Além dos desafios pontuais de cada setor, os órgãos de regulação têm pela frente a expectativa de uma atuação mais eficiente e autônoma. Com a lei das agências em vigor desde junho do ano passado, os especialistas esperam mais rigor na análise de impacto regulatório. No entanto, com tantas cadeiras vagas nos colegiados, há o temor de que elas não saiam ilesas das indicações políticas.
Para Daniel Vila-Nova, advogado da área de direito administrativo e regulatório do escritório Souto Correa Advogados, a legislação traz inovações importantes. “Esperamos que a análise de impacto seja uniformizada para que as decisões não sejam desautorizadas”, avalia.
Uma estratégia que se mostrou acertada na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é antecipar a programação, segundo ele. “Isso facilita a regulação e permite que os conflitos sejam resolvidos antes, para que os atores possam fazer seus estudos. Assim ninguém é pego de surpresa quando sair uma regulação nova. Isso permite mais estabilidade e segurança jurídica. O maior desafio será a padronização”, diz. Para o especialista, com as numerosas vagas, é difícil dizer que não vai ter influência política. “O presidente da ANP (Agência Nacional do Petróleo) pediu para sair. Isso mostra possível desgaste”, alerta.
Décio Oddone decidiu antecipar o fim do mandato na ANP, que iria até dezembro, e deixou a direção da agência, alegando que as grandes transformações no setor, derivadas de decisões de política energética, estão encaminhadas. “A gestão da ANP está em processo de modernização, simplificação, agilização e aumento da transparência. As questões da competitividade, da transparência nos preços e da regularidade fiscal passaram a fazer parte da agenda. A necessária desvinculação das áreas técnicas está sob avaliação. O processo de grandes mudanças no setor, do qual participei com afinco, encerrou-se com os últimos leilões”, justifica.
Para a especialista em direito regulatório na área de petróleo e gás Lívia Amorim, no entanto, o maior desafio da ANP ainda não foi encaminhado. “O modelo de partilha é muito engessado. Tanto que, nos últimos leilões, só a Petrobras apresentou proposta. Não é que concessão seja melhor, mas é preciso ajustar os parâmetros para atrair investidores”, avalia. O novo mercado de gás também tem muito a entregar em 2020, acrescenta. A ANP explica que o setor “propõe um novo modelo, mais aberto e competitivo”. “Para este ano, está prevista a publicação de norma que estabelece os critérios de autonomia e independência dos transportadores de gás natural.”
No entender de Alberto Sogayar, sócio da área de infraestrutura do L.O. Baptista Advogados, as agências precisam mostrar isenção e independência. “Não podem ser um alongamento do Estado. Têm de ter corpo técnico qualificado focado nos projetos e não no poder concedente nem no concessionário”, aponta. Para ele, a Agência Nacional de Águas (ANA) terá um protagonismo em 2020, com o novo marco do saneamento, que tramita no Congresso e deve ser aprovado este ano. Pela proposta, a agência editará normas de referência para o setor, mas não realizará a regulação direta das empresas municipais ou estaduais. Para isso, está entre suas prioridades “aperfeiçoar as estratégias regulatórias”.
Decisões políticas
O ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, ao anunciar as prioridades para 2020, elencou entre elas o transporte hidroviário e a integração modal. O diretor da Agência de Transportes Aquaviários (Antaq), Adalberto Tokarski, destaca, no entanto, que o Executivo ainda precisa tomar as decisões políticas para que o tema entre na ordem do dia na agência. “O governo quer fazer a BR do Mar, buscando conexão hidroviária. Isso tem que entrar na prioridade, porque o setor ferroviário está crescendo e o país precisa de soluções de intermodalidade para apoiar a navegação”, diz.
Enquanto isso não sai do papel, o desafio da Antaq é simplificar a regulamentação para a expansão das concessões portuárias. “Temos 21 áreas preparadas. Mas nosso esforço, que está em fase final, é tornar o processo de arrendamento mais simples. Em vez de fazer estudo de viabilidade técnica ambiental, a ideia é estabelecer o preço conforme o metro quadrado. Assim, na hora do arrendamento, será possível ter um ponto de partida para fazer o leilão”, explica.
Para as privatizações das Companhias Docas, a modelagem está sendo feita pelo governo via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), de acordo com Tokarski. “Quanto mais o setor ficar na iniciativa privada, mais de perto a agência tem de atuar na fiscalização”, sustenta.
Com foco na intermodalidade, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) tem objetivos mais definidos para 2020. “A lista de projetos é extensa”, informa. Na área de rodovias, há vários eixos logísticos rodoviários preparados para concessão, alguns já com leilão marcado, outros em audiência pública (veja página ao lado). “Não tenho dúvida de que o modal rodoviário é consolidado, há um aprimoramento dos editais, que estão muito maduros. Quase anda sozinho. O ferroviário é mais difícil. A subconcessão da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) deve ocorrer este ano, mas serão poucos players e não deve haver grande ágio”, estima Sogayar, do L.O. Baptista.
A pauta dos setores ferroviário e rodoviário é comum na ANTT, com foco na desburocratização da regulação, opina Fernando Paes, diretor executivo da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF). “É preciso criar uma regulação mais inteligente, que viabilize a entrada de novos operadores nos mercados. No setor ferroviário, a regulação é extremamente excessiva, com normas que não fazem sentido dos pontos de vista econômico e de engenharia, que só trazem ônus o para os concessionários”, afirma.
O desafio da agência, no entender de Paes, será acompanhar o governo no objetivo de modernizar o setor de infraestrutura, com redução do fardo regulatório, de forma integrada. “O órgão regulador precisa ser mais eficiente do que é hoje para desonerar o trabalho dos concessionários e permissionários. Estamos dispostos a contribuir”, acrescenta.
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