selecionado para o treinamento, Henrique chegou à Suécia com a mulher. Em todos os passos, ele é acompanhado por um instrutor. Nos próximos cinco anos, assumirá a função do mentor na montagem, em São Bernardo do Campo (SP), de parte dos 36 modelos encomendados pelo Brasil.
Mudança de hábito
Responsável por trabalhar na montagem dos esqueletos das asas do Gripen, Luzieide Silva, 37 anos, está há cinco meses em Link;ping e vai continuar o treinamento por mais dois anos. Natural de Jacareí, um município do Vale do Paraíba, em São Paulo, ela trabalhou na Embraer e se especializa na montagem do quebra-cabeças nos galpões da Saab. Nas horas vagas, tanto Luzieide quanto Henrique, bem como todos os brasileiros que hoje trabalham em uma das etapas da construção do avião, se encontram com suecos selecionados antecipadamente pela Saab para servirem de buddy, espécie de amigo com perfis parecidos, como idade, estado civil e hobby. A presença dos brasileiros tem mudado aos poucos alguns costumes na cidade, como o corte das carnes: alguns estabelecimentos começaram a vender picanha.
Eventuais cortes dos repasses do governo à Saab não preocupam a empresa sueca. ;Entendemos, mas não estamos preocupados;, disse, na última quarta-feira, o chefe do setor aeronáutico da empresa sueca. A partir dos cortes, é natural uma renegociação do contrato, incluindo aí a própria reavaliação dos prazos de entrega. O atual cronograma prevê que, no próximo ano, se inicie a produção de 15 aeronaves no Brasil; no ano seguinte, a entrega do primeiro lote da série da Força Aérea Brasileira (FAB).
*O jornalista viajou a convite da Saab