Correio Braziliense
postado em 01/07/2020 06:00
O ministro-relâmpago disse que o estopim para a decisão de desistir do posto foi o fato de a Fundação Getulio Vargas (FGV) ter afirmado que ele não foi pesquisador ou professor da instituição. “Prof. Decotelli atuou apenas nos cursos de educação continuada, nos programas de formação de executivos e não como professor de qualquer das escolas da Fundação”, informou a instituição, em comunicado oficial.
Antes, Decotelli já havia sido desmentido pela Universidade Nacional de Rosário, da Argentina, e pela Universidade de Wuppertal, da Alemanha, que negaram títulos de doutorado e pós-doutorado que constavam no currículo dele. Além disso, foi acusado de plágio na tese de mestrado (leia ao lado). Em entrevista à CNN Brasil, Decotelli culpou a FGV por sua saída repentina do MEC.
“A estrutura pela qual a destruição da continuidade veio pelo fato da construção fake da FGV divulgar que eu nunca fui professor da FGV. Então, essa informação fez com que o presidente me chamasse e dissesse que: ‘Se até a FGV, onde o senhor trabalha há 40 anos ministrando cursos, vários alunos têm seu nome impresso nos certificados, está negando que o senhor é professor da FGV, então, é impossível o governo continuar sendo questionado das inconsistências em seu currículo’. O que, portanto, tornou inviável minha permanência”, afirmou Decotelli.
Ontem, Bolsonaro não deu declarações sobre a situação de Decotelli. Contudo, já aceitou o pedido de demissão e deve publicar um ato no Diário Oficial da União de hoje para tornar sem efeito a nomeação do professor. O presidente quer evitar constrangimentos maiores para ele e para o governo, sobretudo porque os dois se reuniram na última segunda-feira e, apesar da cobrança de Bolsonaro por explicações sobre as inconsistências curriculares, o ex-ministro não citou o caso da FGV.
A nova controvérsia deixou Bolsonaro irritado. Até então, o presidente estava disposto a manter o nomeado como ministro. Em publicação nas redes sociais na segunda-feira, chegou a afirmar que o professor “estava ciente de seu equívoco”, mas destacou que ele não pretendia “ser um problema” para o governo.
Substituto
Para escolher o novo ministro da Educação, Bolsonaro pretende ser mais criterioso. No momento, o nome mais cotado é o do professor e reitor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Anderson Ribeiro Correia. A nomeação dele conta com o aval de militares e da ala ideológica do governo. Correia tem um perfil técnico, como se quer no governo, e um currículo robusto. Por sinal, todas as informações sobre Correia foram checadas para não se repetir a desmoralização em relação a Decotelli.
Ele é ex-presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), foi membro do Conselho Deliberativo e é pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), nível 1B. Atuou na equipe de transição entre os governos Michel Temer e Bolsonaro, na área da Educação.
Outros dois nomes citados na lista de cotados são Marcus Vinicius Rodrigues, ex-presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep); e Antônio Freitas, pró-reitor da FGV, que aparecia como orientador do doutorado não realizado por Decotelli.
Também aparecem no páreo o assessor especial do MEC, Sérgio Sant’Anna, aliado de Abraham Weintraub; o secretário nacional de Alfabetização, Carlos Nadalim; o secretário estadual de Educação do Paraná, Renato Feder; e a secretária de Educação Básica, Ilona Becskeházy.
Heleno responde a críticas
Embora não faça menção direta a Decotelli, o general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), afirmou, por meio das redes sociais, que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) checa a vida pregressa de ocupantes de cargos no governo, mas que cada ministro é responsável pelo seu currículo. “Aos desinformados: o GSI/Abin examinam, sobre quem vai ocupar cargos no governo, antecedentes criminais, contas irregulares e pendentes, histórico de processos e vedações do controle interno. No caso de ministros, cada um é responsável pelo seu currículo”, escreveu.
Os cinco dias como ministro
25/6
» O presidente da República, Jair Bolsonaro, nomeia Carlos Decotelli como novo ministro da Educação, no lugar do controverso Abraham Weintraub. O decreto é publicado em edição extra do Diário Oficial da União (DOU). Nas redes sociais, o chefe do Executivo escreve: “Informo a nomeação do professor Carlos Alberto Decotelli da Silva para o cargo de ministro da Educação. Decotelli é bacharel em ciências econômicas pela UERJ, mestre pela FGV, doutor pela Universidade de Rosário, Argentina, e pós-doutor pela Universidade de Wuppertal, na Alemanha. Essas informações também constam no currículo de Decotelli na plataforma Lattes.
26/6
» O reitor da Universidade Nacional de Rosário, na Argentina, Franco Bartolacci, afirma, que Decotelli não obteve o título de doutor na instituição, como consta no currículo dele. Segundo Bartolacci, o brasileiro cursou o doutorado na Faculdade de Ciências Econômicas, mas a tese dele não foi aprovada, portanto, não conseguiu o título de doutor. Diante do desmentido, Decotelli corrigiu as informações do currículo Lattes. Consta, agora, que ele concluiu os créditos do doutorado, mas sem defesa de tese.
27/6
» A Fundação Getulio Vargas (FGV) informa que vai investigar suspeita de plágio no mestrado de Decotelli. A decisão foi anunciada após o economista Thomas Conti apontar, no Twitter, possíveis indícios de cópia no trabalho do ministro, defendido em 2008 na Escola de Administração Pública e de Empresas da FGV. Segundo a denúncia, 12% da dissertação de Decotelli tem parágrafos idênticos ao de um relatório do Banco do Estado do Rio Grande do Sul (Banrisul) para a Comissão de Valores Imobiliários (CVM), sem a devida citação. A reprodução de trechos de outros trabalhos é comum em dissertações e teses, mas deve ser indicada como tal sempre ao fim da sentença. Em nota, o MEC diz que “o ministro refuta as alegações de dolo, informa que o trabalho foi aprovado pela instituição de ensino e que procurou creditar todos os pesquisadores e autores que serviram de referência”. O ministro afirma ainda, na nota do MEC, que “caso tenha cometido quaisquer omissões, estas se deveram a falhas técnicas ou metodológicas”. Ele se dispõe a revisar o trabalho para providenciar as devidas correções, “caso sejam identificadas omissões”.
29 de junho
» A Universidade de Wuppertal, na Alemanha, informa que Decotelli não fez pós-doutorado na instituição. A universidade explica que ele teve estadia de pesquisa de três meses, mas não tem um título. Ser pós-doutor não é considerado título, mas exige conclusão e doutorado. Diante da informação, Decotelli altera o currículo de novo: deixa de afirmar que fez pós-doutorado em Wuppertal.
» A Fundação Getulio Vargas (FGV) informa que Decotelli não foi pesquisador ou professor da instituição. A nota diz: “Prof. Decotelli atuou apenas nos cursos de educação continuada, nos programas de formação de executivos e não como professor de qualquer uma das escolas da Fundação”. A situação é comum na instituição em cursos com esse perfil: professores são chamados como pessoa jurídica e atuam apenas em cursos específicos. Isso quer dizer que ele não faz parte do corpo docente da instituição, mas foi apenas professor colaborador.
Ontem
» Carlos Alberto Decotelli entrega a carta de demissão a Bolsonaro, que a aceita.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.