O presidente Jair Bolsonaro disse ontem que pegou a gravação das ligações da portaria do Condomínio Vivendas da Barra, no Rio de Janeiro, onde tem uma casa, para que não fossem adulteradas. A gravação possui áudios com registros da comunicação entre a portaria do condomínio e suspeitos de matar a vereadora Marielle Franco (PSol-RJ) no dia do assassinato. adora ;Nós pegamos, antes que fosse adulterado, ou alguém tentasse adulterar. Pegamos lá toda a memória da secretária eletrônica. Tudo que é guardado há mais de ano. A voz não é a minha, não é o seu Jair;, disse. Ele afirmou, ainda, que desconfia que o porteiro do condomínio ;leu sem assinar; ou o induziram a ;assinar aquilo, entre aspas;.
Bolsonaro se referia ao depoimento do porteiro que consta do processo que investiga a morte da vereadora e do motorista Anderson Gomes. Segundo reportagem do Jornal Nacional, exibida na terça-feira da semana passada, um porteiro do condomínio contou à polícia que, horas antes do crime, o ex-policial militar Élcio de Queiroz, suspeito de matar Marielle, esteve no local e disse que iria à casa 58 (que pertence a Bolsonaro), e que o ;seu Jair; atendeu ao interfone e autorizou a entrada.
Witzel
O presidente voltou a acusar o governador do Rio de Janeiro. ;Agora, quem está por trás disso? O governador Wilson Witzel, que só se elegeu graças ao meu filho, (senador) Flávio Bolsonaro, que colou nele o tempo todo. Um mês depois, virou inimigo nosso. Começou a usar a máquina do estado para perseguir o Flávio, o Carlos, agora, e o Hélio Negão;, afirmou. O governador, assim, teria, no entendimento de Bolsonaro, agido movido por uma ;obsessão; em ser presidente da República. ;É um obstáculo que tem que ser vencido;.
Para o presidente, Witzel teria se aproveitado do cargo para ter acesso a documentos sigilosos em um processo que corre em segredo de Justiça. ;(Witzel) Não podia ter acesso a um processo em segredo de Justiça. Mais do que isso, né? A minha convicção é de que ele agiu no processo para botar meu nome lá dentro;, declarou.
Não é a primeira vez que Bolsonaro acusa o chefe do Executivo estadual fluminense de vazar as informações do processo para atingi-lo e, ao mesmo tempo, se credenciar para uma disputa à Presidência da República, em 2022. Ontem, também denunciou o delegado da Polícia Civil responsável pelo caso Marielle de ser ;amiguinho; do governador. Lembrou, ainda, que o ministro da Justiça, Sérgio Moro, foi acionado e explicou ter sido o auxiliar a entrar em contato com o procurador-geral da República, Augusto Aras, para tratar do caso, não ele. ;Eu não trato isso com o Aras. Não tem cabimento, o tratamento com Aras foi via ministro da Justiça;, afirmou.
O governador do Rio, por sua vez, não respondeu, ontem, às declarações de Bolsonaro. Na sexta-feira, contudo, refutou a tese do presidente de que esteja por trás da citação do nome do presidente nas investigações e parabenizou a Advocacia-geral da União (AGU) por ter aberto um procedimento para investigar o vazamento da informação ao Jornal Nacional sobre o depoimento do porteiro à Polícia Civil. ;Seja ele de farda, de distintivo, político, filho de poderoso. Não tenho compromisso com a bandidagem. Assumi o estado sem qualquer compromisso com traficante, com miliciano. Todos aqueles que se colocarem na reta da Justiça serão presos, serão investigados;, afirmou.
Agenda econômica
O presidente comemorou a queda na taxa básica dos juros, que está em 5% ao ano, a mais baixa da história e previu que a Selic pode chegar a 4,5% ao ano até o fim do ano. ;No nosso governo. Pela segunda vez, a mais baixa taxa de juros da história do Brasil;, comemorou. O presidente alfinetou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. ;O Fernando Henrique foi simplista combatendo a inflação, aumentando a taxa de juros;, afirmou.
Bolsonaro também comemorou a queda da taxa de desemprego, de 11,8% no trimestre terminado em agosto, abaixo dos 12,3% registrados no trimestre anterior e comentou a inflação abaixo da do centro da meta, de 4,25%.
O presidente disse que, talvez, vá ao Congresso na terça-feira, para apresentar o pacote econômico, que inclui, também, medidas de distribuição de recursos entre a União, os estados e os municípios, e propostas de estímulo ao emprego por meio de desonerações a empregadores que contratarem trabalhadores em busca do primeiro emprego entre 18 e 29 anos, e na faixa de 55 anos ou mais. Sobre a reforma tributária, ele disse que ;é muito importante;, mas não se comprometeu a dizer qual vai enviar primeiro ao Congresso.
Oposição vê obstrução de Justiça
A oposição reagiu à decisão de Bolsonaro em se apropriar da gravação das ligações da portaria no condomínio. Os líderes da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), e no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), entendem que o presidente obstrui a Justiça com a medida tomada. O PSol, partido do qual era filiada Marielle, vai protocolar notícia-crime contra o capitão reformado no Supremo Tribunal Federal (STF) por obstrução de justiça e prevaricação. O entendimento de Molon e demais deputados da oposição, que assinaram uma nota, é que não cabe a Bolsonaro determinar a apreensão de provas. ;Esperamos que se determine o quanto antes a devolução do material apreendido pelo presidente da República e que o mesmo responda perante a Justiça pelo ilícito que confessou ter praticado;, afirmam.
Fim da estabilidade, no futuro...
O governo está convencido de conduzir uma reforma administrativa no setor público, em que futuros servidores públicos não contarão com estabilidade. Foi o que Bolsonaro voltou a dizer ontem, ao detalhar um pouco do que está por vir na proposta que pode ser apresentada na próxima semana. ;A ideia é que os futuros servidores não tenham estabilidade;, destacou. ;Para algumas carreiras de Estado, tem que manter a estabilidade. Eu não posso formar, por exemplo, um sargento, um capitão de Forças Especiais e depois mandá-lo embora. Tem que ter formação específica para aquela atividade, bem como servidor civil, que eu não quero entrar em detalhe aqui;, disse.