Politica

Do plenário aos tribunais

Após a derrota no Congresso que representa uma despesa adicional de R$ 20 bilhões no Orçamento, governo pretende recorrer ao Supremo e ao TCU para suspender o aumento do BPC. Major Olímpio critica falta de articulação política

Correio Braziliense
postado em 13/03/2020 04:14
Major Olímpio (SP), líder do PSL no Senado: %u201CO governo foi relapso e incompetente na articulação%u201D


O ministro da Economia, Paulo Guedes, pretende recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) ou ao Tribunal de Contas da União (TCU), para tentar rever a derrota do Executivo no Congresso com a derrubada do veto ao aumento do teto para acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC). “Vamos ao Supremo e vamos ao Tribunal de Contas da União, que tem já casos prévios argumentando pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Não se pode criar R$ 20 bilhões de despesa sem dizer de onde vêm os recursos. Não podemos”, afirmou Guedes.

O ministro reconheceu que o resultado da votação foi uma derrota do Executivo diante da polarização entre os Poderes nos últimos dias. “O governo, de um lado, mandou sinais. O Congresso não gostou e mostrou que também pode fazer coisas que não são construtivas”, afirmou. Na quarta-feira, o Congresso derrubou o veto presidencial ao Projeto de Lei 3.055/97, do Senado, que aumenta de R$ 261,25 para meio salário mínimo (R$ 522,50) o limite da renda familiar mensal per capita para o acesso de idosos e pessoas com deficiência terem acesso ao BPC. Segundo o secretário executivo da pasta, Marcelo Guaranys, as ações estão a cargo da Advocacia-Geral da União (AGU), mas o processo só poderá ser protocolado após a promulgação da lei pelo presidente Jair Bolsonaro.

O secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, contou que o governo também planeja usar um acórdão antigo do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre renegociação de dívidas agrícolas de 2018 para não arcar com essa despesa em 2020. “Se a gente criasse uma despesa nova de R$ 20 bilhões, ficaria muito difícil cumprir com o teto de gastos. Temos que checar isso e alinhar com o TCU”, afirmou. Pelas contas do secretário especial de Previdência, Bruno Bianco, o custo dessa decisão pode chegar a R$ 217 bilhões em 10 anos para os cofres públicos. Esse valor, praticamente, reduz o impacto da reforma da Previdência, aprovada no ano passado, para menos de R$ 600 bilhões em uma década.

Falha na articulação
Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), devem unir esforços com o ministro da Economia, Paulo Guedes, na tentativa de reverter a mudança feita pelos parlamentares nas regras de concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC). Após a derrubada do veto, Maia afirmou que a decisão “mais atrapalha do que ajuda” e reforçou que “vai afetar a economia brasileira”.

O líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), favorável à flexibilização do critério de renda, colocou o prejuízo na conta do governo — que, segundo ele, agora tenta barrar a mudança, mas, na hora da votação, não estava preocupado. “O governo foi relapso e incompetente na articulação. Tem toda a responsabilidade no resultado. Largou a votação nas mãos de Deus. Não tinha ninguém tentando conversar sobre o assunto, nem assessor, nem nota técnica, nada”, conta.

O senador disse que sequer foi procurado por integrantes do Executivo para discutir o assunto, apesar do impacto bilionário nos cofres públicos. “Não conversaram comigo em nenhum momento. Se consideram que não precisam dos nossos votos, vão continuar tendo problemas aqui”, afirmou. Ele acredita que, se Guedes tentar reverter a derrota no Congresso, “vai tomar outra bordoada”.

Parlamentares que votaram pela derrubada do veto discordam do argumento. Eles afirmam que os debates atuais sobre a reforma tributária podem ajudar a resolver o impasse, com a criação, por exemplo, de imposto sobre grandes fortunas. “O Brasil é um dos únicos países do mundo que não cobra sobre lucros e dividendos. Sem contar renúncias fiscais, assunto que o governo não quer discutir”, disse o deputado Glauber Braga (PSol-RJ).

Para o deputado do PSol, “há muitas possibilidades para que o Estado faça frente a despesas com política pública”. “Não é questão de onde tirar recursos, mas de definição de prioridades”, afirma. Derrubar a mudança aprovada pelos parlamentares, na visão de Braga, desrespeita o Congresso e prejudica os mais pobres. “É um absurdo completo”, disse. A deputada federal Sâmia Bomfim (PSol-SP), que também votou pela derrubada do veto, concorda. “Não se trata de uma decisão de caridade, mas a possibilidade para que essas pessoas aumentem a renda e possam consumir mais”, disse.

Questionada se a derrubada do veto foi uma resposta dos parlamentares às ações do presidente Jair Bolsonaro, Sâmia disse acreditar que essa tenha sido uma das motivações. “Acho que existe uma manifestação do Congresso de dar uma resposta às ações autoritárias do presidente”, disse. A parlamentar acredita que, inclusive, Maia não tentou evitar a derrubada do veto e a derrota do governo. “Ele sempre recorre ao encerramento da votação quando não quer que a matéria seja votada. Mas o plenário se encheu e foi possível derrubar o veto”, afirmou.

Nos cálculos do governo, a ampliação do BPC vai aumentar a fila de requerimentos para a concessão de benefícios do INSS. Atualmente há 1,2 milhão de pedidos represados há mais de 45 dias, entre pedidos de aposentadorias, pensões e auxílios. Esse contingente pode chegar a 1,6 milhão de pessoas, que entrarão na lista de espera do INSS. “Com o possível aumento de requerimentos, tende a aumentar a fila de pedidos do órgão”, disse a autarquia, em nota.

O INSS ressaltou que, embora a decisão amplie o acesso ao benefício, não facilita o processo de análise. “Vale destacar que o BPC é um auxílio de concessão complexa, que envolve vários procedimentos”, afirma o órgão, em nota. Pessoas com deficiência, por exemplo, precisam cumprir pelo menos três etapas: verificação da renda, avaliação social e perícia médica para comprovação da deficiência. 


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