Correio Braziliense
postado em 19/02/2020 12:15
A fila de brasileiros que esperam pelo Bolsa FamÃlia já chega a 3,5 milhões de pessoas, o que representa 1,5 milhão de famÃlias de baixa renda. O gargalo tem provocado um princÃpio de colapso na rede de assistência social de municÃpios, sobretudo os pequenos e médios. Sem o dinheiro do programa, a população voltou a bater à porta das prefeituras em busca de cestas básicas e outros tipos de auxÃlio.
O Estado chegou ao número de pessoas na fila do Bolsa FamÃlia analisando o banco de dados do governo federal. No fim de janeiro, o Ministério da Cidadania havia informado, via Lei de Acesso à Informação (LAI), que a lista de pedidos para entrar no programa de transferência de renda seria cerca de um terço deste número, 494 mil famÃlias.
As demandas da população carente tem sobrecarregado as finanças municipais, já combalidas. Em Surubim, a 120 quilômetros do Recife, interior de Pernambuco, os pedidos de cestas básicas dobraram no segundo semestre do ano passado. A prefeita Ana Célia de Farias (PSB) fez um aditivo ao contrato para distribuição de alimentos. Gestores do Bolsa FamÃlia da cidade de 70 mil habitantes avaliam que o crescimento da demanda por atendimentos se deve ao congelamento de novos benefÃcios do programa federal.
"São nove meses de uma fila de espera que só aumenta. E tem uma demanda que se reverte para a gestão municipal. Quem não tem acesso recorre à prefeita", afirmou Penélope Andrade, vice-presidente do Colegiado Estadual de Gestores da Assistência Social de Pernambuco e secretária de Assistência Social em Surubim.
No municÃpio de PicuÃ, a 240 quilômetros de João Pessoa, na ParaÃba, o prefeito Olivânio RemÃgio (PT) também disse ter registrado aumento no número de pedidos feitos por moradores de baixa renda. "São pessoas que perderam o emprego devido à recessão econômica e precisam do Bolsa FamÃlia. Nos procuram para podermos arcar com esse ônus. Está sufocando a prefeitura", disse.
À frente de um municÃpio de 18 mil moradores, RemÃgio afirma que não consegue atender todos. "Já tem fila nos nossos programas sociais, como aluguel social, pedidos para pagar conta de energia. E a arrecadação municipal é baixa."
Como de maio para cá não houve variação significativa nos nÃveis de pobreza no PaÃs, o congelamento das novas entradas preocupa gestores municipais. "O dinheiro dos benefÃcios sociais circula na economia local. Sem isso, sofrem a economia local e as pessoas mais carentes", afirmou Denilson Magalhães, supervisor do núcleo de Desenvolvimento Social da Confederação Nacional dos MunicÃpios.
Queda
Dados do Ministério da Cidadania apontam uma queda brusca no volume de concessões do Bolsa FamÃlia a partir de maio de 2019. Naquele mês, 264.159 famÃlias foram incluÃdas na lista de beneficiários. A partir de junho, as entradas caÃram para 2.542 e, até outubro, quando os dados mais recentes foram publicados no Cecad, o banco de dados do Cadastro Único de benefÃcios sociais do governo federal, o volume permanecia neste patamar.
Ao Estado, o ministério reconheceu a redução no número de inclusões de famÃlias nos últimos meses e disse que isso será normalizado "com a conclusão dos estudos de reformulação do Bolsa FamÃlia". No entanto, técnicos consultados pela reportagem apontam que a redução pode ter sido uma manobra para garantir caixa necessário ao pagamento do 13º do benefÃcio, promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro. Em nota, a pasta afirmou, ainda, que as concessões também dependem de "estratégias de gestão da folha" de pagamento.
O Ministério da Cidadania está em processo de transição. Onyx Lorenzoni, ex-ministro da Casa Civil, foi designado para substituir Osmar Terra. A troca ocorreu após o Estado revelar a contratação, na gestão de Terra, de uma empresa suspeita de ter sido usada como laranja para desviar R$ 50 milhões. Antes de demitir Terra , Bolsonaro ligou para reclamar da fila, uma dor de cabeça que aumenta em ano eleitoral.
De acordo com as regras do governo, o Bolsa FamÃlia deve atender todas as famÃlias em extrema pobreza, com renda familiar de até R$ 89 per capita. Também têm direito ao benefÃcio as famÃlias em situação de pobreza, ou seja, com renda per capita de até R$ 178 por mês, desde que tenham crianças e adolescentes de até 17 anos.
O levantamento do Estado que identificou a falta de assistência para 3.556.454 pessoas levou em conta somente as situadas na extrema pobreza e com cadastros atualizados ao longo de 2019, o que significa que a fila pode ser ainda maior.
Nordeste
O Nordeste é onde está a maior parcela de pessoas na fila do Bolsa FamÃlia, conforme os números apurados pelo Estado. Das 1,5 milhão de famÃlias que aguardam, na fila, 606.835 estão distribuÃdas pelos nove estados da região, o que corresponde a 39,1% do total. Outros 36,8% estão espalhados pelo Sudeste, um total de 571.609.
De acordo com dados compilados por secretários estaduais de Assistência Social do Nordeste em fevereiro, 100 mil famÃlias entraram para o Bolsa FamÃlia em janeiro, sendo apenas 3.035 delas da região mais pobre do PaÃs. O maior volume de liberações, ainda de acordo com o levantamento dos secretários, foi para o Sudeste, 45.763.
CaracterÃstica
A fila para ter acesso ao benefÃcio não surgiu no governo Bolsonaro. Técnicos relatam que ela é caracterÃstica do programa. O que muda, no entanto, é a ausência de perspectiva para que ela diminua. Antes, com a meta de atendimento de 13,9 mi de famÃlias, a gestão do Bolsa FamÃlia podia diminuir expressivamente a fila ao longo de um ano calendário.
FamÃlias saiam em consequência de processos administrativos, mas outras podiam entrar. Havia orçamento para isto. Hoje, o programa não tem previsão orçamentária para passar dos 13,1 milhões de famÃlias. O que não prática resulta num corte permanente de quase 1 milhão de famÃlias. A porta está fechada. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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