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Teich: Hoje escolhi sair

Vinte e oito dias após assumir cargo, ministro da Saúde pede demissão em meio a divergências com Bolsonaro sobre uso da cloroquina para tratar vítimas da covid-19. Com o país quebrando recordes de mortes e infectados, pasta segue desgovernada

Correio Braziliense
postado em 16/05/2020 04:11
Teich não explicou o motivo do pedido de exoneração e elogiou a dedicação dos profissionais de saúde: %u201CÉ uma coisa espetacular%u201D


Com quase 15 mil mortos pela covid-19 e mais de 200 mil infectados, o país continua a assistir à instabilidade na pasta que deveria estar na linha de frente do enfrentamento à pandemia. Com apenas 28 dias no cargo, Nelson Teich deixa o Ministério da Saúde em meio a divergências com o presidente Jair Bolsonaro. Assim como a permanência na função, o discurso de despedida do médico oncologista foi curto e raso, no qual não explicou o motivo do pedido de exoneração. “A vida é feita de escolhas, e eu hoje escolhi sair”, resumiu. “Não aceitei o convite pelo cargo. Aceitei porque achava que podia ajudar o Brasil e as pessoas. Dei o melhor de mim nesses dias em que estive aqui.”

Embora Teich não assuma publicamente, ele entrou em conflito com Bolsonaro por não aprovar o uso de cloroquina para todos os pacientes com covid-19 e ser contrário à flexibilização do isolamento social. Além disso, não foi consultado pelo presidente sobre o decreto que incluiu salões de beleza, academias e barbearias como atividades essenciais. Soube da decisão do chefe do Executivo durante uma coletiva de imprensa e ficou constrangido diante dos jornalistas.

O impasse começou quando Teich avisou nas redes sociais, na quinta-feira, que a cloroquina não tem eficácia comprovada contra o novo coronavírus e pode causar danos. “Um alerta importante: a cloroquina é um medicamento com efeitos colaterais. Então, qualquer prescrição deve ser feita com base em avaliação médica. O paciente deve entender os riscos e assinar o ‘Termo de Consentimento’ antes de iniciar o uso da cloroquina”, escreveu.

No mesmo dia, Bolsonaro afirmou que pressionaria o então ministro para alterar o protocolo sobre o uso do medicamento. “Estou exigindo a questão da cloroquina agora também. Se o Conselho Federal de Medicina decidiu que pode usar cloroquina desde os primeiros sintomas, por que o governo federal, via ministro da Saúde, vai dizer que é só em caso grave?”, frisou, durante reunião por videoconferência com empresários. O chefe do Executivo chegou a se encontrar duas vezes nesta semana com Teich para tratar do assunto, mas o então ministro afirmou a pessoas próximas que não queria manchar a própria trajetória como médico liberando a medicação.

Elogios
Em meio às divergências, Teich resolveu, ontem, encerrar sua passagem relâmpago pela pasta. “Eu agradeço ao presidente Jair Bolsonaro a oportunidade que me deu de ter feito parte do Ministério da Saúde. Seria muito ruim na minha carreira não ter tido a oportunidade de atuar no ministério, pelo SUS (Sistema Único de Saúde).”

Teich elogiou os profissionais que atuam nos hospitais. “Quando você vai à ponta e vê o que é o dia a dia dessas pessoas, você se impressiona. A dedicação dessas pessoas correndo risco, o tempo todo ao lado dos pacientes. É uma coisa realmente espetacular”, frisou ele, que esteve no Amazonas e no Rio de Janeiro, estados cujos sistemas de saúde estão à beira de um colapso.

Nos poucos dias em que esteve como titular do Ministério da Saúde, Teich só participou presencialmente de sete coletivas ministeriais, no Palácio do Planalto, relativas ao coronavírus. Apesar do compromisso de apresentar uma diretriz para nortear os estados e municípios no enfrentamento da doença, ele deixa a pasta sem ter cumprido a promessa. No discurso de adeus, porém, afirmou que deixa “um plano de trabalho pronto para auxiliar secretários estaduais, secretários municipais, prefeitos e governadores a tentar entender o que está acontecendo e a definir os próximos passos”. “Aqui, a gente entrega quais são os pontos que têm de ser avaliados, quais são os itens críticos, e auxilia no entendimento do momento e da tomada de decisão”, ressaltou.

Ministros
Bolsonaro não comentou a saída de Teich, mas ministros falaram sobre o assunto. Braga Netto, da Casa Civil, afirmou que o médico pediu demissão por “questões de foro íntimo”. “São posições diferentes. O presidente não ignora a ciência, ele segue os protocolos. Ele tem uma visão diferente (sobre) qual é o protocolo a ser seguido, e a questão do ministro Teich é uma questão realmente de foro íntimo”, destacou.

O ministro da Secretaria do Governo, Luiz Eduardo Ramos, endossou o motivo da exoneração a pedido. “Conversei com o ministro Nelson Teich, e ele estava sereno, decisão de foro íntimo. Aliás, ele na coletiva falou ‘a vida é feita de escolhas’ e ele escolheu sair, simples assim”, disse.

Já Paulo Guedes, titular da Economia, frisou ser normal pedido de demissão quando ocorrem divergências entre o presidente e o ministro. “Se tem um presidente que tem uma orientação e o ministro tem outra, quem tem voto é o presidente. Então, quem sai é o ministro. Não há nada de anormal”, argumentou. “O anormal seria sair o presidente porque o ministro quer fazer o que o presidente não quer.”

Mortes têm aumento de 666%
No período de menos de um mês de Teich no comando do ministério, aconteceram mais 12.884 óbitos pelo coronavírus, um avanço de 666%. Quando Luiz Henrique Mandetta foi demitido, em 16 de abril, o Brasil relatava 1.933 óbitos por covid-19. Ontem, o país chegou a 14.817 óbitos, além de ter 218.223 infectados pela doença. Conforme ressalta o Ministério da Saúde, porém, os novos registros em 24 horas não indicam efetivamente quantas pessoas morreram ou se infectaram de um dia para o outro, mas, sim, o número de registros que tiveram o diagnóstico de coronavírus confirmado nesse intervalo.

“Não aceitei o convite pelo cargo. Aceitei porque achava que podia ajudar o Brasil e as pessoas. Dei o melhor de mim nesses dias em que estive aqui”
 Nelson Teich, ex-ministro da Saúde

6
minutos

Tempo que durou o discurso de despedida de Teich

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