Politica

Direção da PF opõe STF e Bolsonaro

Ministro Alexandre de Moraes, do Supremo, vetou nomeação de Alexandre Ramagem para o comando da Polícia Federal. AGU disse que não ia recorrer da decisão, mas foi desautorizada pelo presidente, que insiste em ter o amigo da família à frente da corporação

Correio Braziliense
postado em 30/04/2020 04:03
Bolsonaro dá posse a André Mendonça como ministro da Justiça no lugar de Sergio Moro, que saiu da pasta atirando no presidente


Uma decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), tomada ontem, horas antes da posse de Alexandre Ramagem como diretor-geral da Polícia Federal, pegou o presidente Jair Bolsonaro de surpresa. O magistrado, alegando indícios da prática de desvio de finalidade, impediu que o delegado fosse alçado ao cargo e tornou sem efeito o decreto do chefe do Executivo que havia oficializado a troca no comando da corporação. O despacho foi tão urgente que Moraes determinou que, se necessário, o governo fosse informado por meio de WhatsApp sobre o entendimento que ele teve a respeito do assunto. Sem uma alternativa imediata para o cargo, o presidente afirmou que vai recorrer da decisão. Com o veto a Ramagem, o chefe do Executivo deu posse apenas a André Mendonça como ministro da Justiça e a José Levi como novo advogado-geral da União.

A polêmica em torno do caso teve início com a demissão do então diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, homem de confiança de Sergio Moro, que deixou o Ministério da Justiça por não concordar com a troca. Ao sair, o ex-juiz acusou o presidente de tentar interferir na corporação para proteger aliados e de ter lhe pedido acesso a relatórios de inteligência relacionados a investigações em andamento na corporação. Citando as palavras do ex-ministro, Alexandre de Moraes apontou existirem indícios de que os interesses de Bolsonaro, ao trocar o comando da PF, não são compatíveis com a legislação. O magistrado disse que vê a intenção do presidente de colocar à frente da instituição um nome que seja “do contato pessoal dele”.

Durante a tarde, a Advocacia-Geral da União (AGU) chegou a publicar nas redes sociais que não ia recorrer da decisão, pois o presidente havia editado um decreto revogando a nomeação de Ramagem. No entanto, horas depois, Bolsonaro desautorizou a AGU e disse que a função do órgão é recorrer. “Quem manda sou eu”, disse a apoiadores em frente ao Alvorada. “Eu quero o Ramagem lá. É uma ingerência, né? Vamos fazer tudo para o Ramagem. Se não for, vai chegar a hora dele, e vamos colocar outra pessoa.”

Na solenidade de posse — da qual participaram o presidente do STF, Dias Toffoli, e o ministro da Corte Gilmar Mendes —, Bolsonaro afirmou que o sonho de nomear Ramagem para a Polícia Federal em breve se concretizará e defendeu a independência entre os poderes. “Uma das posições importantes que quem nomeia sou eu é a do diretor-geral da Polícia Federal. A nossa PF não persegue ninguém, a não ser bandidos. Um pequeno parêntese: respeito o Poder Judiciário, respeito às suas decisões, mas nós, com toda certeza, antes de tudo, respeitamos a nossa Constituição”, ressaltou.

Receio

Dentro da PF, é grande a expectativa para saber qual será o desfecho da história. Além disso, a corporação está sob tensão desde a saída de Moro, que tinha absoluta confiança de agentes e delegados por conta de sua atuação na Operação Lava-Jato. Nos bastidores, a avaliação é de que a instituição está desprotegida de interferências. O nome de Ramagem é visto com desconfiança, e antes mesmo de assumir, de acordo com fontes ouvidas pela reportagem, ele pensava em realizar alterações na composição das superintendências regionais.

Apesar da insistência do presidente de ter Ramagem à frente da PF, a decisão final deve ocorrer apenas após análise pelo plenário do Supremo, que decide a situação em caso de apresentação de recurso. O impasse gera preocupações entre os integrantes da corporação e dificulta o planejamento de operações em andamento e de novas ações. Se não obtiver aval da Justiça, Bolsonaro terá de escolher outro nome para ocupar o cargo.



Pedido do PDT

O mandado de segurança foi impetrado pelo PDT no STF. O partido questionou, no documento, a ligação de Ramagem com a família de Bolsonaro e a possibilidade de interferência do presidente da República na Polícia Federal. Em rede social, o deputado André Figueiredo (PDT-CE) afirmou que a liminar de Moraes foi “vitória da moralidade”.  “Estava assumindo (Ramagem) por ser muito próximo à família do presidente e de seus aliados e poderia blindá-los em eventuais investigações”, frisou.



Volta à Abin

Após a decisão de Moraes, Bolsonaro tornou sem efeito a nomeação de Ramagem. A decisão consta de decreto publicado, ontem, em edição extra do Diário Oficial da União (DOU). O texto também revoga a exoneração do delegado do cargo de diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), posto que ocupava antes de ser indicado para a PF. Com isso, ele volta para a Abin.


Ibaneis, o “irmão”

Em mais uma aparição no Palácio do Planalto, ontem, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), recebeu um afago do presidente Jair Bolsonaro. Defensor da reabertura do comércio em meio à pandemia da Covid-19 no país, o chefe do Executivo federal elogiou o comandante do Buriti por já ter autorizado a retomada de atividades na capital federal. “Viemos conversando há algum tempo e estou muito feliz em contar com a sua contribuição e também com o entendimento de alguma coisa que nós propomos ao Distrito Federal, afinal de contas, somos irmãos. Vamos viver juntos eternamente”, disse Bolsonaro a Ibaneis, durante cerimônia de posse do novo ministro da Justiça e Segurança Pública, André Luiz Mendonça, e do novo advogado-geral da União, José Levi Mello.





"Quando um país tem a inestimável fortuna de construir uma democracia, o desafio seguinte é buscar o constante aprimoramento da prática democrática (...) As democracias são diretamente ligadas à segurança jurídica"
José Levi Mello do Amaral Júnior, novo advogado-geral da União


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