Politica

Popularidade alta de Moro evita desmembramento de ministério

Recuo de Bolsonaro sobre a divisão da pasta da Justiça e Segurança Pública mostra o prestígio que o ministro ainda desfruta no governo, apesar de ter os limites constantemente testados pelo chefe do Executivo. Ex-juiz ganha apoio do vice-presidente

Correio Braziliense
postado em 25/01/2020 07:00
Sergio Moro fez chegar ao chefe, por meio de interlocutores, que deixaria o cargo se divisão do ministério se concretizasseUm dia depois de admitir estudar o desmembramento do Ministério da Justiça e Segurança Pública, o presidente Jair Bolsonaro recuou da intenção. O passo atrás do chefe do Executivo mostra a força que ainda tem o ministro Sergio Moro, titular da pasta e o mais popular do governo. Nesta sexta-feira (24/1), o ex-juiz ganhou apoio do vice-presidente Hamilton Mourão. Além disso, ele havia conquistado politicamente parte da ala militar do governo. Se a divisão fosse concretizada, o ministro perderia 80% das atuais atribuições e, com elas, grande parte do protagonismo que desfruta hoje. Nos bastidores, ele fez chegar ao chefe, por meio de interlocutores, que deixaria o cargo se a ameaça se concretizasse.

Moro permanece apreensivo, até porque, na declaração em que negou a eventual separação de pastas, Bolsonaro não descartou em definitivo a ideia. “A chance no momento é zero. Tá bom ou não? Tá bom, né? Não sei amanhã. Na política, tudo muda, mas não há essa intenção de dividir”, ressaltou, na Índia, onde ficará até segunda-feira em viagem oficial. Depois, em entrevista ao Jornal da Band, ele reclamou da forma como foi tratada sua declaração de estudar a recriação do Ministério da Segurança. “Vão para a maldade, como se eu estivesse já interessado. Não preciso fritar ministro para demitir. Nenhum ministro meu vive acuado, com medo de mim. As minhas ações são bastante pensadas e muito bem conversadas antes. O assunto tomou uma proporção que não sei por quê”, criticou.

Apesar de viver testando os limites de Moro, com estocadas sucessivas no ministro — um eventual adversário nas eleições de 2022 —, Bolsonaro garantiu que não tem nenhum problema com o ex-juiz. “Todos os meus ministros são tratados de maneira igual, dei liberdade para todos eles definirem seus ministérios, e eu tenho poder de veto. Não abro mão disso, porque na política quem dá o norte sou eu”, ressaltou. “Repito: todos os ministros têm o mesmo valor para mim e eu interfiro em todos os ministérios. Não existe qualquer fritura, nenhuma tentativa de esvaziar o senhor Sergio Moro. Muito pelo contrário, ele está fazendo um bom trabalho no tocante à segurança.”

O presidente destacou que o ex-magistrado e os secretários de Segurança dos estados têm mostrado bom desempenho no setor. “Ele faz a parte dele. Temos batido o recorde de apreensão de drogas. A questão de isolar os cabeças do crime organizado de São Paulo, uma questão judicial do estado de São Paulo, nós demos a cobertura. Se não, não poderia ser cumprida. Ajudou, e muito, a questão de combater a violência no nosso país, e está indo bem. Nada além disso”, concluiu.

Encontro

Nesta sexta-feira (24/1) de manhã, Moro se reuniu com Mourão e recebeu apoio. Questionado sobre o assunto, o presidente em exercício respondeu que chegou a conversar com chefe do Executivo sobre o caso. “Algumas vezes, nós já trocamos ideias a esse respeito. Ele apenas me perguntou, e eu respondi que do jeito que está, está bom. Considero que a situação que estamos vivendo é um time que está vencendo. Usando aquele velho chavão, time que está ganhando a gente não mexe”, declarou.

O encontro entre Mourão e Moro durou cerca de 30 minutos e não constava na agenda oficial de nenhum dos dois. O teor dos assuntos tratados não foi divulgado. Na saída, o ministro evitou a imprensa. Posteriormente, o vice-presidente disse que falou com o ex-juiz sobre a criação da Força Nacional Ambiental contra o desmatamento e negou que tenha tocado na hipótese de separação ministerial entre Segurança e Justiça. (Colaborou Rosana Hessel, enviada especial à Índia).

Pedido

Bolsonaro disse que recebeu de secretários estaduais de Segurança o pedido de divisão do Ministério da Justiça e Segurança Pública e que prometeu estudar a possibilidade. “Alguns (secretários), não são todos, estão querendo a divisão. Alguns podem estar bem-intencionados e outros podem querer enfraquecer o governo”, afirmou, nesta sexta-feira (24/1), o chefe do Executivo.

Troca de comando na Polícia Federal

Apesar do recuo de Bolsonaro de dividir as pastas, o Correio apurou que permanece a intenção de trocar o comando da Polícia Federal. Esse deve ser o próximo embate entre Sergio Moro e o presidente da República. O atual diretor-geral da corporação, Maurício Valeixo, tem apoio do ministro da Justiça. No ano passado, quando surgiu a informação de que ele seria demitido, o ex-juiz foi categoricamente contra. Valeixo também tem o apoio de agentes e delegados, principalmente para manter a independência da PF. Os incômodos de Bolsonaro com a cúpula da PF, de acordo com fontes no governo, têm a ver com a conclusão da corporação de que Adélio dos Santos agiu sozinho no atentado à faca que o chefe do Executivo sofreu em setembro de 2018. Outro descontentamento seria o fato de a PF ter aberto inquérito contra o senador Flávio Bolsonaro, filho dele, acusado de comandar um esquema de rachadinha no Rio de Janeiro. O presidente não estaria aprovando a atuação dos investigadores no caso.

"Redução da criminalidade não tem a ver com ministro"

Cotado para assumir o eventual Ministério da Segurança Pública, o ex-deputado Alberto Fraga (DEM) defende a nomeação de um nome técnico, que tenha experiência no setor para conduzir as ações do governo voltadas para o combate à criminalidade. O ex-parlamentar destacou que os números de mortes violentas e de outros crimes estão caindo em todo o país, mas, segundo sustentou, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, não tem “nada a ver” com esse resultado.

Ao Correio, Fraga, que ocupou a Comissão de Segurança Pública da Câmara e desenvolveu projetos voltados para o combate a organizações criminosas, afirmou que mudar as leis, como fez o pacote anticrime, criado com a participação de Moro, é apenas uma etapa da política nacional voltada para a redução dos índices criminais. “Eu sempre defendi que a pasta tem de ser específica. Essa sempre foi minha luta. No governo Temer, funcionou. Eu acho uma hipocrisia dizer que os números foram reduzidos pelo ministério (da Justiça e Segurança Pública). Ele não é um órgão executor, é um órgão normativo.”

Fraga ressaltou que esteve com o presidente Jair Bolsonaro por três dias nesta semana, mas não tocou na eventual divisão das pastas. Ele disse que falou com o chefe do Executivo sobre o tema no ano passado, no começo do governo.

Na opinião do ex-deputado, Moro não tem a experiência necessária para estar à frente de todas as funções que possui atualmente. “Eu sou suspeito para falar, pois, quando o ministério foi criado, eu fui ao governo Temer. Eu fiz o pedido, com a bancada da segurança pública. Respeito a figura do Moro, ícone de combate à corrupção. Agora, não venha me dizer que os números de redução (da violência) têm a ver com ele, porque não tem”, enfatizou.

Ainda de acordo com Fraga, é preciso separar a função do Ministério da Justiça — que criar normas e sugere leis — da de Segurança, responsável pelo planejamento das políticas do setor. “Ele é um cara espetacular (Moro). Eu parabenizo o pacote anticrime, concordei com tudo. Agora, ele não é executor de segurança pública. Dizer que o pacote anticrime é responsável por diminuir a violência é hipocrisia”, completou. 

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