Agência Estado
postado em 02/12/2019 10:15
A CEO do Ibope Inteligência, Márcia Cavallari Nunes, afirmou à Polícia Federal no dia 5 de novembro que o senador Renan Calheiros (MDB) acertou propostas de pesquisas eleitorais que seriam pagas pela J. O contrato é alvo de inquérito que apura repasse de propinas do grupo empresarial à candidatura de Renan Filho (MDB) ao governo de Alagoas, em 2014, como contrapartida ao apoio do senador à campanha de Dilma Rousseff à Presidência.
O depoimento de Márcia Cavallari foi tomado no âmbito da Operação Alaska, deflagrada no dia 5 de novembro, para intimar Renan Calheiros a prestar depoimento sobre supostas doações de R$ 40 milhões feitas pelo Grupo J a senadores do MDB para as eleições de 2014.
Segundo Cavallari, Renan Calheiros solicitou ao Ibope o acompanhamento da campanha de Renan Filho em 2014 por meio de pesquisas qualitativas e quantitativas. O acordo foi fechado pessoalmente pelo senador e o diretor regional do Ibope em Recife, Maurício Tadeu Garcia.
O projeto foi orçado em R$ 600 mil, dos quais R$ 300 mil seriam pagos pelo grupo J e o restante pela campanha de Renan Filho. Cavallari explica que, como à época ainda era permitido a doação de empresas privadas a campanhas eleitorais, não havia nenhum indício de que haveria alguma coisa errada no projeto.
Em delação premiada que serve de base para o inquérito, o empresário Ricardo Saud, da J, afirmou que o pagamento de R$ 300 mil serviu para mascarar propinas direcionadas a Renan Calheiros. "R$ 300 mil em 21/7/ 2014 para o Ibope, nota fiscal 14247 - Ibope nacional. Fazia pesquisa pra eles e pagava com essa propina. o ibope recebia propina. nunca fez um serviço para nós", relatou, em 2017.
O montante fazia parte de um pacote de R$ 3 milhões do grupo que foi recebido por Renan Calheiros e destinado à campanha do filho ao governo de Alagoas. A acusação foi embasada por uma nota fiscal emitida pelo Ibope e o comprovante de depósito bancário feito pela J no valor de R$ 281.550,00 feito no dia 21 de julho de 2014.
À Polícia Federal, Cavallari negou que a nota fiscal fosse fraudulenta e declarou que todos os serviços foram efetivamente prestados. O valor pago pela J, afirma, foi utilizado para a realização das pesquisas, incluindo pagamentos com fornecedores, moderadores e entrevistadores.
Após a delação de Saud, a CEO afirmou que entregou ao Ministério Público Federal todos os relatórios de pesquisas qualitativas e quantitativas entregues feitas pela empresa.
"Essa entrega dos relatórios foi feita de maneira espontânea, pois o Ibope não fez nada ilegal, nunca pagou propina, nem deu dinheiro a nenhum político, nem participou de qualquer esquema de lavagem de dinheiro. Nunca recebeu nenhum dinheiro de caixa dois, nunca prestou serviços não faturados ou sem nota fiscal, nem recebe em dinheiro em espécie", afirmou.
Cavallari afirmou que o instituto efetuou quatro pesquisas para o Grupo J, sendo uma delas em 2012 para avaliação eleitoral do prefeito de Campo Grande (MS), onde fica o frigorífico do grupo, e três em 2014: a que foi negociada por Renan Calheiros, uma segunda solicitada pelos irmãos Batista sobre o potencial da candidatura de Júnior Batista ao governo de Goiás, e uma última feita pelo senador Henrique Alves no Rio Grande do Norte.
Alaska
Deflagrada no início de novembro, a Alaska colocou a Polícia Federal às ruas para cumprir mandados de busca e apreensão e intimar para depôr os senadores Renan Calheiros, Eduardo Braga (MDB-AM), Jader Barbalho (MDB-PA), o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Vital do Rêgo Filho e o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega (governo Dilma Rousseff).
A operação foi autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin no âmbito do inquérito 4707, que apura pagamento de R$ 40 milhões feitas pelo Grupo J a senadores do MDB durante as eleições de 2014 a pedido de Mantega. A contrapartida seria garantir a "unidade do PMDB em prol da candidatura da ex-presidente Dilma Rousseff".
Segundo o delator Ricardo Saud, da J, os pagamentos foram feitos por meio de "simulação da prestação de serviços e emissão de notas fiscais fraudulentas, entregas em espécie e doações oficiais".
A operação quase levou à prisão de Dilma Rousseff, solicitada pela Polícia Federal e negada por Fachin. A ex-presidente classificou a ação como "estarrecedora" e "absurda" visto que se trata de um processo a qual ela não é investigada formalmente e nunca foi chamada a prestar esclarecimentos.
Defesas
"O Ibope Inteligência esclarece que nunca emitiu notas fiscais falsas, nem recebeu qualquer tipo de propina das empresas do grupo JBS ou de qualquer outra empresa. O Ibope Inteligência foi contratado para realizar um projeto de pesquisas para monitoramento das eleições estaduais de Alagoas em 2014. Metade do valor foi pago pela campanha de Renan Filho e a outra metade foi pago pela J. Na época, a lei permitia que as empresas fizessem doações para campanhas políticas. O Ibope Inteligência desconhece qualquer tratativa da empresa doadora com o partido político, o candidato ou mesmo o senador Renan Calheiros. Trata-se simplesmente do pagamento por um serviço efetivamente prestado, conforme esclarecimentos já prestados ao Ministério Público Federal, Receita Federal e Policia Federal".
"Desde 2017, quando houve o Termo de Pré-Acordo de Colaboração Premiada assinado por Joesley Mendonça Batista, Wesley Mendonça Batista e Ricardo Saud com a Procuradoria-Geral da União, disponibilizamos em nosso site, para a consulta de todos os brasileiros, o relatório com todas as notas fiscais mencionadas nesse Termo".
O advogado Luís Henrique Machado, que defende o Renan Calheiros e o governador Renan Filho, também se manifestou. "Todas as prestações de serviços contratadas nas eleições de 2014 foram pagas pelo MDB, inclusive do Ibope, constando as respectivas notas fiscais, contratos e aprovação das contas pelo tribunal", disse.