Correio Braziliense
postado em 14/04/2020 04:04
Em parecer que deve ser enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), o procurador-geral da República, Augusto Aras, defende que Jair Bolsonaro tem poder para decidir sobre as medidas de isolamento social. No documento, o chefe do Ministério Público aponta que o presidente da República pode avaliar “o momento oportuno” para abrandar ou intensificar as ações adotadas no combate a pandemia do novo coronavírus. Ao mesmo tempo, a PGR rejeitou ações contra a campanha “O Brasil não pode parar”, que chegou a ser ensaiada pelo Palácio do Planalto para solicitar a abertura do comércio em todo o país.
Desde os primeiros casos da Covid-19 no Brasil, o presidente tem travado um cabo de guerra com os governadores. Enquanto os gestores de estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e Distrito Federal têm determinado fechamento do comércio e a restrição na circulação de pessoas, Bolsonaro tem demonstrado preocupações com os resultados econômicos do isolamento social. Ele defende que a quarentena seja restrita somente às pessoas que fazem parte de grupos de risco, como idosos e portadores de doenças crônicas. As decisões, tanto estaduais quanto federais, têm sido judicializadas.
No STF, Bolsonaro vem sofrendo repetidas derrotas. O ministro Alexandre de Moraes afirmou que os estados e municípios têm autonomia para tomar decisões sanitárias, independentemente do posicionamento do governo federal. No entanto, a palavra final sobre isso será do plenário da Corte, que se reúne amanhã para julgar ações voltadas para a situação da pandemia no país.
Para Aras, a situação é nova e cabe ao presidente tomar as decisões, levando em conta a situação econômica e estrutura de saúde do país. “As incertezas que cercam o enfrentamento, por todos os países, da epidemia de Covid-19 não permitem um juízo seguro quanto ao acerto ou desacerto de maior ou menor medida de isolamento social, certo que dependem de diversos cenários não só faticamente instáveis, mas geograficamente distintos, tendo em conta a dimensão continental do Brasil”, salientou o chefe da PGR.
No dia 26 do mês passado, um grupo de procuradores apresentou pedido para que o CHEFE DA pgr impusesse ao presidente a regra para que seus discursos fossem baseados nas orientações de saúde de entidades nacionais e internacionais que atuam no setor. A solicitação foi negada.
Ontem, Aras também deu parecer contrário a uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), movida pelo partido Rede Sustentabilidade, que pede a suspensão da campanha com o slogan “O Brasil não pode parar”. Em seu relatório, afirma que a sigla não conseguiu provar a existência da campanha.
“O fato é que, mesmo para os que afirmam haver existido o aludido ato, teria subsistido por breve período e, ao final, sido retirado de circulação, o que levaria, de toda sorte, a uma perda superveniente do objeto apontado nesta ADPF”, resumiu.
Sem alinhamento
Em entrevista ao jornalista José Luiz Datena, da Rádio Bandeirantes, Aras rebateu críticas de que tem se alinhado ao presidente. “O procurador geral da República não é auxiliar do presidente. O procurador geral da República é a única autoridade indicada pelo presidente da República, aprovada pelo Senado, que tem biênio com data para começar e para acabar, tem garantias constitucionais e não deve favor do ponto de vista de gratuidades a quem quer que seja, daí porque a minha posição é sempre nos limites estritos da lei”, afirmou.
Aras também explicou que não toma decisões com base em política, mas sim de maneira técnica. “O PGR pode dar início a uma grave questão social simplesmente saindo de seus limites constitucionais. Basta que ele comece a fazer política partidária”, disse. Ao ser questionado sobre o fato de o governador de São Paulo, João Dória, ter dito que poderia mandar prender cidadãos que desrespeitarem o isolamento social, se a epidemia se agravar, disse que existem limites que não podem ser ultrapassados.
“Na saúde pública, essa esfera é concorrente entre as três unidades federativas. À União, compete estabelecer regras gerais, e estados e municípios no âmbito de suas competências. Agora, repito, existem limites. Os limites para que governadores e prefeitos atuam concorrentemente com a União é o limite da Constituição, dos direitos e garantias fundamentais”, completou.
Prerrogativa “impensável”
O ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello considera "impensável" que avance na Corte parecer do procurador-geral da República, Augusto Aras, sobre a atuação da Presidência da República nas regras de distanciamento social para combate ao coronavírus. Para Aras, o presidente Jair Bolsonaro tem prerrogativas para relaxar as decisões tomadas pelos estados. "Vivemos em uma Federação. Os estados têm certa autonomia, e a legitimação para atos voltados à saúde é comum a todos, incluídos os municípios. Seria um ato despropositado sob o ângulo constitucional", afirmou o ministro.
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