Correio Braziliense
postado em 09/03/2020 18:05
O Ministério Público Federal deu cinco dias para que o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, esclareça os critérios de concessão do Bolsa FamÃlia. O pedido de informações foi feito após o Broadcast (sistema de notÃcias em tempo real do Grupo Estado) revelar que a região Nordeste ficou com apenas 3% das famÃlias contempladas em janeiro deste ano, embora a região tenha o maior número de famÃlias em situação de pobreza e extrema pobreza na fila do programa. Enquanto isso, Sul e Sudeste foram priorizadas e receberam 75% das novas concessões.
A solicitação foi feita por meio de ofÃcio assinado pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) na última sexta-feira, 6. A Procuradoria da República da Bahia também assina o documento. Caso o ministro não responda no prazo de cinco dias, poderá responder judicialmente. Procurada, a pasta ainda não se posicionou sobre o tema.
No pedido de esclarecimentos, feito com base na reportagem do Broadcast, o MPF solicita acesso a dados sobre a quantidade de novos benefÃcios do programa Bolsa FamÃlia concedidos mês a mês e por Estado desde janeiro de 2019.
O MPF também solicita que Onyx indique os critérios e conjunto de indicadores sociais utilizados pela pasta para estabelecer as situações de vulnerabilidade social e econômica utilizados na seleção de beneficiários. A procuradoria pediu ainda informações sobre a cobertura do programa Bolsa FamÃlia por Estado.
"No caso da indisponibilidade orçamentária eventual para expandir o programa no ritmo necessário para alcançar novas famÃlias em situação de pobreza e extrema pobreza, os critérios para priorização na concessão dos benefÃcios devem ser claros e lÃcitos, não havendo qualquer possibilidade de preferências ou perseguições polÃticas", destaca a Procuradoria.
Como mostrou a reportagem, antes de ter sua fatia nas concessões do Bolsa FamÃlia reduzida a 3% em janeiro de 2020, o Nordeste vinha respondendo por 35% a 39% dos novos benefÃcios ao longo de 2019. A queda na participação da região ocorreu justamente em janeiro, mês de maior liberação de pedidos após sete meses de freio no programa social.
Em fevereiro, quando houve novo freio nas concessões, o Nordeste voltou a responder por uma fatia maior de novos benefÃcios: 39,5%. Nesse mês, foram apenas 4,8 mil novos contemplados, 1,9 mil deles nordestinos.
Nas eleições de 2018, a Região Nordeste foi a única que votou majoritariamente no candidato do PT, Fernando Haddad. No segundo turno, o petista teve 69,7% dos votos válidos, ante 30,3% de Bolsonaro. Nas demais regiões, o atual presidente foi o vencedor. No Sul, conseguiu a maior vantagem: 68,3% ante 31,7% de Haddad.
"Embora pareça inconcebÃvel que o Governo Federal esteja deliberadamente preterindo a região Nordeste em um programa de transferência de renda destinado a erradicar a pobreza, essa hipótese não pode ser prontamente descartada", afirma o MPF. O órgão lembra que, sob a atual gestão, o Nordeste também ficou para trás na concessão de novos empréstimos pela Caixa, como revelou o Broadcast em julho do ano passado. A Procuradoria cita ainda declarações do presidente da República, também em julho de 2019, "sugerindo uma possÃvel perseguição aos Estados da região, por questões polÃticas".
Na última sexta, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), tido como apoiador da agenda de reformas do governo, publicou um duro posicionamento nas redes sociais alertando que a menor concessão de benefÃcios do Bolsa FamÃlia para o Nordeste pode significar o rompimento da região com o governo federal. A bancada do Nordeste tem 151 deputados e 27 senadores.
Critérios
No ofÃcio, MPF lembra que um decreto de 2004 prevê que as famÃlias elegÃveis e identificadas no Cadastro Único poderão ser selecionadas a partir de um conjunto de indicadores sociais capazes de estabelecer as situações de vulnerabilidade social e econômica, que deve ser divulgado pelo governo. O Nordeste tem 1,314 milhão de famÃlias em situação de pobreza ou extrema pobreza ainda sem receber o benefÃcio, 36,8% do total de 3,57 milhões de famÃlias nessa condição no PaÃs.
Segundo a Procuradoria, portaria de 2009 editada pelo então Ministério do Desenvolvimento Social prevê outras regras em caso de necessidade de priorização do benefÃcio, levando em conta os Ãndices de cobertura do programa em relação à s estimativas de famÃlias em situação de pobreza.
Em meio à polêmica, no entanto, os critérios de concessão também estão na berlinda. Isso porque a estimativa em questão leva em conta o Censo Demográfico de 2010 - que já não retrata fielmente a renda das famÃlias nas regiões, sobretudo num momento após crise econômica. Com isso, a cobertura nas regiões poderia estar superestimada nos Estados mais pobres, que já contam com maior número de benefÃcios concedidos, mas ainda têm uma longa fila que não é levada em consideração nas novas concessões.
O ofÃcio esclarece que a existência de famÃlias em situação de pobreza ou extrema pobreza cadastradas no CadÚnico e sem receber os benefÃcios deve sempre ser transitória, apenas pelo tempo estritamente necessário para trâmite burocrático e, eventualmente, para obtenção de disponibilidade orçamentária.
"O Estado é obrigado a atender todas as famÃlias em situação de pobreza e extrema pobreza com o Bolsa FamÃlia, desenvolvendo ações para ampliar o cadastro, especialmente para alcançar locais mais pobres e de difÃcil acesso, concedendo os benefÃcios e garantindo recursos para seu pagamento", diz o documento.
Segundo o MPF, essa obrigação vinha sendo cumprida em 2017 e 2018, com a fila de espera pelo benefÃcio "constantemente sendo zerada".
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.