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'O apoio ao governo está diminuindo', aponta Janaina Paschoal

Deputada estadual critica interferência dos filhos do presidente no governo e vê exagero na agenda de costumes. Para ela, Bolsonaro não deveria se afastar da plataforma de combate à corrupção. E ressalta que o apoio a ele está diminuindo

Rosana Hessel
postado em 07/10/2019 06:00

uma mulher olhando para baixoSão Paulo ; Uma das autoras do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, a jurista e agora deputada estadual paulista Janaina Paschoal (PSL) vem sendo tachada de comunista por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro. Ela afirma que votaria nele de novo, mas avisa que não concorda com tudo o que ele faz. Ela ressalta ainda, que a base de apoio de Bolsonaro está diminuindo.

Para a parlamentar, que foi cotada para ser vice de Bolsonaro, o presidente tem exagerado na agenda de costumes e precisa de alguém que bote um freio nele, pois não pode abandonar as outras agendas, principalmente, a do combate à corrupção. Janaina considera excessiva a interferência dos filhos do presidente no governo.

Na avaliação da deputada paulista, o grande erro do capitão reformado desde que assumiu tem sido insistir na candidatura do filho 03, o deputado Eduardo Bolsonaro, para ser embaixador do Brasil nos Estados Unidos. A indicação não pode ocorrer do ponto de vista jurídico, segundo ela. ;Eu entendo que fere a lei da probidade administrativa. É o princípio da probidade a impessoalidade. E é flagrante que ele está indicando o filho por ser filho;, explica a autora de outro pedido de impeachment: agora contra o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli.


Doutora em Direito Penal, Janaina engrossa o coro dos que lamentam a recente decisão da Corte Suprema que pode invalidar várias decisões da Lava-Jato. Para ela, a operação que virou referência no combate à corrupção no país corre o risco de ruir. A seguir os principais trechos da entrevista concedida pela deputada.

Como a senhora avalia o governo Bolsonaro?

Eu achei bom o discurso do presidente na ONU. Não vi nada de tão absurdo como disseram. Mas, do ponto de vista diplomático, não foi um discurso conciliador para aquela plateia, que é muito qualificada. Parecia que ele estava no palanque. Foi um discurso coerente com o que ele pensa. Ele resgatou muitas verdades. Não dá para acreditar que essa coisa toda em torno da Amazônia seja bondade desse pessoal. Acho importante deixar claro, sim, que a Amazônia é nossa, muito embora possa existir um exagero do bolsonarismo, entre os quais eu não me incluo, de que as ONGs não são as mocinhas que se fazem crer. Não dá para ter essa santidade em torno das ONGs. Tem muito interesse internacional na Amazônia. Eu gostei mesmo do discurso dele, mas tenho algumas divergências, que deixei claras em vários momentos, como a indicação do Eduardo Bolsonaro (para a embaixada do Brasil nos EUA). Acho errado, porque abre um flanco para uma crítica que é absolutamente desnecessária.

Legalmente, ele pode fazer isso?

Eu entendo que fere a lei da probidade administrativa. É o princípio da probidade a impessoalidade. E é flagrante que ele está indicando o filho por ser filho. O Bolsonaro pode até dizer que está indicando porque ele confia no filho. Mas confia porque é filho. Vamos imaginar que você tenha um filho especialista em Antártida e aí vai ter um ministério da Antártida. Alguma coisa assim, tem lógica. No caso do Eduardo, não vejo lógica. Acho que o presidente está abrindo um precedente ruim. Está se colocando refém do Senado sem necessidade. Tenho as minhas divergências. Mas não acho que Bolsonaro está indo mal no governo. A indicação do Eduardo é o grande erro do governo. Não tem justificativa. Realmente, acho que é um erro muito significativo. Espero que ele revise essa decisão.

Onde mais o presidente está errando?

O tom dele é exagerado. Precisaria de alguém ali do lado, de gente um pouco mais corajosa para segurar mais as rédeas. Na campanha, eu conversava mais com ele e disse, algumas vezes, que ele não podia falar uma coisa , e explicava o porquê. Ele ouvia. O excesso de preocupação ou de condução com os filhos, por exemplo, poderia ser reduzido. Eu acho que tem (interferência dos filhos), mas não acho que chega a atrapalhar a governabilidade. Atrapalha a impessoalidade do cargo. Ele é o presidente, e não os filhos. Ele tem que deixar isso muito claro. Às vezes, a culpa é das pessoas que interpretam qualquer frase de um filho como sendo do presidente.

E quais foram os acertos?

Ele acertou nomeando o (Sérgio) Moro (ministro da Justiça) e o (Paulo) Guedes (Ministro da Economia). Acertou na condução da reforma da Previdência. Ele acerta com todo o trabalho do Tarcísio de Freitas (Infraestrutura).

Por conta de seus comentários críticos ao governo, a senhora está sendo chamada até de comunista nas redes sociais...

Sim! Eu não sou radical. Nunca fui. Nem na época do PT, quando me chamavam de fascista, e nem agora, quando me chamam de comunista. Hoje, os bolsonaristas estão fazendo exatamente o que os petistas fizeram.

O petismo e o bolsonarismo são parecidos?

O petismo é pior. Eles são mais numerosos e têm mais força dentro das instituições. Eu acho que o perigo do petismo é maior, porque está mais enraizado. Mas o bolsonarismo também não é uma coisa legal. Mas, hoje, a base de apoio de Bolsonaro está encolhendo e só estão ficando os bolsonaristas mesmo. Alguém tem que mostrar para o presidente que esse minigrupo não vai dar sustentação para ele.

É crescente o número de arrependidos em apoiar Bolsonaro.
A senhora está arrependida? Votaria nele de novo?

Eu votaria nele de novo. Não me arrependo. Eu não tinha alternativa. Agora, o fato de eu não me arrepender não significa que tenha que concordar com tudo. O problema é essa mentalidade que se estabeleceu, que a gente tem que dizer amém.

A senhora acha que a confiança da população em Bolsonaro vai durar até quando?

Não sei. Depende muito mais dele e do desenrolar dos fatos. Lógico que Bolsonaro erra se continuar com esse viés ideológico e de costumes. Parece que ele acredita que foi eleito, exclusivamente, por essa pauta mais conservadora. Na verdade, ele foi eleito por várias pautas: a liberal econômica, o combate à corrupção, a segurança. Se eu fosse colocar um peso, diria que a do combate à corrupção foi a que mais pesou. Acho bom ele ter isso claro. Mas o presidente está muito apegado a essa questão dos costumes, acreditando que o que o elegeu foi isso. Acredito que, se ele se afastar muito do combate à corrupção, corre risco.

O que a senhora pensa sobre a decisão do Supremo sobre o direito de réus delatados apresentarem suas alegações finais?

A decisão é muito questionável. Aplicar retroativamente é um verdadeiro absurdo jurídico. Não é só a Lava-Jato que está em risco. Vários outros casos, de todos os tipos de crime, se o STF seguir com isso, serão anulados. Será uma vergonha internacional. Quero expressar meu descontentamento com as anulações que vêm sendo decididas pelo STF e externar a preocupação com a hipótese de o novo entendimento ser aplicado retroativamente.

Os vazamentos das conversas do ministro Moro reveladas pelo The Intercept também podem anular a operação?

Não tem nada que justifique uma anulação. Até achei bom, porque mostraram (os ex-presidentes) Lula e Michel Temer conversando no meio do processo de impeachment para salvar o mandato da Dilma. Isso é prova do que eu falei desde sempre, que o Temer não tem nada a ver com isso. Agora, o papel do ministro Moro foi impecável. Não tem nada ali que mostre nenhum tipo de fraude de provas ou confecção de provas. Nada.

Mesmo aquelas conversas orientadas?

Pode haver uma conversa no gabinete, eventualmente. A diferença é que foi por WhatsApp. O que eu insisti e falei, publicamente, é que todas as autoridades precisam ter essas palestras regulamentadas. Todo mundo criticou as palestras do Dallagnol, mas a verdade é que vários ministros dos tribunais superiores dão palestras também, e pagas a peso de ouro. E isso gera conflito de interesses e pode, de alguma maneira, encobrir recebimento de dinheiro indevido. Sou favorável a uma regulamentação severa sobre a participação de autoridades em eventos, palestras. Não pode ter patrocínios.

A senhora foi uma das autoras do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Faria o mesmo de novo hoje?

Naquelas mesmas circunstâncias, faria, sem dúvida. Os crimes foram muito graves. A denúncia está muito bem fundamentada. Descrevi todo o petrolão e coisas que vieram na Lava-Jato depois. Mostrei que ela cometeu as fraudes para encobrir os peculatos do petrolão, os empréstimos para as ditaduras amigas, o desfalque no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Não teve crime mais grave.

Mas ela não foi condenada por esses delitos...

Porque o (Eduardo) Cunha (ex-presidente da Câmara), de medo, quis ajudar. Mas não importa. Ela estava ciente de tudo o que estava ali. Por tudo o que ela fez, era para estar presa. Desculpa. Não tenho a menor dúvida disso. Faria tudo de novo. Tenho pena porque ela é uma senhora. Mas é chato, é uma situação difícil. Mas ela é culpada de coisas muito graves. O país está deste jeito por culpa dela e de todos (do PT). Eu não separo a Dilma de Lula. Eles agiram juntos o tempo inteiro.

O ex-presidente Michel Temer admitiu, várias vezes, que foi golpe?

O problema é que vocês insistem na tese de que o Temer tem qualquer coisa a ver com o impeachment. Ele assumiu o governo porque era o vice escolhido pelo PT. Para ele, foi ruim, porque ele foi para o front e as coisas erradas que ele fez vieram à luz. Como vice, ele continuava na clandestinidade. Ninguém estava preocupado com ele. E, no meio da confusão dos crimes do PT, do PSDB, vieram à tona os crimes do Temer e do MDB. Para ele, foi um golpe na vida dele (risos). O impeachment foi a abertura da caixa de Pandora que eles estão tentando fechar a todo custo.

A senhora pediu o impeachment do ministro Dias Toffoli, que suspendeu os processos com dados do Coaf, justamente depois que a denúncia contra o senador Flávio Bolsonaro foi parar no Supremo...

Foi um pedido da defesa do Flávio que gerou a decisão, mas tem que lembrar que o Toffoli estava sendo investigado com a mulher. Então, quem acha que ele fez isso para beneficiar o filho do presidente, não tem nada a ver. É pessoal. Ele aproveitou o pedido.

A senhora não é bolsonarista?

Nunca fui.

Olavista?

Também nunca fui. Ele tem uma obra excelente. As pessoas o leem em rede social. Ele fala palavrão; é horrível. Mas as obras dele são boas. Eu li a obra dele, mas nunca fui olavista. Eu não gosto dessa coisa de colocar adjetivo nas pessoas: bolsonarista, olavista, petista;

Até o ministro Marcos Pontes já comentou que a Terra é redonda, porque ele viu do espaço. A senhora não acha estranho ter gente que acredita que a Terra é plana?

Eu respeito muito a pluralidade. As pessoas têm convicções diferentes. Eu convivo bem com pessoas que pensam de maneira completamente diferente. Não concordo. Mas não me incomoda. (risos) Tem gente que, com tanta informação disponível, também acredita que a Venezuela é uma democracia. Cada um pensa de um jeito.

Como vê a articulação do governo com o Congresso?

O atraso da Previdência foi porque o Davi Alcolumbre usou a reforma como moeda de troca para tentar forçar o grupo Muda Senado, Muda Brasil a abrir mão da abertura da CPI da Lava Toga. Isso não se deve à falta de articulação. Deve-se a uma decisão do chefe da Câmara (Rodrigo Maia) e do chefe do Senado (Alcolumbre) de impedir as investigações. Eles estão incomodados, primeiro, com os pedidos de impeachment e, paralelamente, com os pedidos de CPI.

Mas foi o ministro Onyx Lorenzoni quem fez toda a articulação para que Alcolumbre fosse presidente do Senado;

Não tenho nada a ver com isso. Eu fui contra a escolha do Alcolumbre e do Maia. Pode olhar as minhas declarações. Eu não tenho nada a ver com isso. Eu estou no PSL porque a lei obriga a estar em algum partido. Eu não queria entrar no PT, porque estava envolvido em escândalo. Eu não podia entrar no MDB, porque estava envolvido em escândalo. O PSDB idem. O partido Novo não dá certo comigo. O dono é muito mandão. Depois de tudo o que eu falo contra o PSL, nunca ninguém me deu um telefonema dizendo que eu não posso falar isso ou aquilo. O (João) Amoedo dá ordem em tudo. Deus me livre! Não vou para o Novo nem a pau.

Por que a senhora não quis ser vice-presidente na chapa com o Bolsonaro?

Ah; você já imaginou? Não ia dar certo. Duas personalidades muito fortes. Estou melhor aqui.

Com a saída de vários integrantes do PSL, como fica a sua situação?

O partido não existe. Primeiro, a minha mente não funciona com partido. Sou contra partido. Acho que as pessoas deveriam ter o direito de se candidatar independentemente de legendas, de maneira avulsa. Mas a nossa legislação é muito arcaica.

A senhora tem planos para concorrer a algum cargo Executivo?

Não vou concorrer à prefeitura. Já está uma briga lascada com essa história de prefeitura, que eu não vou me meter nessa (risos). É muita confusão para um ser humano só.

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