Politica

Hora do duelo no Orçamento

Após críticas do Executivo ao Parlamento, recomeça a negociação em torno da participação do governo para liberar recursos de emendas. Reunião de líderes no Senado vai dizer se acordo é possível

Correio Braziliense
postado em 02/03/2020 04:04
Reunião da Comissão Mista de Orçamento: briga entre Planalto e Congresso envolve R$ 46 bilhões em emendas

Na semana de regresso do carnaval, uma das tarefas importantes de deputados e senadores será retomar a análise de vetos do presidente Jair Bolsonaro a trechos de leis sancionadas recentemente. O mais polêmico deles, que motivou a última crise entre Executivo e Legislativo, levanta novamente a discussão sobre os limites do Orçamento impositivo, regra criada para obrigar o governo a empenhar emendas parlamentares. O assunto deve ser retomado amanhã, em sessão conjunta marcada pelo presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Os parlamentares podem derrubar ou manter um veto parcial do presidente à Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2020. A norma aprovada no ano passado reduz participação do governo na distribuição de R$ 46 bilhões em emendas de comissões permanentes e nas propostas do relator da LDO. Pela regra atual, a ordem de execução de R$ 16 bilhões seria decidida pelos colegiados e a dos outros R$ 30 bilhões, pelo relator, o deputado Domingos Neto (PSD).

Se o Parlamento derrubar o veto, a aplicação do dinheiro vai ficar a critério dos parlamentares. Esse predomínio no controle do Orçamento é pano de fundo da crise entre o Planalto e o Congresso. Antes do carnaval, os dois poderes pareciam ter chegado a um consenso. Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e Alcolumbre concordaram em derrubar apenas parte do veto, para minimizar as perdas, após conversa com o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos. Assim, seria possível manter uma parcela dos recursos geridos pelo relator sob responsabilidade do Executivo — o que equivaleria a cerca de R$ 11 bilhões, que seriam destinados a gastos discricionários, como investimentos em infraestrutura. Em troca, cairia a possibilidade de punição do gestor que não cumprisse o prazo de 90 dias para a execução dos valores. A proposta foi negociada, inclusive, com o ministro da Economia, Paulo Guedes.

Mas o acordo não foi adiante. Alguns líderes partidários — do PSL, da Rede e do Podemos — não concordaram com os termos estabelecidos e impediram a votação, na última sessão conjunta, em 12 de fevereiro. Sem conseguir avançar nas negociações, Alcolumbre adiou as tratativas para depois do carnaval. Até amanhã, antes da sessão plenária, ele se reunirá com líderes partidários para definir os próximos passos.

Com o fim do feriado, a situação está ainda mais incerta do que antes. Parte da equipe econômica propunha aumentar a parte gerida pelos ministérios, mas a acusação do general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, de que o Parlamento chantageia o governo abalou a relação entre o Executivo e o Legislativo e comprometeu as negociações. O compartilhamento de vídeos, por parte do presidente Bolsonaro, convocando para manifestações no dia 15 contra o Congresso e o Supremo piorou ainda mais o ambiente na Praça dos Três Poderes.

Risco


As declarações agressivas e os atos do presidente nas redes sociais constituem, na avaliação de especialistas, uma estratégia para compensar as dificuldades na negociação orçamentária com o Parlamento. A expectativa do presidente é contar com a pressão popular para constranger o Congresso e manter integralmente o veto às alterações da LDO. “Sem base aliada, não resta outra alternativa a não ser apelar, de alguma forma, a esse tipo de manobra. O presidente recorreu às ruas porque viu nessa estratégia um último recurso, o jeito de conseguir emplacar a ideia. Ele não tem perfil de confrontar e articular, prefere sair a público e inflamar as reações”, avalia o cientista político Leandro Gabiati, diretor da consultoria Dominium.

O especialista acredita que a melhor estratégia do Congresso, diante da ofensiva, deve ser esperar para analisar o veto depois da manifestação apoiada por Bolsonaro, em 15 de março, mas sem paralisar o trabalho enquanto isso. “Votar antes pode ser um risco, porque, se não mantiverem o veto, a manifestação pode ser maior. O importante é que, enquanto esperam, os parlamentares mantenham a agenda, que é bem ampla. Tem muita pauta importante que deve avançar e, com isso, o Congresso mostra que está, sim, trabalhando”, explica Gabiati. Na lista, estão reforma tributária, autonomia do Banco Central e prisão em segunda instância.

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