Correio Braziliense
postado em 08/05/2020 04:03
A secretária especial de Cultura, Regina Duarte, cantou, ontem, durante entrevista ao vivo à CNN Brasil, uma música em homenagem à ditadura militar (1964-1985) e minimizou as mortes ocorridas no período. “Se você falar da vida, do outro lado tem a morte. Sempre houve tortura. Stalin, quantas mortes? Hitler, quantas mortes? Não quero arrastar um cemitério de mortes nas minhas costas. Não quero isso para ninguém”, disse Regina.
A música entoada pela atriz durante a entrevista foi Pra Frente Brasil, associada ao regime militar. “Não era gostoso cantar isso?”, perguntou a secretária de Cultura, há 60 dias no cargo. Regina também rebateu o argumento de que muitas pessoas foram torturadas, censuradas e até mortas ao longo da ditadura. “Sempre houve tortura, censura. Sou leve, estou viva. Estamos vivos, vamos ficar vivos? Não vive quem fica arrastando cordéis de caixões”, respondeu a atriz.
As declarações da secretária repercutiram na Câmara. Deputados do PSOL apresentaram um requerimento para que ela compareça à Casa para prestar esclarecimentos sobre a homenagem que fez à ditadura militar. “A classe artística foi uma das mais afetadas pela pandemia de covid-19, com a proibição de aglomerações e o consequente fechamento de salas de teatro e cancelamento de shows. A secretária simplesmente desapareceu no meio da crise. E agora reaparece – seguindo a alta cúpula do governo federal – para reafirmar seu compromisso com o regime militar”, criticou o requerimento assinado pela legenda.
Sobre a covid-19, que já matou mais de 8 mil pessoas no país, Regina Duarte afirmou que a pandemia tem trazido “morbidez” aos brasileiros, que, segundo ela, só falam sobre isso. A atriz preferiu exaltar o que o “governo tem feito pela população” e citou como exemplo o auxílio emergencial de R$ 600 para trabalhadores informais.
Durante a entrevista, realizada em seu gabinete em Brasília, a secretária rebateu rumores de que pretenda deixar o governo e disse que o clima entre ela e o presidente Jair Bolsonaro é muito bom, apesar da crise vivida entre os dois nas últimas semanas. “Demissão? Não, isso é uma narrativa que corre lá fora, as pessoas têm uma certa ansiedade em me ver fora. Em nenhum momento (senti que ia sair), estava um clima superbom, ele (Bolsonaro) estava animado, leve, rindo”, contou a atriz.
Questionada sobre o fato de a Secretaria Especial de Cultura não ter emitido nenhuma nota de pesar após a morte de figuras importantes do meio artístico, a atriz respondeu que tem mandado mensagens para as famílias das vítimas. “Será que eu vou ter que virar obituário? Quantas pessoas a gente está perdendo? Tem pessoas que eu não conheço. Aldir Blanc eu admiro, mas não conheci”, disse. “O país está cultuando a memória deles, não precisa da Secretaria de Cultura. Pode ser que eu esteja errando”, justificou a atriz.
Bate-boca
A entrevista terminou em confusão após a exibição de um vídeo em que a também atriz Maitê Proença reclama que a classe artística foi abandonada pelo atual governo. Regina Duarte reagiu. Acusou os jornalistas de estarem “desenterrando mortos”, alegando que o vídeo era de dois meses atrás. “Acho isso baixo nível”, disse a secretária.
Enquanto o depoimento de Maitê Proença era transmitido, a titular da Cultura continuou fazendo gestos de reprovação. Regina chegou a tirar o fone de ouvido. Após o áudio voltar para a secretária, ela desabafou: “Obrigada. Precisei dar um chilique aqui. Desculpem, telespectadores”. Os âncoras Reinaldo Gottino e Daniela Lima explicaram que o depoimento de Maitê Proença havia sido gravado ontem e que se tratava de uma reivindicação da classe artística. Regina, mais uma vez, mostrou descontentamento. “Ah, para quê? Estão desenterrando a mensagem da Maitê para quê. Quem é você? Está desenterrando uma fala de dois meses atrás. Desculpa”, reclamou a secretária.
Regina Duarte e os jornalistas da CNN começaram a bater boca. “Eu tinha tanta coisa para falar, mas vocês estão desenterrando mortos. Vocês estão carregando um cemitério nas costas. Vocês estão cansados. Fiquem leves”, afirmou Regina.
Daniela Lima respondeu do estúdio. “Não estamos desenterrando mortos. Neste momento, estamos enterrando milhares de brasileiros, inclusive colegas seus”, disse a âncora, em relação às vítimas da covid-19.
Nas redes sociais, a atriz Maitê Proença explicou que o vídeo exibido durante a entrevista tinha apenas o objetivo de pedir que ela ouvisse a classe artística. “É um pedido para que ela converse com a classe dela, é só isso”, disse Maitê. “Ela não entrou ontem [no governo], está há dois meses. É hora de ter um plano, de conversar, de falar que está tentando e dar alguma satisfação”, disse Maitê.
Militares vão comandar ação antidesmatamento
Após várias exonerações em órgãos ambientais e o desmatamento de mais de 5 mil km², de agosto de 2019 a março de 2020, na Amazônia, o presidente Jair Bolsonaro autorizou o emprego das Forças Armadas no combate ao desmatamento ilegal e focos de incêndio na região. Por meio de decreto de Garantia da Lei e da Ordem, os militares atuarão na faixa de fronteira, nas terras indígenas, nas unidades federais de conservação ambiental e em outras áreas federais nos estados da Amazônia Legal. As ações, de competência de órgão ambientais civis, como o Ibama e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, passam ao comando dos militares. O decreto estabelece que o emprego das Forças Armadas será articulada com os órgãos de segurança pública e as entidades públicas de proteção ambiental.
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