Correio Braziliense
postado em 12/04/2020 04:20
Quem vê o ministro Luiz Henrique Mandetta diariamente com colete do Sistema Único de Saúde (SUS) e camisa branca arregaçando as mangas no comando da guerra do Brasil contra a pandemia do novo coronavírus, talvez não saiba que o futebol ajudou na formação do ortopedista sul-mato-grossense de 55 anos — que também trava batalha contra o “fogo amigo” dentro do próprio governo. Contestado pelo ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni, pelo deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) — flagrados conspirando contra Mandetta em reportagem da CNN Brasil; e ameaçado de demissão mais de uma vez pelo presidente da República, Jair Bolsonaro; ele luta não somente para se manter no cargo, mas pelas convicções que defende na luta pela proteção à vida. Nascido em Campo Grande, ele foi médico da comissão técnica do time do coração dele — o Esporte Clube Comercial — nos anos 1990, um dos períodos dourados da agremiação de 77 anos. Antes de se formar em medicina, fez até papel de gandula no Estádio Pedro Pedrossian, o Morenão, a principal arena do estado.
Pé-quente, Mandetta faz parte da história do time. Conquistou títulos estaduais, saiu na foto do pôster e participou da melhor campanha da equipe na Copa do Brasil. Em 1994, o Comercial chegou às quartas de final do torneio nacional. Eliminou o Paysandu na primeira fase, superou o Kaburé nas oitavas e caiu nas quartas contra Linhares-ES. Se avançasse, duelaria com o Ceará, que decidiu o título daquele ano com o Grêmio.
O Correio conversou com cinco personagens que trabalharam com Mandetta na diretoria, comissão técnica e no time do Comercial na passagem do médico pelo clube. Anderson Souza Gomes, o Tainha, 47, é um deles. O atacante só entrou em campo em uma final do campeonato sul-matogrossense porque o atual ministro da Saúde fez a diferença. “Ele foi uma pessoa muito importante na minha carreira. Tive uma lesão muscular, e ele me tratou na época. Rompi os dois adutores de uma vez. Ele era médico do Comercial, e só joguei a minha primeira final de um Campeonato Estadual graças à competência profissional dele. Com 15 dias, eu estava jogando novamente. E assim ele está agindo como ministro da Saúde. Ele tem meu respeito”, diz Tainha, um dos maiores artilheiros da história do futebol do Mato Grosso do Sul.
Meia-atacante do Comercial nos anos 1990, Nelson Barros da Silva, 49 anos, conhecido em Campo Grande como Chaveirinho, lembra bem da contribuição de Mandetta na comissão técnica. “Era um jovem médico torcedor comercialino. A família dele sempre foi muito ligada ao time. Qualquer problema de contusão no jogo ou de doença da família, ele mandava a gente ir ao consultório dele. E não cobrava”, testemunha o jogador aposentado.
Chaveirinho lembra que Mandetta era o médico do Comercial na histórica campanha de 1994 na Copa do Brasil. “Um cara muito sério, educado, sabia lidar com atletas. Ele era uma novidade para a gente e nós, para ele, mas nos ajudou muito, até mesmo fora da área dele. Ele é ortopedista, mas contribuiu muito com a gente em outras especialidades”, conta.
Botafoguense
Seu Mauro Belarmino, 63, ficou próximo de Mandetta quando precisou salvar a carreira de uma jovem promessa. “Eu trabalhava nas divisões de base e sempre tive boa relação com ele. Mandetta era o médico do Comercial. Uma vez, nós fomos disputar a Taça Rio e um menino nosso sofreu uma lesão grave. Procuramos médicos no Rio para atendê-lo, mas não conseguimos. Quando voltamos, o Mandetta atendeu o Alisson, operou e ele ainda jogou por uns 10 anos. Ele é um baita ser humano, um dos caras mais corretos”, lembra.
Rubisvaldo Pereira de Souza, o Rubão, 68, revela outra faceta da trajetória de Mandetta no esporte. “Ele e o primo (Marquinhos Trad) foram gandulas no Morenão (principal estádio do Mato Grosso do Sul) na adolescência. Depois, lembro-me dele como médico do Comercial. Atendia de graça no consultório dele e no hospital Santa Casa. O pai também era ortopedista e ajudou muito o clube, sempre foi muito ligado ao time”, conta Rubão.
O Comercial não é a única paixão de Mandetta. “Ele também torce pelo Botafogo. Acompanhou muito o time quando morou no Rio (formou-se em medicina na Universidade Gama Filho)”, diz ao blog o narrador Arthur Mário, da Rádio Hora 92.3 FM. “Recentemente, ele andava triste com a situação dos clubes do Mato Grosso do Sul e falou que uma saída para o futebol daqui crescer seria fundir o Comercial e o Operário”, revela o ex-presidente do Comercial, referindo-se aos dois clubes mais populares do estado.
Arthur Mário conta, ainda, que Mandetta é fã do modelo esportivo dos Estados Unidos, onde os atletas começam a ser descobertos nas escolas. “Ele fez especialização em ortopedia em Atlanta (Scottish Rite Hospital for Children), na Geórgia, e viu de perto como funciona”, diz.
Embora tenha moral no Comercial, Mandetta abre mão de contrapartidas aos serviços prestados ao clube. Todos os entrevistados relatam que ele comparece como torcedor nas partidas do Comercial. Senta-se no meio da galera quando vai a Campo Grande. Não abre mão de comprar ingresso e ir ao estádio como popular, de camisa vermelha do time, bermudão e mocassim. Quando a agenda permitia, batia o ponto no Comerário — o principal clássico estadual. No ano passado, foi pé-frio. O Operário derrotou o Comercial por 3 x 1. Ele estava lá.
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