Recriado para dar espaço ao Centrão no governo e angariar apoio no Congresso, o Ministério das Comunicações, do ministro Fábio Faria, tem uma agenda ampla e aguardada pelo setor de telecomunicações. Além de tocar as privatizações dos Correios e da Telebras, se avançarem, a pasta precisa regulamentar a Lei 13.879/2019, que atualizou a Lei Geral das Telecomunicações de 1997, e decidir sobre a participação ou não da Huawei na implementação da infraestrutura da tecnologia 5G de internet. O leilão está marcado para 2021, e as operadoras defendem a liberdade de escolha dos fornecedores, embora a empresa chinesa seja considerada uma ameaça pela ala ideológica do governo, que replica o pensamento do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Os desafios da pasta, no entanto, extravasam as questões técnicas. Ao extinguir a Secretaria Especial de Comunicação (Secom) e colocar o titular Fábio Wajngarten como número dois na pasta, o desafio do ministro Fábio Faria será coordenar, também, as verbas publicitárias do governo na mídia. A relação dele com Silvio Santos, do SBT, de quem é genro, pode ensejar conflito de interesses à luz do princípio de moralidade pública. Faria ainda terá de lidar com o Gabinete do Ódio, do qual foi vítima tão logo foi anunciado como ministro, ao se tornar alvo de ataques em função de postagens antigas defendendo o voto nos petistas Lula e Dilma Rousseff.
Do ponto de vista político, a recriação da pasta ajuda a aumentar a coalizão do presidente no Congresso, na opinião de André Rosa, especialista em relações governamentais. “Bolsonaro traz uma pessoa muito próxima de um ator da grande mídia, isso dá uma notabilidade positiva, ao mesmo tempo em que garante apoio nas propostas mais polêmicas, como as privatizações”, avaliou.
Do lado técnico, a recriação da pasta é um reconhecimento para o setor, que saiu de um status de secretaria, ressaltou Marcos Ferrari, presidente executivo do Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (SindiTelebrasil). “Isso dá mais força nos temas tocados pelo setor, do ponto de vista regulatório. As empresas de telecomunicações são as que mais investem em infraestrutura, na casa dos R$ 30 bilhões por ano.”
O primeiro dos três principais desafios para o segmento, elencados por Ferrari, é dar andamento à regulamentação da nova lei de telecom, aprovada em setembro de 2019 e sancionada em outubro, no que diz respeito à renovação de frequências, aos direitos de exploração de satélite e à própria concessão. “Em segundo lugar, há vários gargalos, nos quais o ministério precisa colocar uma lupa. São necessários testes de convivência para a tecnologia 5G, que foram paralisados por causa da covid. Sem eles, dificulta precificar o leilão”, afirmou. Entre os gargalos, Ferrari incluiu a lei das antenas, a tributação da Internet das Coisas (IoT), a falta de garantia de que o leilão de 5G não será arrecadatório e a elevada carga tributária do setor. “O terceiro desafio será o processo de privatização da Telebras.”
A desestatização da Telebras, contudo, não faz parte da agenda de Gilberto Kassab, ex-ministro das Comunicações e presidente do PSD, partido de Fábio Faria. Para Flávia Lefèvre, advogada especializada em telecomunicações, Kassab sempre defendeu a estatal como vetor para estender as políticas públicas de universalização do acesso à banda larga. “Tudo indica que a Telebras vai ter o papel que se espera que tenha, como promotora de novos investimentos, para coordenar os pequenos e médios servidores. A fala de Kassab foi nesse sentido”, argumentou.
“Há muito por fazer para definir o novo modelo de contratos para os serviços de telecomunicações. No entanto, o que motivou a recriação da pasta foi interesse político privado do presidente Jair Bolsonaro”, alertou a especialista. “Há um questionamento, com base no artigo 37 dos princípios da administração pública, da indicação de Faria, que tem ligações com empresas de radiodifusão. Além disso, é casado com uma pessoa que é acionista do SBT. Isso gera conflito de interesses.”
"Isso (ministério) dá mais força aos temas tocados pelo setor, do ponto de vista regulatório. As empresas de telecomunicações são as que mais investem em infraestrutura, na casa dos R$ 30 bilhões por ano”
Marcos Ferrari, presidente executivo do SindiTelebrasil
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