Correio Braziliense
postado em 26/05/2020 13:02
A Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) afirmou em nota nesta terça-feira (26/5), que "é conhecido e notório o vínculo" da deputada federal bolsonarista Carla Zambelli (PSL-SP) com a Associação de Delegados, "desde quando era líder do movimento Nas Ruas". A nota é relativa à Operação Placebo, da PF no Rio de Janeiro, que atingiu o governador Wilson Witzel. Na última segunda-feira (25), Zambelli falou que haveria operação na PF que iria atingir governadores.A operação tem como intuito apurar suspeita de desvio de recursos relacionados ao combate ao novo coronavírus. Como parte da ação, houve busca e apreensão no Palácio Laranjeiras, residência oficial do governador, e também no escritório da primeira-dama, Helena Witzel.
A Fenapef afirmou em nota que o laço entre a parlamentar e delegados "se demonstra pela participação de Zambelli em eventos, vídeos e homenagens". "A Fenapef defende a apuração, com responsabilidade e profundidade, sobre a possibilidade de que esse vínculo possa ter sido utilizado para a obtenção de alguma informação privilegiada", pontuou.
Em resposta, a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) repudiou a nota da Fenapef, chamando-a de "irresponsável". "No momento em que a Polícia Federal é colocada involuntariamente no centro do debate político, nada mais danoso para o órgão do que a utilização desse ambiente para se criar instabilidades por rixas classistas que nada colaboram com a defesa da instituição", pontuou.
A associação afirmou que não tem acesso a informações referentes a qualquer investigação em andamento e que a regra da diretoria é se manter distante de fatos investigados. A entidade disse ainda que sempre condenou qualquer tipo de vazamento de informações sigilosas e que vai tomar medidas judiciais cabíveis contra os dirigentes da federação para que "provem as insinuações que fizeram ou respondam pelas leviandades lançadas publicamente".
Em entrevista à Rádio Gaúcha, na última segunda-feira (25), Zambelli falou: "A gente já teve algumas operações da Polícia Federal que estavam ali na agulha para sair, mas não saíam. E a gente deve ter nos próximos meses o que a gente vai chamar, talvez, de 'Covidão', não sei qual vai ser o nome eles vão dar, mas já tem alguns governadores sendo investigados pela Polícia Federal".
Nesta terça-feira, à CNN Brasil, a parlamentar negou ter tido acesso e vazado informações sobre as investigações. "Foi uma coincidência? Não só isso. Se eu soubesse e tivesse informação privilegiada... Eu não pareço ser uma pessoa burra, poderia até ser, mas não sou. Eu falaria isso publicamente se tivesse informação privilegiada?”, disse.
Em nota, a federação pontuou ainda que "apoia todo e qualquer esforço para apurar e combater a corrupção" e que "a lisura das investigações e o sigilo das operações devem ser preservados em qualquer circunstância".
Interferência na PF
A suposta antecipação de Zambelli da operação que atingiu Witzel acontece em meio a uma investigação que apura suspeita de interferência política do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na PF. Um inquérito foi aberto no Supremo Tribunal Federal (STF), após pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), para apurar acusações que foram feitas pelo ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro no dia 24 de abril, ao pedir demissão.
Confira nota da Fenapef na íntegra:
A respeito da Operação Placebo e seus desdobramentos, a Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) informa que:
1. A Fenapef apoia todo e qualquer esforço para apurar e combater a corrupção. Mesmo em tempos de pandemia, os policiais federais seguem fazendo seu trabalho de investigação.
2. A lisura das investigações e o sigilo das operações devem ser preservados em qualquer circunstância.
3. Sobre as suspeitas de que a deputada Carla Zambelli (PSL- SP) foi informada antecipadamente da Operação, é conhecido e notório o vínculo da parlamentar com a Associação de Delegados, desde quando era líder do movimento Nas Ruas. Esse laço se demonstra pela participação de Zambelli em eventos, vídeos e homenagens. A Fenapef defende a apuração, com responsabilidade e profundidade, sobre a possibilidade de que esse vínculo possa ter sido utilizado para a obtenção de alguma informação privilegiada.
4. A Operação Placebo é realizada pela equipe do SINQ (Serviço de Inquéritos) da DICOR (Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado) da Polícia Federal. O SINQ atua em inquéritos de tribunais superiores que tenham como alvos pessoas com foro nesses tribunais.
5. As buscas nos Palácios das Laranjeiras e da Guanabara foram autorizadas pelo Superior Tribunal de Justiça e têm como objetivo encontrar elementos de um possível esquema de corrupção envolvendo uma organização social contratada para a instalação de hospitais de campanha e servidores da cúpula da gestão do sistema de saúde do Estado do Rio de Janeiro, conforme informou a Polícia Federal.
Federação Nacional dos Policiais Federais
Brasília, 26 de maio de 2020
Confira a nota da ADPF na íntegra:
A Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), que há 43 anos representa os delegados da Polícia Federal e tem um histórico de defesa ética e séria da instituição, repudia veementemente a irresponsável nota da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), em razão das graves e infundadas ilações sobre possível vazamento de informações de investigações por parte desta Associação.
No momento em que a Polícia Federal é colocada involuntariamente no centro do debate político, nada mais danoso para o órgão do que a utilização desse ambiente para se criar instabilidades por rixas classistas que nada colaboram com a defesa da instituição.
A ADPF defende há muitos anos a criação de um sistema de proteção para a Polícia Federal baseado em autonomia e mandato para o Diretor Geral do órgão. Uma blindagem essencial contra possíveis interferências políticas que ameacem uma instituição de Estado respeitada pela sociedade brasileira.
Na defesa dessa pauta que interessa ao Brasil, a Associação contou e conta com o apoio público de diversos parlamentares, movimentos sociais, instituições e grande parte da população brasileira. Em 2017, toda essa mobilização voluntária, de caráter nacional, resultou na entrega de mais de setecentas mil assinaturas de apoio à Proposta de Emenda Constitucional que prevê autonomia para a Polícia Federal. Dentre esses apoiadores, está a então líder do movimento social “Nas Ruas”, Carla Zambelli, atualmente deputada federal pelo estado de São Paulo. Apoio este recebido às claras e de maneira institucional. A ADPF se orgulha de ter conseguido demonstrar às mais diferentes correntes políticas e da sociedade civil organizada a necessidade de proteção da instituição.
Importante esclarecer que a ADPF não se confunde com a instituição Polícia Federal, não tendo acesso a informações referentes a qualquer investigação ou operação policial em andamento. Aliás, é uma regra da diretoria da Associação se manter distante de fatos investigados e não se manifestar sobre inquéritos ou apurações em andamento.
A ADPF atua na defesa da Polícia Federal e sempre condenou, de forma intransigente, qualquer tipo de vazamento de informações sigilosas, por quem quer que seja. Os responsáveis por revelação de qualquer segredo profissional, devem ser processados e demitidos, sem prejuízo das sanções cíveis e penais cabíveis. Para tanto a Associação espera uma investigação rigorosa para revelar se houve esse tipo de crime e seus eventuais autores a qualquer tempo e, no caso concreto, para servir como mais um elemento que comprove a atuação maliciosa contra a ADPF.
A ADPF, independentemente da apuração, irá imediatamente tomar as medidas judiciais cabíveis para que os dirigentes da Fenapef provem as insinuações que fi zeram ou respondam pelas leviandades lançadas publicamente e entendam que divergências classistas não estão acima da ética, da moral, tampouco do nome e da credibilidade da Polícia Federal.
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