Politica

Perfil: deputado federal, Mandetta ganhou os holofotes como ministro

"Sem política, não se faz a condução de um ministério de tamanha complexidade", afirmou durante a coletiva de despedida nesta quinta-feira (16/4).

Correio Braziliense
postado em 16/04/2020 18:39
Médico ortopedista de profissão, o sul-mato-grossenses Luiz Henrique Mandetta, 55 anos, não deixa de zelar pela postura política. Mesmo ocupando uma cadeira na Câmara dos Deputados e exercendo cargos de confiança na saúde pública de Campo Grande, foi como titular do Ministério da Saúde, e em meio à crise da Covid-19, que ganhou os holofotes e alavancou, para além da imagem de técnico, seu destaque político e público. "Sem política, não se faz a condução de um ministério de tamanha complexidade", afirmou, durante a coletiva de despedida nesta quinta-feira (16/4). 

Não à toa já havia rumores de sua saída, ainda no fim de 2019, para entrar na corrida eleitoral municipal. Publicamente, Mandetta chegou a afastar a ideia de que se candidataria a prefeito, governador ou a cargos no Congresso. "Em 2022, estarei trabalhando com Bolsonaro", disse, ao abrir o Encontro Estadual de Vigilância em Saúde, em fevereiro deste ano. As divergências de ideias entre ele o presidente da República quanto à forma de lidar com a pandemia do Covid-19 no Brasil mudaram o rumo dos planos. 

Na semana passada, após contar com apoio de militares, técnicos da saúde, políticos e governantes estaduais, Mandetta postergou a canetada de Jair Bolsonaro. Além disso, o ministro teve forte apoio popular nas estratégias de distanciamento social, conquistando confiança e ultrapassando a liderança do próprio presidente frente à crise. O apelo social, que se revelou peça-chave nessa dinâmica, é também o que pode reverter em votos a visibilidade e notoriedade conquistada. 

Sem precisar assumir as responsabilidades no enfrentamento do coronavírus daqui para frente e tendo deixado um legado técnico e consolidado, Mandetta teria um caminho aberto para galgar novos rumos. "Podem ter certeza que, como cidadão, trabalharei em dobro pelo meu país, pela nação brasileira", afirmou, não usando a fala como palanque. No discurso de despedida, ele fez questão de agradecer desde a copeira terceirizada às lideranças dos demais poderes, incluindo Bolsonaro. "Pode ter certeza que eu também vou lutar no campo da saúde pública do Brasil e do mundo porque temos muito a dizer sobre a experiência magnífica de um país em desenvolvimento ter tido a coragem de escrever na Constituição que saúde é um direito de todos e dever do Estado", adiantou. 

Na política 


Nos bastidores, aliados apostam na força adquirida para disputar a candidatura a governador ou senador de Mato Grosso do Sul. Filiado ao DEM, precisaria articular as possibilidades já que, no estado, o MDB e o PSDB têm alternado o comando. Os movimentos avançam, já que, recentemente, a liderança nacional do DEM fez uma intervenção no diretório municipal de Campo Grande, seu reduto eleitoral, incluindo uma comissão local mais alinhada ao ministro.

Saiba Mais

Mandetta é amigo íntimo do também médico e governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), chefe político do partido. Até mesmo nas divergências em relação às recomendações contra a Covid-19, estão juntos fazendo frente ao até então aliado Bolsonaro. Foi Caiado quem articulou o nome de Mandetta para ministro e Bolsonaro concedeu o cargo, conhecendo o alinhamento ideológico do ortopedista. Isso porque, quando eram colegas na Câmara dos Deputados, o presidente e o ministro votaram juntos pelo impeachment de Dilma Roussef e fizeram forte oposição ao PT. 

Ambos votaram favoráveis à emenda para reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos e à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241/2016, que congelou os investimentos da União da área social por 20 anos. Segundo dados do Conselho Nacional de Saúde (CNS), essa proposta, convertida na Emenda Constitucional (EC) 95, fez o orçamento federal da saúde perder aproximadamente R$ 20 bilhões em 2019. Como deputado federal, Mandetta foi contra o programa Mais Médicos. Como ministro, fez seu próprio programa, não prevendo a contratação dos enviados de Cuba, mas, em meio à necessidade de chamamento emergencial de profissionais da área, precisou apelar para a força de trabalho cubana. O tema saúde, de uma forma ou outra, sempre ressoou na caminhada pública e política. 

Carreira


A união dos temas vem de berço. Foi inspirado a ser médico como o pai, Hélio Mandetta, que foi vice-prefeito de Campo Grande nos anos 1960. Formado pela Universidade Gama Filho, no Rio de Janeiro (RJ), Henrique Mandetta se especializou ortopedista e chegou a trabalhar como médico do Exército, no posto de tenente. Filiado ao MDB, a carreira política começou em 2005, ao ser chamado pelo primo e então governador Nelson Trad (PSD) para assumir os comandos da Secretaria de Saúde em Campo Grande. No cargo, foi acusado de fraude em licitação, tráfico de influência e caixa dois, mas nega as afirmações. 

Em 2010, deixou o cargo e trocou o MDB pelo DEM, quando concorreu a deputado federal. Exerceu dois mandatos como parlamentar pelo Mato Grosso do Sul (2011 e 2018). Na Câmara, concentrou a agenda em pauta nas áreas sociais, especialmente saúde, medicina, assistência social e educação, compondo comissões e subcomissões temáticas, além de ter sido representante do grupo de parlamentares brasileiros no Parlamento do Mercosul.

Saiba Mais

Apesar de não fomentar publicamente as intenções para disputar cargos eleitorais, agora Mandetta vira peça ativa do DEM, mesmo tendo dividido opiniões dentro do próprio partido por causa dos últimos posicionamentos, interpretados como estratégia para acelerar a própria demissão. Ao Fantástico, da Rede Globo, Mandetta afirmou que o governo carece de um discurso unificado sobre o enfrentamento à pandemia e dirigiu cobranças a Bolsonaro, que tem ignorado recomendações de isolamento social e defendido o retorno ao trabalho. 

No dia seguinte à entrevista, se disse arrependido e, na última coletiva de atualização dos casos de Covid-19 que concedeu como ministro, na quarta-feira (15/4), abriu as cartas apresentou o balanço em clima de despedida. Fez questão de dizer, no entanto, que não saia por vontade própria, reforçando o discurso que sempre defende de que “médico não abandona o paciente”. De forma sutil, aproveitou a pergunta sobre o uso da cloroquina para enaltecer a combinação do discurso técnico ao político, dizendo que a deliberação do tema é de competência do Conselho Federal de Medicina, "que é uma autarquia feita por Juscelino Kubistchek que, aliás, era médico."

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