Correio Braziliense
postado em 27/02/2020 04:12
O Congresso segue em recesso de carnaval e só volta aos trabalhos na próxima semana, mas deputados começaram a se mobilizar para dar uma resposta à iniciativa do presidente Jair Bolsonaro de compartilhar vídeo que convoca manifestação, em 15 de março, de apoio ao governo e contra o parlamento e o Supremo Tribunal Federal (STF). Uma reunião está marcada para terça-feira, entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e líderes partidários, com o objetivo de definir uma ação conjunta e enérgica. Embora muitos vejam crime de responsabilidade na atitude do chefe do Executivo, lideranças de partidos, mesmo as de oposição, não mencionam a possibilidade de impeachment.
Evitar falar em impeachment é a estratégia de deputados para obter um consenso maior e definir uma resposta unificada. “Sair anunciando medidas ou adotando caminhos pode provocar a desunião da Casa e demonstrar uma falta de unidade do Congresso, o que seria péssimo”, argumentou Alessandro Molon (PSB-RJ), líder da oposição na Câmara. O parlamentar classifica como “extremamente grave” e “um ataque à democracia” a ação do presidente.
Líder da minoria na Câmara, Jandira Feghali (PCdoB-RJ) disse que não é possível antecipar medidas a serem tomadas na reunião de terça-feira. A deputada afirmou que o problema “não é da oposição, mas sim da democracia”, e também defendeu uma reação conjunta.
O presidente da Casa, Rodrigo Maia, está em viagem internacional, mas se posicionou por meio de sua conta no Twitter: “Só a democracia é capaz de absorver sem violência as diferenças da sociedade e unir a nação pelo diálogo. Acima de tudo e de todos está o respeito às instituições democráticas”, escreveu, mudando o bordão usado pelo presidente Jair Bolsonaro, que é “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”.
O deputado federal Léo Moraes (RO), líder do Podemos, disse que fará uma reunião do partido na Câmara, também na terça-feira, para debater o assunto e decidir qual atitude será tomada em conjunto. “Qualquer tentativa de autoritarismo, de interesse em ditadura, é extremamente preocupante. E nós vamos sempre lutar para que as instituições sejam mantidas na democracia”, argumentou.
No Senado, o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), evitou entrar na discussão. Ele foi cobrado pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição, a tomar uma atitude. “A democracia exige defesa e retaliação ao ocorrido”, postou.
O senador Rogério Carvalho (SE) também se manifestou via Twitter. “Os líderes das instituições democráticas precisam se posicionar de forma clara às inferências, se comprovadas, do presidente da República contra o Congresso. Como líder do PT no Senado, estamos alinhados a todas as forças contra este crime de responsabilidade. #ImpeachmentBolsonaro”, postou.
O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), ressaltou que é preciso levar em consideração a explicação do presidente. “Não estou dizendo que não desgasta (a relação do Executivo com o parlamento), mas, quando ele declarou que divulgou o vídeo a um grupo restrito de seguidores, e fez a observação sobre não tumultuar a República (veja reportagem na página ao lado), a gente deve retomar a fala dele na semana passada, quando exaltou a necessidade de respeito, interdependência e fortalecimento dos poderes democráticos”, rebateu.
Rusgas
Na semana passada, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, deixou em evidência as rusgas com o Congresso. O militar disse que o parlamento “chantageia” o governo. A crítica se referia à insatisfação com um acordo entre parlamentares e o general Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo, sobre o controle da execução de emendas ao Orçamento.
Ontem, Heleno usou as redes sociais para tentar se afastar de vinculação a manifestações. “Atenção, estão usando meu nome, indevidamente e sem meu conhecimento, para pedir apoio financeiro a empresários e amigos, em prol de propaganda e/ou de manifestações políticas. Alerto a todos que jamais faria isso ou autorizaria tal procedimento”, destacou.
A mesma reclamação foi feita pelo vice-presidente Hamilton Mourão: “Não autorizei o uso de minha imagem por ninguém, mas protestos fazem parte da democracia, que não precisa de pescadores de águas turvas para defendê-la”, escreveu no Twitter. “O presidente Jair Bolsonaro não atacou as instituições, que estão funcionando normalmente”, defendeu.
Bolsonaro voltou, ontem, a Brasília, após passar o carnaval no Guarujá (SP), mas não falou com a imprensa.
Regina Duarte adere à convocação
A atriz Regina Duarte, que ainda não assumiu o comando da Secretaria Especial de Cultura, usou suas redes sociais para endossar o chamamento à manifestação de 15 de março, em favor do governo e contra o Congresso e o STF: “15 de março. Gen Heleno Cap Bolsonaro. O Brasil é nosso. Não dos políticos de sempre. Nas ruas”, compartilhou.
“Não é mais possível adiar uma ação enérgica do parlamento para frear Bolsonaro, em defesa da democracia. (…) Se o Congresso não agir, pode ficar tarde demais”
Alessandro Molon, deputado
PSol recorre à procuradoria
O PSol protocolou, ontem, pedido de investigação contra o presidente Jair Bolsonaro na Procuradoria-Geral da República. A sigla solicita a Augusto Aras, comandante do Ministério Público, que abra investigação para punir o chefe do Executivo por divulgar vídeo pelo WhatsApp convocando manifestantes para atos antiCongresso.A sigla pede a Aras que abra investigação para autuar e responsabilizar “Bolsonaro e seus aliados que também estejam convocando a população para atacar a democracia”. “Não restam dúvidas de que os representantes do atual governo, especialmente o presidente da República, não possuem qualquer apreço pela democracia e sequer reconhecem ou compreendem o papel de instituições, como o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal, para a consolidação do Estado democrático de direito”, destacou o partido. O PSol cobra ainda que sejam apurados a origem, o financiamento e a produção do vídeo divulgado por Bolsonaro.
Eduardo e a bomba H no Congresso
O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) publicou, no Twitter, um questionamento insinuando que um ataque ao parlamento não seria lamentado pela população. “Se houvesse uma bomba H (de hidrogênio) no Congresso, você realmente acha que o povo choraria?”, escreveu. A pergunta foi feita à jornalista Vera Magalhães, do jornal O Estado de S. Paulo, que publicou um vídeo do presidente Jair Bolsonaro — em entrevista ao Canal Livre, em novembro de 2017 — em que ele diz: “Se hoje, por exemplo, caísse uma bomba H no parlamento, pode ter certeza de uma coisa: haveria festa no Brasil. Então, o parlamento, como se encontrava e como se encontra, é lamentável, mas nós temos que governar com ele”. Vera Magalhães tem sido alvo de ataques na internet desde que revelou que Jair Bolsonaro compartilhou vídeo que convoca a população para manifestações contra o Congresso. Uma conta falsa em nome da jornalista foi criada no WhatsApp e mensagens fraudadas foram distribuídas em outras redes sociais.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.