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Randolfe Rodrigues: 'Falas de Bolsonaro sobre Fernández são as mais graves'

Entrevistado do programa CB Poder desta terça-feira (29/10), o senador da Rede e líder da oposição ao governo fez uma série de críticas aos primeiros meses do governo Bolsonaro, sobretudo às recentes declarações sobre o recém-eleito presidente argentino

Thaís Moura*
postado em 29/10/2019 17:33
[FOTO1]Desde que embarcou para viagem pelo Oriente Médio e pelo leste da Ásia, o presidente Jair Bolsonaro vem colecionando declarações polêmicas. Além da divulgação em suas redes sociais de um vídeo em que associa si mesmo a um leão e o Supremo Tribunal Federal (STF) a hienas, o presidente também foi alvo de ataques ao afirmar que não cumprimentará Alberto Fernández, recém-eleito presidente da Argentina. Para o líder da oposição ao governo no Senado Federal, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), as falas de Jair Bolsonaro sobre o presidente eleito argentino são as mais graves, por "ofenderem a soberania de uma nação irmã e o próprio Brasil".

Em entrevista nesta terça-feira (29/10) ao CB Poder, programa do Correio em parceria com a TV Brasília, o senador, que faz parte da Comissão de Relações Exteriores do Senado, fez críticas aos primeiros 10 meses de governo, sobretudo no que diz respeito a política ambiental, às reformas econômicas e ao "clã Bolsonaro", composto pelo presidente e seus filhos, Carlos, Eduardo e Flávio.

Em relação à recente viagem presidencial, Rodrigues afirmou que, a princípio, viu a iniciativa com "esperanças". No entanto, acabou se decepcionando. "Pela primeira vez, o presidente mudava o eixo unilateral de somente se relacionar com os Estados Unidos e com Israel, para abrir as relações do nosso país com a China, com Japão", declarou o senador. "A relação da diplomacia com o Brasil sempre foi com o multilateralismo. A nossa fronteira se consolidou devido à atuação diplomática que o Brasil teve no exterior. Essa atuação deu certo até agora. Mas, pela primeira vez na nossa história, nós temos chefe de Estado e de governo que fere o que construímos ao longo de mais de 200 anos de Brasil independente", acrescentou.


Reflexos no Mercosul


Durante o período que esteve fora do país, o presidente Jair Bolsonaro se manifestou a respeito da recente eleição de Alberto Fernández para a presidência da Argentina. Fernández foi candidato em oposição ao governo de Mauricio Macri e, após sua vitória, demonstrou apoio ao ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, preso há mais de um ano na Superintendência da Polícia Federal do Paraná. Antes do resultado das eleições argentinas, Bolsonaro já havia afirmado que uma possível vitória de Fernández e Cristina Kirchner poderia colocar em risco "todo o Mercosul".

Para o senador Rodrigues, as falas do presidente brasileiro têm "dupla gravidade." "A declaração em relação a Argentina ofende a soberania de uma nação irmã, de uma vizinha, e ofende o próprio Brasil, pois pode vir a comprometer nossas relações internacionais. O presidente declarou que vai avaliar mais adiante, e que se for o caso, retira a Argentina do Mercosul. Como assim ;retira;?", questionou.

"Ele (Jair Bolsonaro) desconhece a Constituição, especificamente o artigo 49, inciso primeiro. Não cabe a ele dizer se um país membro pode continuar a ser membro de um bloco econômico com o Brasil ou não, cabe a esse inciso. Um acordo multilateral também só pode ser encerrado se o conjunto dos Estados-membros fizerem esse acordo", ressaltou o líder da oposição no Senado.

A respeito do vídeo divulgado (e posteriormente deletado) na conta oficial do presidente no Twitter na última segunda (28/10), em que Bolsonaro é comparado a um leão, e seus adversários ; como a imprensa, a OAB, e o STF ; a hienas, o senador alegou que a ação "não é papel de um presidente", e que se trata de uma estratégia para "dispersar" a atenção do público e da mídia de casos como o que envolve Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ).

Como justificativa, Rodrigues explicou: "No domingo, foi veiculado nos meios de comunicação que o senhor Queiroz não estava desaparecido, era uma iminência que continua atuando junto ao Presidente e junto a família presidencial. Isso foi veiculado por dados revelados pela imprensa, em áudios amplamente divulgados. Já na segunda aparece esse vídeo atacando as oposições e atacando as instituições."

Na entrevista desta terça-feira, o senador também não poupou críticas em relação aos filhos do presidente, conhecidos pela oposição como o "clã Bolsonaro". "Tem um interesse desse clã, ele é o núcleo de decisão política. E é lamentável que alguns setores, inclusive nobres e honrados do país, ainda se sintam no dever de render obediência a um clã, a um interesse privado que está na condução e nos interesses da presidência da república", alegou.

Ele direcionou as críticas especificamente a Carlos Bolsonaro, atual vereador da cidade do Rio de Janeiro. Na semana passada, o vereador admitiu ter escrito uma das publicações na conta de seu pai. "O Twitter do presidente é lamentavelmente controlado e cuidado por alguém desequilibrado, não tem outro nome para aquele rapaz que é vereador e filho do presidente no RJ. E como age esse moço desequilibrado? Via de regra, ele utiliza-se do Twitter, em uma ação de estratégia, para tentar dissuadir por conta do envolvimento da família do presidente da república com corrupção", criticou Rodrigues.

Questionado sobre as medidas positivas do governo Bolsonaro, na visão da oposição, o senador afirmou que o único programa com "orientação" é na área econômica. No entanto, ele ainda teme que a situação econômica do país se iguale à do Chile a partir do atual quadro político e com a aprovação de reformas como as propostas pelo ministro da Economia.

"O senhor Paulo Guedes tem que tomar cuidado para não caminharmos no sentido do Chile. Eu tenho muita preocupação em relação a isso. A reforma da previdência já aprofundará desigualdades no país, já trará consequências nesse sentido. E quanto a tributária, se por um lado essa proposta simplifica a cobrança de tributos, ela aprofunda o sistema de progressividade. Não resolve o problema da regressividade", argumentou o senador. "E o que aconteceu no Chile para ter tanta gente na rua? Fizeram reformas, introduziram um sistema de capitalização, transformaram a saúde pública em saúde paga, e tornaram todas instituições públicas de ensino em instituições privadas. Me parece que a receita que ele (Guedes) quer implementar no Brasil é a mesma", completou.


Assista à íntegra da entrevista com o senador Randolfe Rodrigues





*Estagiária sob supervisão de Roberto Fonseca

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