Politica

Cheiro de demissão no ar

Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, assume divergência com Jair Bolsonaro sobre enfrentamento da pandemia e admite a possibilidade de exoneração. Ele diz esperar que presidente dê ao próximo titular da pasta as condições de trabalhar baseado na ciência

Correio Braziliense
postado em 16/04/2020 04:12
Mandetta, com Wanderson Oliveira, que teve o pedido de demissão negado: ministro revelou que recebeu ligações de colegas sondados para o cargo


É questão de tempo a demissão de Luiz Henrique Mandetta do posto de ministro da Saúde. Enquanto técnicos da pasta já sinalizam deixar o ministério, como o secretário de Vigilância em Saúde, Wanderson de Oliveira, que pediu demissão, mas foi convencido pelo chefe a seguir no cargo, o médico está de sobreaviso quanto à sua exoneração. Resta apenas o presidente Jair Bolsonaro escolher um substituto que tenha o respaldo da classe médica e, principalmente, siga a linha adotada por ele, sobretudo no que diz respeito à flexibilização das medidas de isolamento social, em vigor em alguns estados e municípios, para que a atividade comercial do país não pare por completo durante a pandemia.

Depois de flertar com a dispensa de Mandetta na segunda-feira da semana passada, Bolsonaro declarou, ontem, que vai dar um basta no mal-estar entre o Palácio do Planalto e o ministério. Segundo o presidente, já está na hora de virar a página e fazer com que o país siga em frente. “Pessoal, estou fazendo a minha parte. Resolveremos a questão da Saúde no Brasil para tocar o barco”, disse a apoiadores, na saída do Palácio da Alvorada.

O próprio Mandetta percebeu que já não há mais clima para continuar, após a última reunião do Conselho de Governo, na terça-feira, quando entendeu “claramente” que Bolsonaro quer um ministro mais próximo dos seus ideais e pediu aos demais comandantes de pastas que tivessem tranquilidade para escolher um novo nome. Ele, porém, voltou a frisar que não pedirá demissão. “Eu deixei muito claro aqui que deixo o Ministério da Saúde em três situações: quando o presidente não quiser mais o meu trabalho; se eventualmente eu pegar uma gripe dessa e tenha que ser afastado por forças além da minha vontade; e quando eu sentir que meu trabalho feito já não é mais necessário que seja continuado”, enfatizou, durante a entrevista coletiva de ontem no Palácio do Planalto.

Mandetta revelou já ter recebido ligações dos cotados para substituí-lo. “Alguns nomes que vão sendo assuntados ligam para mim e eu falo: ‘Venha, vamos trabalhar’. Eu não estou ministro por nada diferente do que do presidente. E ele claramente externa que quer um outro tipo de posição por parte do Ministério da Saúde, que eu, baseado no que nós recebemos, baseado em ciência, tenho esse caminho para oferecer”, destacou. “Fora desse caminho, tem de achar alternativas. E tem muitas alternativas. Gente muito boa, gente muito experiente”, comentou.

Colaboração
Em diversos momentos, Mandetta demonstrou resignação com a substituição, que deve ser feita ainda nesta semana. “O importante é que, seja lá quem o presidente colocar no Ministério da Saúde, que ele confie e dê as condições para que a pessoa possa trabalhar baseado na ciência, nos números, nas transparências dos casos, para que a sociedade, seus governadores e prefeitos tomem as melhores decisões”, declarou. Ele se colocou à disposição, e toda a sua equipe, para ajudar na transição à nova chefia. “Queremos dar total condição a quem venha trabalhar, não estamos aqui para dificultar a vida de absolutamente ninguém.”

Apesar de dizer que entende o desejo do presidente em adotar outra posição, como o isolamento vertical (pelo qual apenas idosos e doentes crônicos ficaram confinados), Mandetta fez críticas à medida e se opôs às opiniões do deputado Osmar Terra (MDB-RS), aliado de Bolsonaro. “Tem ex-secretários de Saúde que verbalizam diariamente que acham que o caminho é outro. O deputado Osmar Terra, por exemplo, todo dia ele fala: o caminho está errado. Existem pessoas que acreditam fielmente e criam essas teorias de negócio vertical, oblíquo, horizontal, não sei de onde vêm essas angulações, mas acreditam fielmente”, reprovou. Terra, que segue a mesma linha de raciocínio de Bolsonaro e já criticou Mandetta, é um dos mais cotados para comandar o Ministério da Saúde.

Exoneração rejeitada
O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, não aceitou a demissão do secretário de Vigilância em Saúde da pasta, Wanderson Oliveira, que chegou a enviar uma carta dizendo que se desligaria da função. Ele argumentou que deixaria o cargo devido à insegurança política sobre a permanência ou não de Mandetta à frente do ministério. Oliveira é considerado o homem de confiança do ministro e é apontado com um dos técnicos de maior reconhecimento na equipe. “Wanderson chegou a me mandar um negócio hoje (ontem), e eu mandei voltar do mesmo jeito que chegou”, disse Mandetta ao comentar o caso.

“Ele (Bolsonaro) claramente externa que quer um outro tipo de posição por parte do Ministério da Saúde, que, baseado no que nós recebemos, baseado em ciência, eu tenho esse caminho para oferecer. Fora desse caminho, tem que achar alternativas, e tem muitas alternativas, gente muito boa e experiente”

“Temos um conjunto de informações que nos levam a ter essa conduta de cautela. Parece que eu sou contra o presidente, e o presidente é contra mim. Não, são visões diferentes do mesmo problema. Se tivesse uma visão única, seria um problema muito fácil de solucionar”

Luiz Henrique Mandetta, ministro da Saúde


Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Tags