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FHC fala sobre coronavírus, política e critica governo Bolsonaro em live

FHC voltou a tercer críticas contra o governo de Jair Bolsonaro, embora tenha evitado usar o nome do atual presidente durante o bate-papo

Correio Braziliense
postado em 14/05/2020 20:47
FHC voltou a tercer críticas contra o governo de Jair Bolsonaro, embora tenha evitado usar o nome do atual presidente durante o bate-papoO ex-presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, falou sobre crise política e coronavírus em uma live da Congregação Israelita Paulista (CIP), na tarde desta quarta-feira (14/5). FHC voltou a tercer críticas contra o governo de Jair Bolsonaro, embora tenha evitado usar o nome do atual presidente durante o bate-papo. FHC disse que o chefe do Executivo governa apenas para o setor que o elegeu, e o alertou que esse tipo de medida pode trazer frutos a curto prazo, mas costuma terminar mal. A apresentação, intitulada Dilemas éticos - Brasil no enfrentamento de desafios reais e crises desnecessárias, foi mediada pelo rabino Michel Schlesinger.

FHC começou a falar do governo ao ser questionado sobre a segurança da democracia no Brasil. O ex-presidente destacou que o regime democrático nunca está completamente estabelecido. “Eu acho que é necessário considerar o que dizia um antigo político brasileiro, Otávio Mangabeira. Foi governador da Bahia e parlamentar e dizia que a democracia é uma planta tenra, que tem que ser regada. A democracia nunca está consolidada. Está sempre sendo trabalhada. Implica em considerar a diversidade, uma maioria manda, mas quem manda não pode esquecer quem perdeu”, afirmou. O ex-presidente destacou que sem esse cuidado há o crescimento do autoritarismo.

“O presidente foi eleito. Não votei nele. Mas ele ganhou. Pela maioria. Nem sempre eu acho que ele sabe o que significa. Parece que ele pensa que quem ganhou leva. Não. quem ganhou tem que ouvir o outro. Quem ganha, que está no poder não está legitimado para fazer o que bem entende. Você não vive sozinho. Você precisa do outro, que é o ser humano. Tem que falar dar ouvido, prestar atenção. Quando eu era presidente, falavam que as crises saíam menores do gabinete. Eu ouvia. Não é que eu estivesse de acordo, mas só de dar atenção, o outro se sente parte. Nunca se sabe o dia de amanhã”, disse. “Os que mandam hoje parece que pensam que vão sozinhos, que o outro é inimigo. Mas, coesão é importante para atravessarmos esse caminho (da pandemia)”, completou.

Sobre o crescimento da extrema direita e dos movimentos ultranacionalistas, FHC destacou que é importante se lembrar do passado, e que após a 2a Guerra Mundial, graças à criação da ONU, de blocos regionais e da declaração universal do homem, nunca mais se teve um conflito naquelas proporções. “Eu temo que a gente esqueça. Não esquecer é uma tendência hoje. A palavra, nos Estados Unidos, é America first. Se for isolacionista, contra os outros, não é positivo. Você pode fazer críticas às Nações Unidas, mas não pode dispensar as ações solidárias das nações unidas. Essas tendência de primeiro eu, depois eu e depois eu, são negativas. A produção, hoje, é em grande escala. Precisamos do outro. Precisamos do mercado. É importante ter base nacional, mas não pode ter egoísmo nacional”, alertou.

“Os alemães e os franceses se cansaram de matar um ao outro. A União Européia foi criada com um esforço da França e Alemanha. E a Inglaterra, com o Brexit, hoje, vai ser uma ilha isolada do mundo? Não vai. O mundo descobriu que, sem cooperação é mais difícil. Foram criadas organizações importantes. Eu espero que depois da pandemia, embora haja tendências isolacionistas, que não prevaleçam, que tenhamos um mundo mais solidário. Se não, vai ser difícil não haver guerra. Vejo uma disputa entre China e Estados Unidos. Espero que cheguem a um entendimento. Os EUA têm ido buscar recursos médicos na China. É importante entender criar um mundo em que seja as pessoas cresçam e apareçam sem guerrear”, afirmou.

Questionado sobre a volta de debates como legalização do aborto ou da maconha, FHC destacou que o Brasil vive momentos de intolerância, e destacou o perigo de políticos que se apresentam como de direita mas, na verdade, são atrasados. “São (debates) difíceis por conta da intolerância. É sempre bom ouvir o outro lado. A despeito das dificuldades, essas pautas são importantes. Vendo a vida, você vê que os que se drogam, não adianta dizer não pode. Tem que entender a compulsão. Os problemas que eles estão tentando resolver da maneira que eu acho que é errada, mas não adianta dizer. Tem que levar, conhecer, ir aos poucos. Se você puder mostrar pela ciência, é melhor”, disse.

“Alguns setores do governo não são de direita, são atrasados. Há pessoas que são atrasadas. Esquerda atrasado é tão ruim quanto direita atrasado. E você cria fantasmas. Terraplanismo? O que é isso? A ciência não é sabedoria plena. Isso é coisa da religião, quando vê tem a revelação. É uma coisa. Eu respeito. mas as religiões se adaptam á ciência à medida que é demonstrado que as coisas são de um jeito ou de outro. Se a pessoa não vê a mudança, é porque é atrasada”, destacou.

FHC destacou, por outro lado, que é preciso ter “paciência histórica”. Ações muito drásticas deixam marcas nas instituições. “Às vezes as pessoas fazem tanta coisa errada que cavam um buiraco para cair. Mas tem situações que não tem jeito. Assisti situações difíceis, de impeachment. Chega um momento que não se tem alternativa. Acho que não chegamos a tal ponto. Tem que ter prudência. Quem está lá tem mais responsabilidade que eu de entender a diversidade. É difícil ser presidente de uma república grande como a nossa. É preciso ouvir todos os setores. Na democracia, você não excita a base, convence. A democracia não está dada para sempre. Não significa impor o que é o certo, mas convencer e estar disposto a ser convencido”, afirmou. 

“No Brasil, temos que reagir contra os impulsos autoritários. São perigosos. Como eu disse, tem que regar a democracia, e se você não reage, os autoritários vão subindo. Temos três poderes harmônicos e independentes e quando um começa a fraquejar, o outro quer mandar. Por isso tem a divisão de Poderes, para ter pesos e contrapesos. E o líder nacional não é líder de uma parte, é de todos. Ele tem seus valores, mas tem que aceitar o outro. É fácil de falar e muito difícil de viver. Não pode ter ilusão. Não pode pensar que manda em tudo”, acrescentou FHC.

A respeito da relação do governo Bolsonaro com Israel, FJC afirmou que é bom que tenha uma boa relação, assim como com os árabes. Mas foi crítico à última manifestação antidemocrática, quando Bolsonaro marcou presença ao lado de uma bandeira de Israel e outra dos Estados Unidos. “Não acho bom que use o símbolo de Israel quando o governo está tomando posições anti humanas. Israel é um símbolo do contrário disso. Guarda com força a memória dos judeus que o nazismo matou”, afirmou.

“Temos que evitar qualquer tentativa de aceitar discriminações. O mundo judaico é o mais próximo do cristianismo que o islâmico, mas isso tem que nos levar a tentar que não haja desentendimentos, mas pontes. Sei das dificuldades concretas que existem lá. E tem um pensamento em Israel muito ativo em direita, como tem aqui também. Mas isso não me faz a julgar o conjunto de Israel por causa de alguns líderes de direita. Espero que não façam isso com o Brasil também. 

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FHC também destacou a importância do isolamento social. “Nesse momento estamos em situação difícil. Os médicos dizem que não tem remédio, é hora de ficar em casa. Eu sei que o país precisa crescer. Então como compatibilizar? As pessoas morrem mas não tem importância? Tem importância. Precisamos salvar vidas. Tem que trabalhar onde pode trabalhar. Então tem que dar poder ao poder local, que conhecem a situação. Mesmo na volta ao trabalho, vamos com cuidado, pois o vírus pode voltar”, ressaltou.

“É inevitável que, com  crise, exista uma mudança no equilíbrio do mundo. É provável que a China ocupe um espaço maior. O importante é que a China seja portadora da mesma mentalidade, aceitar a diferença. Esse é o princípio fundamental, aceitar a diversidade”, pediu. 

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