Politica

Racha federativo

Hostilidades entre o Planalto e os governadores complicam ainda mais a crise da Covid-19, que exige maior coordenação entre a União e os estados. Além das divergências sobre as medidas preventivas, um ponto crítico é a velocidade na liberação de recursos

Correio Braziliense
postado em 29/03/2020 04:03
Doria durante bate-boca com Bolsonaro em videoconferência: governadores estão descolados das ações promovidas pelo Planalto

O Brasil enfrenta a pandemia do novo coronavírus em meio a uma disputa que tem sido levada para o campo político. O presidente Jair Bolsonaro, que por diversas vezes chamou o vírus de “gripezinha” e “resfriadinho”, entrou em verdadeiro embate com os governadores que decretaram calamidade pública e tomaram medidas drásticas, como fechamentos de comércios. Em meio a isso, os estados aguardam os auxílios já anunciados pelo governo federal.

Bolsonaro entrou em conflito frontal com os governadores que impuseram medidas restritivas para conter o avanço do coronavírus. O presidente afirmou que alguns fazem “demagogia barata” e, na última sexta-feira, levantou suspeita sobre os números de pessoas infectadas e mortas nos estados em decorrência do vírus, falando que haveria um “uso político” de números. O presidente ressaltou não acreditar nos números de São Paulo, que oficialmente já tem1.406 pessoas infectadas e 84 mortas, sendo o estado com mais casos. É com o governador de SP, João Doria (PSDB), que tem acontecido as maiores brigas do presidente. Na última quarta-feira, houve um bate-boca entre os dois, quando Doria lamentou o pronunciamento do presidente feito no dia anterior. Bolsonaro, por sua vez, disse que em 2022, ano de eleições para a Presidência, Doria poderá “destilar todo o ódio e demagogia”.

Apesar das críticas, Doria e outros governadores têm mantido as medidas de distanciamento social, com fechamento de comércios, e continuam pedindo para que a população fique em casa. Em São Paulo, as definições anunciadas pelo governo foram mantidas. Na última sexta-feira, Doria anunciou o repasse de R$ 50 milhões para a capital para financiar hospitais de campanha. Um dos hospitais está sendo instalado no estádio do Pacaembu.

No Rio de Janeiro, o governador Wilson Witzel (PSC) afirmou que aguardava ações concretas por parte do governo federal, em auxílio à economia do estado durante os períodos de restrições, até a próxima segunda-feira (30). Witzel reiterou que a o isolamento se trata de uma recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do próprio ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e disse estar surpreso com a mudança de postura por parte do ministro, que se alinhou ao discurso do presidente em relação ao fim do isolamento social.

A discrepância do discurso de Bolsonaro com as orientações de autoridades, como a própria, provocou rompimento com o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, até então grande aliado do presidente. Caiado, que é médico, concedeu uma entrevista coletiva um dia após o pronunciamento de Bolsonaro dizendo que as medidas restritivas determinadas pelo estado continuavam valendo. O estado teve uma morte confirmada nesta semana e 49 casos de infectados. Foi aberto nesta semana um hospital de campanha na capital, Goiânia.

Dinheiro federal

 
Em nova carta divulgada na última sexta-feira, os nove governadores do Nordeste afirmaram que continuarão guiando suas ações em relação ao coronavírus com base na ciência e na experiência mundial. Os gestores disseram que existem uma “ausência de efetiva coordenação nacional” e manifestaram “profunda indignação com a postura do governo federal, que contraria a orientação de entidades de reconhecida respeitabilidade, como a OMS”.

A região possui 642 casos confirmados e sete mortes, sendo cinco em Pernambuco, quatro no Ceará e uma no Piauí. A carta foi redigida após videoconferência entre os gestores. Na última quarta-feira (25), após pronunciamento do presidente em cadeia nacional, eles já haviam divulgado uma carta lamentando o comportamento de Bolsonaro. O governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), divulgou um vídeo no qual fala que tem feito o possível para cuidar da saúde e da vida das pessoas.

“Mas só o governo federal pode emitir dinheiro e realizar programas de renda para os trabalhadores. é assim no mundo, não faz sentido aqui o governo federal procurar briga com os governadores e querer colocar as pessoas em risco sem assumir ações efetivas, dedicadas ao social e à economia”, disse.

Outros gestores, entretanto, aproveitaram os discursos de Bolsonaro para afrouxar as medidas de quarentena. Em Santa Catarina, por exemplo, o governador Carlos Moisés (PSL) anunciou que a partir da próxima semana serão retomadas as atividades que estavam paradas. Ficaram suspensas até o dia 7 somente o transporte coletivo de passageiros e o ingresso de transporte interestadual e internacional de passageiros. O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), decidiu permitir o funcionamento de lotéricas, lojas de conveniência e minimercados em postos de combustíveis.

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