Politica

Entrevista Lasier Martins

Autor de proposta que retira do presidente da República o direito de indicar ministros para a Corte, o senador diz que objetivo é evitar casuísmo e afirma que tribunal "não tem mais credibilidade". Ele sugere também a fixação de um mandato de 10 anos para os magistrados

Correio Braziliense
postado em 15/02/2020 04:12
Lasier Martins

PEC para “moralizar” o STF

Autor da proposta de emenda à Constituição (PEC) que pretende alterar a forma de indicação de ministros para o Supremo Tribunal Federal (STF), o senador Lasier Martins (Podemos-RS) defende menos influência política na Corte. O parlamentar acredita que a redução de poder do presidente da República para decidir quem ocupa os cargos também diminuirá interesses pessoais e partidários no principal tribunal do país. Além de propor a formação de uma lista tríplice para a realização da escolha, o parlamentar sugere que seja estabelecido um mandato de 10 anos, acabando com a vitaliciedade do cargo.

Em entrevista ao Correio, Lasier Martins critica os atuais integrantes do STF, inclusive o presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, por não ter se afastado de processos relacionados ao PT. Apesar de propor mudanças na forma de escolha dos ministros, o senador defende que a regra não contemple o mandato atual do presidente Jair Bolsonaro.

Lasier pede, ainda, que seja feito esforço político para restringir o foro privilegiado e que haja mais controle do uso de aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) que estão no centro de uma polêmica envolvendo integrantes do governo.

O senhor é autor da PEC que muda a forma de escolha dos ministros do Supremo. Por que considera que a regra atual não deve ser mantida?
O Supremo é formado com participação de outro poder, o que contraria a independência dos poderes prevista na Constituição. Os poderes são independentes e harmônicos. Agora, como falar em independente se o Supremo é formado por aqueles nomes que o chefe do Executivo indica conforme suas conveniências, amizades, identidade de ideologia, identidade partidária. Veja o caso do Toffoli. Passou a vida inteira trabalhando para o PT. Foi funcionário de José Dirceu (ministro da Casa Civil no governo petista). Aí, quando ele assume, uma das primeiras coisas que faz é colocar em liberdade o José Dirceu, crivado de crimes. Isso não é isenção, isso é casuísmo. Por isso, também, que ingressei com a PEC para que não haja casuísmo, que haja independência. E para que se moralize um poder que hoje não tem mais credibilidade. É motivo de um clamor nacional.

O senhor acredita, então, que o ministro Toffoli deveria se declarar suspeito em processos envolvendo o PT?
Claro. Da mesma forma, o próprio Gilmar Mendes deferiu três vezes o habeas corpus para aquele rei do ônibus no Rio de Janeiro, o Barata (Jacob Barata Filho). Ele foi padrinho de casamento (da filha do empresário). A mesma coisa o Lewandowski (Ricardo Lewandowski), que morava em São Bernardo (SP), era assessor jurídico do prefeito de São Bernardo, cidade onde vivia o Lula. E era amigo da dona Marisa Letícia, amizades pessoais. O Celso de Mello trabalhava com aquele ministro da Justiça, Saulo Ramos, aí, o Sarney o convidou, o Saulo, para ser ministro. Mas ele disse que não tinha interesse, que ia voltar à advocacia. Aí, indicou o assessor, que era o Celso de Mello. Assessor de antessala, ministro do Supremo. A mesma coisa o Temer, que indicou o ministro da Justiça dele. Temer, então, se envolve em um processo judicial, e o Alexandre de Moraes dá um despacho favorável. Esse conluio todo.

Isso não pode ocorrer agora, com o Sergio Moro, ministro da Justiça, que pode ser indicado pelo presidente Jair Bolsonaro?
Bom, aí é aquela grita que eu estou sofrendo. Estou sofrendo pressões: ‘Há, muito bem, agora que chegou a vez do Bolsonaro indicar os seus, o senhor não quer deixá-lo indicar’... Não tem nada a ver com isso. Tem uma emenda, e um pensamento muito bem colocado pelo Anastasia (Antonio Anastasia), que é o relator da minha PEC, dizendo o seguinte: que, na medida em que assumiu a Presidência da República, a exemplo dos antecessores, Bolsonaro tem direito adquirido de indicar os seus. Então, só vale para a próxima legislatura. É uma emenda muito bem-vinda para evitar complicações.

O mandato de 10 anos valeria para os ministros que já estão lá?
Não tem efeito retroativo. Os que estão aí, têm direito adquirido. Eles ficam até o fim. O fim da vitaliciedade é para quando entrar em vigor a lei e para os próximos indicados.

O fato de instituições do Judiciário votarem uma lista tríplice não cria um corporativismo?

Eu duvido muito. Mas não estou entendendo, que corporativismo vai ter? Nós precisamos de juristas, de pessoas de notório saber jurídico, como está na Constituição. Conduta ilibada, mínimo de 15 anos de prática… Se o Supremo se reúne e indica um nome, vai indicar o nome de um jurista. Se o Superior Militar vai indicar um nome, será daquele tribunal, ou alguém conhecido, como autor de obras jurídicas, um grande professor de direito, um defensor público. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pode indicar um advogado competente, de renome nacional. Vamos ter juristas, então, por que corporativismo? Eles vão escolher gente do ramo, gente boa.

Como o senhor avalia este início de ano no Congresso? O Senado volta pressionado a avaliar alguns temas?
São dias de muita agilidade, muitos projetos, alguns conflitos. Nosso movimento tem criado divergências muito grandes. O Senado estava viciado em uma linha de trabalho, só decidindo coisas secundárias. As grandes causas não vinham ao debate.

Quais são as grandes causas?
No momento, tem a prisão em segunda instância, que é um resquício do ano passado. Outra coisa que queremos regular é o uso dos aviões da FAB (Força Aérea Brasileira). Queremos acelerar também a votação do voto aberto e reduzir os gastos do Senado. Estamos batalhando muito para que haja a votação do fim do foro privilegiado, mas essa é lá na Câmara. Estamos usando o Senado para ver se influencia lá.

Como seria essa regulação do uso de aviões da FAB?
Vamos colocar um item bastante disciplinador. A cada três meses, a FAB deve enviar um relatório para o Tribunal de Contas da União, dizendo quem viajou, para onde, com quem e para fazer o quê. Isso vale para quem é autorizado a usar, como presidente e vice-presidente da República, presidentes dos poderes, ministros de Estado e comandantes das Forças Armadas.

Com relação à prisão em segunda instância, a aprovação deve ser via projeto de lei ou PEC?
Nós estamos correndo com as duas hipóteses. Aqui no Senado, com um projeto de lei que altera o item 283 do Código Penal e inclui mais uma hipótese de prisão. Esse artigo trata das formas de prisão, preventiva e temporária, e nós vamos colocar mais essa possibilidade (da segunda instância). O próprio Toffoli, quando nós levamos aquela carta para ele (de apoio à segunda instância), disse: ‘Por mim, o que eu penso é que o Senado tem poder para criar a prisão em segunda instância, mas tem um grupo aqui dentro que entende que é só por PEC’. Porém, a PEC é muito demorada e está correndo lá na Câmara. Aqui, nós temos um projeto de lei. Nós tivemos uma reunião do grupo e decidimos dar prioridade ao esforço e à insistência junto ao Alcolumbre (presidente do Senado) para colocar em pauta.

Com relação à restrição do foro, como deveria ocorrer?
Só para os presidentes dos três poderes. Só eles estariam liberados. Todos são iguais perante a lei. Já passou pelo Senado, o Rodrigo (Maia, presidente da Câmara) é que está trancando. Já prometeu várias vezes e não fez.

Como o senhor avalia a proposta de reforma administrativa,
que mexe com direitos de servidores? A declaração do ministro da Economia, Paulo Guedes, chamando-os de parasitas gerou polêmica.

Eu soube que o ministro pediu desculpas. Eu acho que ele não soube se expressar. Eu li as entrelinhas. Ele quis dizer que o hospedeiro, que é o Estado, está falido. E, apesar disso, os funcionários públicos estão pedindo, exigindo, por meio de suas corporações, reajuste salarial. Estão quebrando, cada vez mais, o poder estatal, o órgão público. Ele não disse que todo funcionário público é parasita. De qualquer forma, isso é problema dele, que pediu desculpas. Mas temos aqui no Senado o PL complementar que propõe avaliação periódica de desempenho. Durante dois anos, precisa ter uma nota mínima para continuar no serviço público. A direção do Senado não tem deixado andar, mas é uma maneira de tornar mais eficiente o serviço público. A maioria dos funcionários são louváveis, eficientes, dedicados. Agora, tem uma minoria indolente, relapsa, não comparece.

É a favor do fim da estabilidade no funcionalismo?
Não. Eu sou a favor de que, mesmo sendo estável, não sendo eficiente, não atingindo uma boa nota, ele não deve continuar. Por isso, na minha proposta, digo que não se exige nota 10, ou nove, que são excelentes. Não se exige ótimas, sete ou oito. Não se exige uma média, seis. Não se exige nem mesmo uma medíocre, que seria 5. Agora, se o sujeito não tem competência para tirar nota três... No primeiro ano, ele recebe uma advertência, passa a ser acompanhado por um supervisor e tem mais um ano de oportunidade. Se, no segundo ano, ele não tira, no mínimo, nota três, aí tem de ser exonerado.

Seria a qualquer tempo, ou apenas no estágio probatório?
Apenas nos primeiros três anos.



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