A 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) deferiu, ontem, por 2 votos a 1, habeas corpus impetrado pela defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e conseguiu retirar, da primeira instância, a investigação sobre o suposto esquema de “rachadinha” –– quando os funcionários devolvem parte dos salários ao parlamentar —, no gabinete que ocupava quando era deputado estadual no Rio. No recurso, os advogados alegaram que o Órgão Especial do tribunal, formado pelos desembargadores mais antigos, seria competente para julgar o caso, já que o filho 01 do presidente era deputado estadual à época dos fatos investigados.
Os desembargadores da 3ª Câmara também decidiram manter os atos determinados até o momento no processo, como a prisão de Fabrício Queiroz, ex-assessor parlamentar de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Durante a sessão, a relatora do habeas corpus, desembargadora Suimei Cavalieri, deu parecer contrário ao recurso da defesa do senador. O julgamento empatou com o posicionamento da desembargadora Mônica Toledo, que votou a favor do recurso. Coube a Paulo Rangel o desempate, com um voto favorável ao pedido de Flávio.
Mas os magistrados mantiveram, também por 2 a 1, a validade das decisões tomadas pelo juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal do TJ-RJ, no processo. As desembargadoras Suimei Cavalieri e Mônica Toledo concordaram, mas Rangel foi contra.
Assim, ficam mantidas as ordens de prisão preventiva de Fabrício Queiroz e de sua mulher, Márcia Aguiar, que está foragida. O ex-assessor foi preso na semana passada, em Atibaia (SP).
Embora a 3ª Câmara Criminal tenha mantido os atos do juiz Flávio Itabaiana, o Órgão Especial do TJ, que assumirá o caso, pode rever as decisões tomadas na primeira instância. A advogada do senador, Luciana Pires, anunciou que a defesa buscará a nulidade de todos os atos do processo.
Esse é mais um episódio no caso Queiroz, em meio a várias tentativas de Flávio de interromper as investigações. Em julho de 2019, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, deferiu um recurso da defesa do senador e suspendeu todas as investigações que estivessem utilizando, sem autorização judicial, dados da Receita Federal e do antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf, hoje Unidade de Inteligência Financeira/UIF). A defesa argumentava que esse tipo de compartilhamento configurava uma quebra de sigilo bancário. Em novembro do mesmo ano, o plenário da Corte derrubou a decisão de Toffoli, e as investigações foram retomadas.
Em abril, com o mesmo argumento apresentado anteriormente ao Supremo, a defesa de Flávio pediu a suspensão das investigações ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). O recurso foi negado pelo ministro Felix Fischer. Em maio, os advogados do senador pediram para o magistrado rever a decisão, mas também não tiveram sucesso.
Ameaça é de tudo ser anulado
A decisão de ontem da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, sobre a ida da investigação contra o senador Flávio Bolsonaro, para o Órgão Especial do TJ, poderá ainda ter implicações em relação às decisões tomadas pelo juiz de primeira instância, ainda que os desembargadores tenham decidido pela validade das decisões tomadas pelo juiz Flávio Itabaiana.
Professora de direito constitucional da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto e do Centro Universitário de Bauru, Eliana Franco Neme entende que há grandes chances de a defesa do senador conseguir a anulação das provas com base na “teoria do fruto da árvore envenenada”.
Assim, o órgão colegiado do TJ pode entender que as decisões tomadas pelo magistrado da 27ª Vara são inválidas, uma vez que ele não era o juízo competente. Com isso, todos os atos que autorizaram, por exemplo, diligências do MP, e que resultaram em produção de prova, podem perder a validade –– como a prisão de Fabrício Queiroz e da mulher, Márcia Aguiar.
Presidente da Associação Nacional da Advocacia Criminal (Anacrim), James Walker reitera que caso as decisões de Itabaiana sejam anuladas, as provas obtidas por meio daqueles atos também o são. Isso, no entanto, não invalida aquelas obtidas pelo MP.
O criminalista Andrew Fernandes explica que a situação cabe entendimentos distintos, uma vez que há a prerrogativa de foro. Lembra que o Supremo Tribunal Federal, de 2018, reduziu o alcance do foro, definindo que a prerrogativa vale somente para crimes cometidos durante o mandato e relacionados com o cargo.
Para Fernandes, se os desembargadores consideraram que o caso não poderia ficar com Itabaiana, mas suas decisões deveriam ser mantidas, isso vem do entendimento de que o juiz era amparado pela decisão de 2018, do STF. (ST e JV)
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