Politica

Reunião do Mercosul expõe efeitos da política ambiental sobre a economia

Presidente pede ação para que pactos com a União Europeia e a Efta sejam finalizados. ONGs internacionais criticam forma como o Brasil trata questões ambientais e indígenas, e pressionam contra aval às propostas. Chefe do Planalto diz que pretende desfazer imagem ''distorcida''

Correio Braziliense
postado em 03/07/2020 06:00
A reunião do Mercosul ocorreu por videoconferência, por causa da pandemia. Bolsonaro disse que bloco ''é parte das soluções que estamos construindo''Diante da resistência de alguns países da Europa de sacramentar acordos comerciais com o Mercosul, o presidente Jair Bolsonaro pediu aos demais chefes de Estado do bloco sul-americano que façam uma força-tarefa para que os pactos com a União Europeia e a Associação Europeia de Livre Comércio (Efta) sejam finalizados ainda neste ano. Ontem, durante a 56ª reunião da cúpula de presidentes do Mercosul, o mandatário brasileiro ainda falou em “desfazer opiniões distorcidas sobre o Brasil”, sobretudo em temas voltados ao meio ambiente, para tentar viabilizar a assinatura dos acordos.

Atualmente, organizações não-governamentais ambientalistas pressionam nações europeias a não dar sequência aos dois pactos, que foram selados no ano passado, e países como Áustria, Irlanda, França e Países Baixos já sinalizaram que não darão aval às propostas, sobretudo por não aceitarem a forma como o governo Bolsonaro lida com o tema ambiental. As queimadas na região amazônica são um dos principais empecilhos, bem como a destruição de reservas indígenas por empresas mineradoras.

“Nosso governo vai desfazer opiniões distorcidas sobre o Brasil, mostrando ações que temos tomado em favor da floresta amazônica e do bem-estar das populações indígenas”, disse o chefe do Planalto aos mandatários de Argentina, Uruguai e Paraguai. Ele acrescentou que “está disposto a avançar em outros empreendimentos com parceiros mundo afora” e destacou que “o Mercosul é o principal veículo” para que o Brasil possa se inserir “mais e melhor” no mundo.

“Queremos levar adiante as negociações abertas com Canadá, Coreia do Sul, Cingapura e Líbano, expandir os acordos vigentes com Israel e a Índia e abrir novas frentes na Ásia. E temos todo interesse em buscar tratativas com os países da América Central”, frisou Bolsonaro. O presidente pediu a mobilização dos demais membros do Mercosul para o desafio de “conciliar a proteção da saúde das pessoas com o imperativo de recuperar a economia” em meio à pandemia do novo coronavírus. “Senhores presidentes, os próximos meses serão de grandes desafios para todos nós. Tenho certeza de que o Mercosul é parte das soluções que estamos construindo”, destacou ele, que cogitou, no ano passado, a saída do Brasil do bloco.

Ataques e acenos
O encontro foi cercado de expectativa porque se tratava do primeiro compromisso oficial envolvendo Bolsonaro e o presidente da Argentina, Alberto Fernández. Os dois colecionam desentendimentos desde o ano passado, quando o chefe de Estado vizinho derrotou Mauricio Macri nas eleições para a Casa Rosada.

Durante o seu discurso, Bolsonaro não citou o nome do argentino, mas o alfinetou em, ao menos, três ocasiões: ao defender a revisão da Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul — cobrada sobre a importação de produtos e serviços de empresas dos países-membros do bloco —; ao criticar Nicolás Maduro — tido por Fernández como o presidente da Venezuela —; e ao lamentar a ausência da presidente interina da Bolívia, Jeanine Áñez, nos trabalhos do Mercosul no último semestre — o argentino não reconhece o governo de Áñez e ainda concedeu refúgio, em Buenos Aires, ao ex-presidente boliviano Evo Morales.

Fernández também não se dirigiu diretamente a Bolsonaro, mas observou que “precisamos integrar uma única nação em nível regional” e que “as diferenças que possam surgir passam a um segundo plano”. “O importante é o desejo de nossos povos de se vincular, acima dos governos, que, ocasionalmente, governam cada uma de nossas Repúblicas. A união dos nossos povos precede a nossa posição como governantes ocasionais”, comentou.

Fernández também ressaltou a importância da globalização, fenômeno bastante criticado pelo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. “Estamos chamados a ser um grande país, a América Latina. O mundo se globalizou, isso é fato. Brigar contra isso é bobeira, o que não é bobeira é ver como nos integramos a um mundo globalizado, como região. Aqui, ninguém vai se salvar sozinho, precisamos ver como vamos construir um mundo mais igual e desenvolvido depois da pandemia. Temos de encarar juntos esse debate”, frisou.

Por sua vez, o presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, que assumiu a presidência pró-tempore do Mercosul durante a reunião, firmou o compromisso de trabalhar com o governo da Alemanha, um dos principais defensores do acordo comercial entre o bloco sul-americano e a União Europeia, para acelerar a assinatura e ratificação do pacto. Ele defendeu que o Mercosul tem de trabalhar a zona de livre comércio, consolidar o trato nacional de produtos e aperfeiçoar a união aduaneira.

Na visão do mandatário uruguaio, o fato de os países europeus tentarem, ao máximo, se proteger da covid-19 pode levá-los “inconscientemente ao protecionismo”, o que é uma “tentação” para algumas nações, em especial as maiores. “O Mercosul precisa aproveitar e terminar o que começou. Não deve haver sinal global pior do que não concluir os processos que levaram tantos anos de negociação, e estamos na reta final. Portanto, se possível, nestes meses, temos de assinar com a União Europeia e com a Efta”, salientou Pou.

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