Correio Braziliense
postado em 03/02/2020 04:33
Nem alinhamento automático, nem oposição. O Congresso, empoderado pela ampliação da obrigatoriedade de liberação de suas emendas ao Orçamento, se mostra a cada dia mais disposto a adotar uma postura independente em relação ao presidente Jair Bolsonaro. Até por ser um ano de eleições municipais, em que ainda não será possível definir com clareza para que lado irá o eleitor em outubro de 2022, a ordem da maioria dos políticos é não avançar o sinal, nem para um lado nem para outro. Obviamente, tire-se dessa lista os bolsonaristas convictos, menos de uma centena de deputados, e a oposição, que não vota nada que venha do governo, caso do PT e do PSol.
As senhas para esse comportamento de independência da maioria se tornar mais consolidado nessa segunda temporada da 56ª Legislatura são a obrigatoriedade de o governo liberar as emendas dos deputados e senadores ao Orçamento e a resistência do presidente Jair Bolsonaro em abrir espaços de poder aos partidos políticos de forma institucional. Isso não significa que a balança penderá sempre contra ou a favor das propostas governamentais.
“Seremos a Casa da ponderação, da moderação e da conciliação, porque o que os brasileiros esperam da gente não é uma briga institucional. O que está assegurado na Constituição é a harmonia e a independência dos Poderes. Eu quero manter esse equilíbrio, o diálogo, o entendimento e colocar a pauta do Senado Federal e do Congresso para trabalhar a favor dos brasileiros, para reaquecer a economia, gerar empregos e melhor qualidade de vida para as pessoas”, declarou o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), em entrevista, num ensaio do discurso que fará hoje na abertura do ano legislativo.
Nos bastidores, a declaração de Alcolumbre é traduzida como um sinal de que, em relação à agenda econômica, o governo não estará tão sozinho, até porque os parlamentares não querem ser acusados de apostar no quanto pior, melhor. Ocorre que, nesta largada de 2020, a equipe econômica apostará numa agenda de aprovação da reforma administrativa e, se der, a reforma tributária. Deputados e senadores, entretanto, preferem a reforma tributária. O líder da maioria e relator, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), trabalha desde o ano passado para buscar um consenso. “Acho que conseguiremos chegar a uma proposta única entre Câmara e Senado”, diz ele. “A Casa quer a tributária”, diz o novo líder do DEM, Efraim Filho (PB).
O otimismo de Aguinaldo Ribeiro e o equilíbrio de Davi Alcolumbre se refletem nas conversas intramuros. A avaliação geral é a de que existe hoje uma “vontade política” a favor da tributária. Quanto à reforma administrativa, a resistência é muito maior. Tanto é que o texto sequer foi apresentado e já existe muita gente com cara de enfado quando se pergunta sobre esse tema. O mesmo semblante ocorre quando deputados respondem sobre as propostas de emenda à Constituição (PECs) que o governo encaminhou ao Congresso como a salvação da economia.
A proposta de extinguir municípios a fim de reduzir gastos é vista como algo muito difícil de ser aprovado, até porque a maioria dessas pequenas cidades já estão em movimento pela escolha dos prefeitos. É uma medida que só passa depois se houver um plebiscito. A proposta, que vai na esteira da PEC do pacto federativo, desagradou os parlamentares desde que foi enviada ao Congresso, em novembro.
O relator, senador Marcio Bittar (MDB-AC), afirmou que considera flexibilizar os critérios para a extinção dos municípios. Pelo projeto do governo, os que tivessem menos de 5 mil habitantes e receita própria correspondente a menos de 10% da total seriam fundidos a um vizinho. Bittar vai apresentar o parecer em fevereiro.
Outra aposta do governo, a chamada PEC emergencial tem chances de ser concluída no início do ano. A proposta do Senado prevê corte de até 25% na jornada e no salário dos servidores que recebem acima de três salários mínimos. Na semana passada, Maia afirmou que o texto pode ser apensado à PEC 438/2018, de autoria do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), que cria gatilhos para conter as despesas públicas.
Freio
Para completar as dificuldades que o governo tem em cada proposta, em que a negociação terá que se caso a caso, o fato de o presidente enfraquecer o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, também corre o risco de virar um freio no diálogo para aprovação dos projetos que Bolsonaro deseja. O ministro passou o fim de semana assegurando que “está tudo bem” e que “não tem mudança” e tentará passar essa impressão na sessão de hoje à tarde, em que, seguindo a tradição, enviará a mensagem do presidente Jair Bolsonaro. Onyx tem tudo para convencer os colegas de que está bem. Quanto à aprovação das propostas, aí, é outra história.
Serviço não falta
Um pequeno resumo do que está pendente no Congresso
Reforma tributária
Dois projetos tramitam na Casa, um de autoria do ex-deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), adotado pelo Senado, e outro do economista Bernard Appy, apresentado na Câmara pelo líder do MDB e atual presidente do partido, deputado Baleia Rossi (SP). Ambos unem impostos, sendo que Appy junta tanto os federais quanto o ICMS dos estados e o ISS dos municípios. O governo enviará a sua contribuição este mês.
Autonomia do Banco Central
Há anos tramita no Congresso uma proposta de emenda constitucional para que a diretoria do BC tenha mandato, de forma a evitar que um presidente possa fazer uso político da instituição guardiã do sistema monetário nacional. Desta vez, a tendência é de aprovação.
Medidas Provisórias
São 27 pendentes de análise. A primeira da fila é de forte apelo social e deve ser aprovada: institui pensão vitalícia de um salário mínimo a crianças com síndrome provocada pelo Zika vírus. Outra que deve ser aprovada é a que institui o 13º salário aos beneficiários do Bolsa Família. Outras duas devem caducar daqui a 13 dias sem apreciação: a da carteira de estudante digital e a que acabou a com publicação de editais em jornais de grande circulação.
Plano Mais Brasil
É composto por três propostas de emendas constitucionais:
PEC emergencial: cria gatilhos de ajuste fiscal para conter o crescimento das despesas obrigatórias, com medidas como proibição de concursos e redução de jornada e salário de servidores;
PEC da revisão dos fundos: desvincula alguns e extingue outros fundos ligados a instituições públicas e permite uso de recursos deles para pagar dívida pública;
PEC do pacto federativo: unifica os gastos mínimos obrigatórios em educação e saúde e dá mais autonomia para estados e municípios na distribuição dos recursos. Também prevê a extinção de municípios com menos de 5 mil habitantes e que não demonstrem capacidade de arrecadação de, pelo menos, 10% da sua receita. São 23% dos municípios brasileiros
Prisão em segunda instância
Tramitam uma proposta de emenda constitucional na Câmara e um projeto de lei no Senado para permitir a prisão de condenados em segunda instância
Marco regulatório do saneamento
Aprovado na Câmara em dezembro do ano passado, o projeto deve ser um dos primeiros itens analisados pelos senadores em 2020. Um dos principais objetivos é centralizar a regulação dos serviços de saneamento na esfera federal
Eletrobras
A tentativa de privatizar a companhia deve ficar para o segundo semestre do ano. O governo tenta emplacar o projeto, mas, em ano de eleição municipal, não deve ser prioridade para os parlamentares
Porte de armas
Tramita em regime de urgência o Projeto de Lei 6438/19, do Executivo, que autoriza o porte de armas para diversas categorias. Se aprovado, valerá para guardas municipais; agentes socioeducativos; polícia penal; auditores agropecuários; peritos criminais; agentes de trânsito; oficiais de justiça; agentes de fiscalização ambiental; defensores e advogados públicos
Fundeb
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), principal fonte de financiamento da educação básica no país, perde validade em 31 de dezembro de 2020. Cabe ao Congresso torná-lo permanente e, se for o caso, ampliá-lo. Um projeto nesse sentido tramita em uma comissão especial na Câmara
“Seremos a Casa da ponderação, da moderação e da conciliação, porque o que os brasileiros esperam da gente não é uma briga institucional”
Davi Alcolumbre,
presidente do Senado
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