Agência Estado
postado em 03/12/2019 13:56
O amigo pessoal do delator Ricardo Saud, Durval Rodrigues da Costa, implicou o assessor especial do governo de Alagoas, Ricardo Rocha, como o responsável por supostamente receber propinas pagas pelo grupo J ao senador Renan Calheiros (MDB-AL). O dinheiro seria destinado à campanha do atual governador do Estado, Renan Filho (MDB), e seria uma contrapartida para o apoio do senador à candidatura de Dilma Rousseff à Presidência, em 2014.
Em depoimento prestado em maio, Costa afirmou que os valores eram recebidos por um homem chamado "Ricardo". Na época, após divulgação da reportagem do jornal O Estado de S. Paulo sobre o caso, o empresário Ricardo Santa Ritta, filho de Carlos Ricardo Santa Ritta, assessor especial de Renan Calheiros no Senado, entrou em contato com a Polícia Federal para esclarecer que tinha informações sobre o Ricardo citado por Costa.
Em depoimento prestado no dia 9 de agosto, na sede da PF em Brasília, afirmou que o Ricardo procurado pelos agentes "possivelmente" seria Ricardo José Gomes da Rocha, o Ricardo Rocha, atualmente lotado como assessor especial no gabinete do governador Renan Filho.
Segundo Santa Ritta, à época da entrega das propinas, Rocha era motorista do filho de Renan Calheiros durante as eleições. Dez dias depois, Durval Costa foi novamente chamado para depor e esclarecer o caso.
A PF apresentou fotos de Rocha. O amigo de Saud confirmou o assessor especial como "a provável pessoa que lhe acompanhou na entrega dos valores em espécie destinados ao senador Renan Calheiros", em 2014.
Ricardo Rocha foi alvo de buscas e apreensões no último dia 5 de novembro, quando a Polícia Federal foi às ruas cumprir mandados judiciais no âmbito da Operação Alaska. Segundo Durval Costa, Ricardo Rocha seria o motorista que buscou e levou propinas em espécie para Renan Calheiros em diversas ocasiões.
Na primeira delas, em Maceió, o motorista subiu até o quarto do Ibis Hotel onde Costa estava hospedado e reunido com José Aparecido Alves Diniz, ex-prefeito de Abadiânia (GO) e ex-assessor de Renan Filho, para buscar mala com R$ 600 mil.
Durval Costa destacou que Diniz havia dito que, quando ele não estivesse presente para receber os valores seria Ricardo quem pegaria o dinheiro, por ser uma "pessoa da confiança" de Renan e que poderia ter ingresso no estacionamento da garagem do prédio onde morava o senador.
Na segunda entrega, também em Maceió, Costa afirma ter entrado em contato com Ricardo Rocha, que buscou a mala com R$ 800 mil no hotel, contou as cédulas e "foi embora para entregar o dinheiro a Renan Calheiros".
O motorista, contudo, teria solicitado que pudesse ir a Recife buscar a próxima remessa de dinheiro que estaria por vir.
A terceira ocasião foi em Recife, quando Durval Costa teria se encontrado com Ricardo Rocha e uma pessoa da confiança de André Gustavo Vieira - publicitário condenado na Lava Jato, em segunda instância, a 6 anos e 4 meses, após admitir que operou propinas para o ex-presidente da Petrobras Aldemir Bendine.
Essa pessoa teria entregue uma mala com R$ 700 mil a Ricardo Rocha, que voltou para Maceió no mesmo dia com o dinheiro "para entregar ao senador Renan Calheiros".
Durval Costa relatou que o modus operandi se repetiu mais duas vezes, com o "motorista de Renan" indo buscar malas com R$ 800 mil e R$ 900 mil.
Relações
A Polícia Federal chegou ao nome de Ricardo Rocha após o administrador Ricardo Santa Ritta entrar em contato com os agentes afirmando ter sido identificado por Costa como o motorista Ricardo.
Em depoimento, Santa Ritta afirmou que sua relação com Renan Calheiros tem origem no fato do pai, Carlos Santa Ritta, ter exercido cargos no gabinete do senador e exercer função de secretário-geral do MDB em Alagoas. Ricardo Santa Ritta confirmou à Polícia Federal que atuou na campanha de Renan Filho ao governo do Estado em 2014, elaborando o plano de governo e ações na área de publicidade, mas que "nunca exerceu a função de motorista ou secretário particular" do candidato.
Santa Ritta declarou que conheceu só José Aparecido Alves Diniz, ex-assessor de Renan Calheiros, em 2015, após a época dos repasses citados por Durval Costa.
Amigo do delator
Durval Costa diz ser, há 20 anos, amigo pessoal do delator Ricardo Saud, executivo do grupo J. Trabalhou como assessor do ex-deputado federal Aracely de Paula (PR) e também para o governo de Minas Gerais. Ele falou à PF no dia 21 de maio.
O depoimento no qual detalha as supostas entregas tem sido corroborado com respostas de hotéis e companhias aéreas à Polícia Federal em que confirmam suas estadias durante as eleições em cidades onde diz ter feito entregas.
Os depoimentos sobre repasse de propinas a Renan Calheiros destinadas à campanha de Renan Filho foram tomados no âmbito do inquérito 4707, que apura pagamento de R$ 40 milhões feitas pelo grupo Grupo J a senadores do MDB durante as eleições de 2014 a pedido de Mantega. A contrapartida seria garantir a "unidade do PMDB em prol da candidatura da ex-presidente Dilma Rousseff".
Segundo o delator Ricardo Saud, da J, os pagamentos foram feitos por meio de "simulação da prestação de serviços e emissão de notas fiscais fraudulentas, entregas em espécie e doações oficiais".
No dia 5 de novembro, a Polícia Federal deflagrou a Operação Alaska para cumprir mandados de busca e apreensão e intimar para depôr os senadores Renan Calheiros, Eduardo Braga (MDB-AM), Jader Barbalho (MDB-PA), o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Vital do Rêgo Filho e o ex-ministro Guido Mantega (Fazenda/Dilma Rousseff).
A operação quase levou à prisão de Dilma Rousseff, solicitada pela Polícia Federal e negada pelo ministro do STF Edson Fachin. A ex-presidente classificou a ação como "estarrecedora" e "absurda" - visto que se trata de um processo a qual ela não é investigada formalmente e nunca foi chamada a prestar esclarecimentos.
Defesas
A reportagem entrou em contato com a defesa do senador Renan Calheiros e com a Secretaria de Estado do Gabinete Civil de Alagoas, para ouvir o assessor Ricardo Rocha, mas não havia obtido retorno até a publicação desta matéria. O espaço está aberto para as manifestações de defesa.