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Quebra de contrato

A infidelidade destrói os laços de confiança entre os casais. Não são poucos, porém, que assumem os riscos de uma aventura extraconjugal

postado em 20/08/2010 18:44
A infidelidade destrói os laços de confiança entre os casais. Não são poucos, porém, que assumem os riscos de uma aventura extraconjugal
O que leva homens e mulheres a traírem? Existe explicação para o adultério? Expusemos a questão a nossos leitores em uma enquete no site da Revista. Diante das opções fornecidas, 40% deles admitiram que trairiam, mas somente se descobrissem que foram traídos. Essa é a hipótese do olho por olho. A desculpa do desgaste natural da relação aparece em segundo lugar, com 20% dos votos. Mais atrás vêm os absolutamente leais, responsáveis por 18% do eleitorado. Por fim, aparecem os 12% de volúveis, que admitem pular a cerca sem qualquer motivo específico ; basta ter vontade.

Mas o que está por trás desses números? Um estudo realizado na Grã Bretanha, em 2006, concluiu que algumas pessoas seriam geneticamente programadas para a infidelidade. Após analisar várias irmãs gêmeas, o professor Tim Spector, da Unidade de Pesquisa de Gêmeos do Hospital St. Thomas, disse que, se uma delas tivesse um histórico de infidelidade, as chances de a outra também ser infiel seriam de 55%. Mas, atenção: não se trata de uma setença infalível. A bagagem hereditária pode ser moldada por fatores não biológicos, como a cultura.

Outra linha de pesquisa associa fidelidade e inteligência. Publicado este ano na revista especializada Social Psychology Quartely, o levantamento deixou os machos na defensiva. Após analisar atitudes sociais e o QI de milhares de homens adultos e adolescentes, o especialista em psicologia evolutiva Satoshi Kanazawa, da London School of Economics, observou que aqueles que dão importância à monogamia são também os de QI mais alto. Em outros termos: a fidelidade masculina seria parte da evolução da humanidade.

No Brasil, quem investiga o assunto é a antropóloga Mirian Goldenberg, partidária do velho ditado: ;O que os olhos não veem o coração não sente;. Em seu livro mais recente, Por que homens e mulheres traem? (Ed. Bestbolso), ela diz que a traição só ganha status de problema quando vem à tona. No mais, as causas são muito variadas. ;Existem aqueles que se dizem poligâmicos por natureza, outros que consideram da natureza masculina trair. Também existem casos de pessoas que amam e traem porque buscam serem desejadas por outros, buscam aventura, cumplicidade e intimidade, mas estão felizes no casamento;, enumera.
Além dessas abordagens científicas, a Revista colheu algumas histórias reais de traição. E, sem juízos de valor, ouviu as explicações para um gesto que, muitas vezes, escapa à compreensão dos próprios envolvidos. Veja a seguir.

Faca de dois gumes
A escritora Julie Powell alimentava-se de ambivalência. Com o marido Eric, ela é ;inconstante, forte demais e fraca demais, alguém protegida e temida, controladora e dependente.; Com D., ela assume outra faceta: ;Uma cúmplice; uma companheira de brincadeiras, travessa, sexy e intensamente amoral;. Assim descreve a autora do recém-lançado Destrinchando ; uma história de casamento, carne e obsessão (Ed. Record). Após o best-seller Julie & Julia, Julie Powell vai direto ao ponto, literalmente, destrinchando a vida dupla com D. e Eric.

Insatisfação versus culpa
A infidelidade destrói os laços de confiança entre os casais. Não são poucos, porém, que assumem os riscos de uma aventura extraconjugalA engenheira Lorena*, 35 anos, sentiu que a relação de oito anos estava em crise. ;Brigávamos muito. Mesmo assim, não queria abrir mão do casamento, porque achava que tinha salvação. Tudo bem que eu não gostava mais tanto dele, mas não queria jogar fora uma convivência de tantos anos.; Ao confidenciar seus problemas para um ex-colega de trabalho, sentiu atração por ele. ;Precisava desabafar. Na verdade, trocar experiências sobre as coisas que estavam acontecendo. Afinal, ele era mais velho que eu e tinha mais experiência. Ele era casado também. Todos os dias conversávamos, até que combinamos de almoçar juntos.; Os papos saíram da internet para almoços diários. Ambos estavam passando pela mesma frustração.

Lorena manteve a relação extraconjugal por oito meses. ;Ele fazia eu me sentir interessante. Mas, por outro lado, culpada por trair uma pessoa que viveu comigo durante tantos anos. Perdia noites de sono pensando nisso, mas não conseguia sair da relação extra.; Quando o envolvimento tornou-se intenso, a engenheira resolveu pedir o divórcio. ;Acho que se não tivesse um filho com meu marido, teria pedido a separação antes;, conta.

Após o divórcio, Lorena tornou-se amante do ex-colega. Durante um ano, ela tentou conduzir a relação até decidir mudar-se para Londres, onde mora hoje. O ex-marido nunca soube da traição. ;Não acho que ele deva saber. Minha traição não era culpa dele, era minha. O problema estava em mim. Não fui corajosa o bastante para romper antes de me envolver com outro. Precisei de uma outra pessoa para me tirar daquele casamento falido.;

Para o terapeuta de casais Enrique Maia, a insatisfação de Lorena quanto ao casamento caracteriza-se como a mais comum dentre as queixas femininas no consultório. ;As mulheres dizem que traem por insatisfação conjugal, enquanto os homens buscam o lado sexual. Outra coisa que também observamos é a oportunidade para a traição na internet e no ambiente de trabalho.;

O analista de sistema Ronaldo*, 38, teve um caso com uma colega de um curso que frequentou. ;Posso manter uma amizade com outra mulher que acho interessante. Mas, com essa, não tive controle;, explica. Ele estava frustrado com os constantes desentendimentos com a namorada, que culminaram em uma total falta de apetite sexual. ;No momento em que senti que as coisas estavam melhorando, essa terceira pessoa entendeu o ponto final;, resume. O namoro, porém, não foi adiante.
Ronaldo admite que, dos cinco relacionamentos ;sérios; que teve, três tiveram uma ;outra; no caminho. ;A primeira e a segunda ex-namoradas ficaram sabendo que as traí. A última não, mas fui eu que terminei a relação. Em todos os casos, houve um desencantamento;, justifica.

O outro lado
;Apesar de saber o passado dela, acreditei que comigo não fosse repetir o mesmo erro;, acreditava o publicitário Pedro*, 25 anos. Na época, ele tocava violão em um grupo de samba e o ambiente das apresentações era propício a flertes. As más notícias vieram dos amigos. ;Falaram que ela estava me traindo, mas eu não conseguia acreditar. Até que, um dia, vi minha namorada com outro cara. Foi um choque.; A primeira reação de Pedro foi se vingar. ;Fingi que não tinha visto e fiquei com outra menina na frente dela. Quis dar o troco.; Hoje, teria outra atitude. ;Cinco anos depois, eu a reencontrei e até rimos da situação. Éramos imaturos.;
A traição mudou a forma de pensar e agir do publicitário. ;Quando estou namorando e tenho vontade de ficar com outra pessoa, termino o compromisso. Essa vontade de estar com outra pessoa, para mim, indica que algo mudou e não quero brincar com o sentimento do outro. Sei como isso machuca;, analisa.

O caso de Camila*, 28 anos, foi bem mais sério. A arquiteta já havia dado entrada no cartório para o casamento. Ela tinha 21 anos e o noivo, 28. O período de preparação do casório, no entanto, não foi como o planejado. O noivo estava passando por problemas profissionais e, embora ela lhe desse apoio, ele parecia cada vez mais distante. ;Ele desligava o celular quando estava comigo e passava muito tempo na internet;, observou na época. Foi aí que Camila começou a desconfiar. ;Perguntava se estava acontecendo alguma coisa, mas ele sempre negava. Então, numa tarde, resolvi entrar no e-mail dele. Não tinha a senha, mas consegui descobrir. Lá estavam: dezenas de e-mails que ele trocava com uma menina que tinha conhecido na internet. Naquela hora, me senti a advogada de Sorocaba. A menina morava em outra cidade e ele estava programando uma viagem para conhecê-la. Para mim, ele havia dito que ia viajar para fazer um concurso.;

Foi aí que Camila confrontou o noivo. Imprimiu todas as evidências da traição e, antes de falar com ele, ligou para a menina com quem o noivo trocava e-mails. ;Ela não sabia que ele estava noivo. Liguei não para brigar, mas para saber o que estava acontecendo entre eles. Quando mostrei tudo, ele quis negar, mas terminou assumindo e pediu outra chance. Tentei voltar, só que já não confiava mais nele.; Ao explicar-se para a Camila, o noivo disse que a outra mulher era uma fuga da realidade.

Segundo a antropóloga Mirian Goldenberg, a internet provou ser o espaço de maior facilidade para encontrar pessoas. Nas redes sociais e por e-mails, homens e mulheres compartilham a intimidade com outros, podendo, até mesmo, terem uma relação virtual. ;As pessoas buscam na internet algo que não têm mais com os parceiros. Esse foi o caso de uma das mulheres que entrevistei. Ela preferia a ilusão de intimidade com o caso que alimentava a distância do que a falta de intimidade com o parceiro com quem era casada.;

*Nomes fictícios

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