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Bolsonaro distorce fala da OMS e volta a defender reabertura de comércios

Para Bolsonaro, diretor-geral da OMS defendeu o trabalho de informais. Fala de Ghebreyesus, porém, defendeu isolamento e auxílio financeiro a trabalhadores mais pobres

O presidente Jair Bolsonaro afirmou, nesta terça-feira (31/3), que ele e a Organização Mundial da Saúde (OMS) estão em alinhamento com relação à forma de enfrentar a pandemia de Covid-19. De acordo com o presidente, o diretor-geral do organismo internacional, Tedros Adhanom Ghebreyesus, defendeu na segunda-feira (30/3) a necessidade de vários trabalhadores, especialmente os informais, permanecerem ativos durante a pandemia.

Porém, Ghebreyesus citou esses trabalhadores para ressaltar a importância de ajudá-los neste momento em que o isolamento social se faz necessário. "Temos de ver não apenas o impacto no PIB, mas na vida dos indivíduos", ressaltou o diretor-geral, elogiando os países que têm adotado medidas fiscais para se contrapor à piora econômica, por exemplo, prometendo pagamentos diretos aos trabalhadores mais afetados e concedendo empréstimos a empresas. 


Bolsonaro fez uma interpretação particular da fala de Ghebreyesus: "O que ele disse praticamente (é que), em especial, os informais têm que trabalhar. O que acontece? Nós temos dois problemas: o vírus e o desemprego, que não podem ser dissociados. Temos que atacar (os dois) juntos", afirmou.

"Quando comecei a falar isso, entraram até com um processo no Tribunal Penal Internacional contra mim me chamando de genocida. Eu sou um genocida porque defendendo o direito de você levar um prato de comida para casa. Ele estava um pouco constrangido parece, mas falou a verdade, a gente conhece ele com maior profundidade do passado, mas achei excepcional a palavras dele e meus parabéns: OMS se associa ao presidente Bolsonaro”, completou Bolsonaro, que planeja um novo proncunciamento em cadeia nacional na noite desta terça-feira.

 
O que disse o diretor da OMS

Na entrevista que concedeu na segunda-feira, o diretor-geral da OMS ressaltou que o isolamento social é uma medida importante para dar tempo aos sistemas de saúde se organizarem, mas que os trabalhadores mais pobres, sem renda garantida, não podem ser ignorados, merecendo ajuda.

"No assunto lockdown, talvez alguns países já tenham tomado medidas para o distanciamento físico, fechando escolas e prevenindo-se de aglomerações e assim por diante. Isso pode comprar tempo, mas cada país é diferente. Alguns países têm um sistema de auxílio social forte. E alguns países não têm. Eu sou da África, como vocês sabem. Sou da África e sei que muita gente precisa trabalhar cada dia para ganhar o pão. E governos devem levar essa população em conta. Se estamos limitando os movimentos, o que vai acontecer com essas pessoas que precisam trabalhar diariamente? Então, cada país, baseado em sua situação, deveria responder a essa questão. Não estamos olhando como 'um impacto econômico num país', ou 'a perda média do PIB, ou às 'repercussões econômicas'. Precisamos também ver o que isso significa para o indivíduo na rua. Venho de uma família pobre e sei o que significa sempre se preocupar com o pão de cada dia. E isso precisa ser levado em conta. Porque cada indivíduo importa. E temos que levar em conta como cada indivíduo é afetado por nossas ações. É isso que estamos dizendo", disse.

 

Ghebreyesus também voltou a defender que os governos garantam condições aos trabalhadores mais prejudicados pela crise, que precisam de comida, saneamento e outros serviços essenciais. 

 

"Entendemos que muitos países estão implementando medidas que restringem a movimentação das pessoas. Ao implementar essas medidas, é vital respeitar a dignidade e o bem-estar de todos. É também importante que os governos mantenham a população informada sobre a duração prevista dessas medidas e que dê suporte aos mais velhos, aos refugiados e a outros grupos vulneráveis. Os governos precisam garantir o bem-estar das pessoas que perderam a fonte de renda e que estão necessitando desesperadamente de alimentos, saneamento e outros serviços essenciais. Os países devem trabalhar de mãos dadas com as comunidades para construir confiança e apoiar a resistência e a saúde mental", disse. 

 

Em outro trecho, ele ressaltou: "É vital respeitar a dignidade do próximo. É vital que os governos se mantenham informados e apoiem o isolamento", concluiu.

 

OMS reforça posicionamento

Na tarde desta terça-feira (31/3), Ghebreyesus foi às redes sociais para esclarecer seu posicionamento em duas mensagens por meio do Twitter. 

 

"Pessoas sem fonte de renda regular ou sem qualquer reserva financeira merecem políticas sociais que garantam a dignidade e permitam que elas cumpram as medidas de saúde pública para a Covid-19 recomendadas pelas autoridades nacionais de saúde e pela OMS", escreveu o diretor-geral da OMS.

 

"Eu cresci pobre e entendo essa realidade. Convoco os países a desenvolverem políticas que forneçam proteção econômica às pessoas que não possam receber ou trabalhar devido à pandemia da Covid-19. Solidariedade", concluiu.